O trânsito tragicômico
O TRÂNSITO TRAGICÔMICO
Todo o mundo sabe que a nossa sociedade está doente. Doente ela está, na verdade, desde o ano do nosso Senhor Jesus Cristo de 1500. Os sintomas do mal são muitos e estão por toda parte. Um deles, e o mais visível, é o trânsito. Não, claro, o trânsito enquanto puro conceito, o qual corresponde a idéia da circulação, uma necessidade da própria vida: sem o trânsito de nosso sangue não viveríamos. Também as cidade não sobreviveriam sem a circulação de matéria, energia e gente. Justamento por isso esse é um mal assustador: nosso trânsito é intransitivo.
No trânsito, só a morte circula livremente. E ela faz muitas vítimas. Morrem cerca de 150 pessoas a cada feriadão nas estradas. Nestas, mais sangue é derramado do que óleo dísel. Mas, e daí ? Isso não conta, ou, pelo menos, não conta como o mais importante. Mais importante é que a maquinaria da morte não pode parar. Ela produz sangue, lágrimas, mas também lucros. Ela satisfaz muitos interesses, ela gira como um eixo em torno de si mesma, mesmo triturando pessoas, literalmente.
O meu cachorro, o meu amado vira-lata Tupy, morreu atropelado. Dois primos meus, jovens recém-graduados, morreram nas estradas. O cachorro do meu vizinho foi atropelado e ficou com um problema neurológico que mantinha seu pênis sempre erecto. Pobre cachorrinho... Creio que a morte já o livrou do sofrimento. Mas, quanto mais gente e bicho continuará a ser desgraçado sob as rodas dos automóveis?
A produção não pára. Ao contrário, aumenta mais e mais, movida a exoneração fiscal e endividamento dos iludidos consumidores. E que ilusão: o sonho do carro próprio. Vi a foto de milhares de trabalhadores na revista neoliberal, mostrando a massa proletária na avenida de cidade sul-coreana, cada um sobre a sua motocicleta. A manchete era: trabalhadores sul-coreanos têm condução própria. “Condução própria”... Uma “doença própria” seria uma boa doença? Se estivessem todos no vagão de um trem certamente fariam mais segura, divertida e solidária viagem.
Aí está um aspecto da questão: o problema apresentado como solução. O transporte motorizado individual tem sido a prioridade da gestão dos transportes no Brasil. Coisa do século XX. O carro pareceu tão melhor para o futuro quanto melhor pareceu a quem trocou sua charrete ou carroça por uma camioneta ou um carro de “passeio”. O futuro chegou e agora falta espaço para as pessoas nas cidades. As ruas foram tomadas pelos monstros mecânicos e eles esmagam qualquer um que atravesse à sua frente. Quem ou o que vai parar o massacre sobre rodas?
Ainda assim a indústria quer mais do mesmo. A propaganda diz que cada um no Brasil deve ter um carro japonês. Quando cada brasiliano viesse a ter um carro japonês, então a propaganda de quando começa o Jornal Nacional diria que cada consumidor deveria ter pelo menos dois carros japoneses. Imaginem a maravilha que seria o Brasil transformado num grande estacionamento de carros japoneses! Dois para cada um... Isso daria quatrocentos milhões de automóveis. O Japão mandaria para cá um tissuname sobre rodas. A possibilidade é apavorante. Imagine o leitor este cenário de terror político: o Brasil na dupla condição de maior importador de automóveis e maior exportador de soja do mundo.
Essa situação me fez ter um pesadelo. Eu sonhei que o Brasil tinha se transformado no Sul dos Estados Unidos, como era esta região por volta de 1850. Eu era preto e os ianques tinham os olhos puxadinhos. Acordei desesperado.
Autor: Chauke Stephan Filho
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