Camisa de Vênus e Marcelo Nova.



       

Camisa de Vênus e Marcelo Nova.

(Cristian Maidl)

 

Ao pensar em Marcelo Nova e Camisa de Vênus em primeira mão vem à mente duas lembranças:

A parceria de Nova com Raul Seixas e a musica “Só o fim”, por serem estas a referência do primeiro contato que tive com os títulos. Depois, claro, todos os demais fatos decorrentes da importância dos nomes: Camisa de Vênus e Marcelo Nova!

Usando em grande parte as próprias palavras de Nova, que tão bem se expressa no que lhe diz respeito, deixo aqui registrado um breve resumo do trajeto musical, por estes nomes navegados! Falar em Marceleza é sempre uma honra, por ele representar uma criatividade impar, personalidade lendária, por aquilo que fez, faz, pensa, demonstra...

Nascido em 1951, na Bahia, teve a oportunidade de assistir aos quatorze anos a uma apresentação   ao vivo de Rauzito e os panteras:

 

"Vc sabe que Os Panteras foram meus Beatles, né? Eu molequinho, eu tinha meu contato auditivo com música, com o rock especificamente, mas eu nunca tinha visto. A primeira vez que eu vi uma banda na minha vida, a dois metros de distância foi Rauzito & Os Panteras. Então tem muita gente que gostaria de ter visto os Beatles. Eu não só vi, como hoje toco com os 'meus Beatles'. (...) M.N

 

 Apresentação esta que lhe marcaria a vida e lhe serviria de acréscimo para afirmar quais eram as suas intenções já somadas e dali para frente! Era naquele instante o primeiro contado com o Mestre Raul. Este que comandou os primórdios do Rock Brasileiro, tão bem se expressava sem medo de levar a diante as idéias que tanto acreditava... Um encontro que futuramente resultaria em muitos frutos entre estes dois seres apaixonados por Rock And Roll!...

 

Voltando um pouco mais: na infância aos nove anos a descoberta de Little Richard, e outros grandes nomes da época:

 

(...) havia uma loja que ficava numa travessa da Rua Chile, chamada C. Sampaio. E eu passei por ali um dia com meu pai e ouvi esse Little Richard, que eu nunca nem tinha ouvido falar. Eu tinha oito ou nove anos de idade, 1959, 60. E eu pedi a ele para me dar o disco. Ele comprou, e pela primeira vez eu tive um disco musical. (Até então) Eu só tinha aqueles discos de Branca de Neve, Os Três Porquinhos, historinha. Aqui Little Richard. Quando eu cheguei em casa que eu botei aquilo na vitrola do meu pai, eu enlouqueci, bicho. Enlouqueci completamente. Era algo radicalmente diferente de tudo o que eu tinha ouvido. João Gilberto era um CHATO! Little Richard era um grito de liberdade total, cê tá entendendo? A ponto de eu pular no sofá de mola de minha mãe, que ela tinha comprado em Deraldo Móveis. Quando você pula no sofá que sua mãe comprou em Deraldo Móveis... isso é uma transgressão. Essa é a verdadeira transgressão. Quebrar a mola do sofá que sua mãe comprou em Deraldo Móveis (...)

"São da época em que eu ouvia muito os Beatles, os Stones, Dave Clark Five, os Hollies ... Enfim, todas as bandas que importavam no início dos anos 60. Quando ouvia a voz de Sky Saxon à frente de 'Pushin'Too Hard', perguntei para mim mesmo: 'Nossa, será que é mesmo uma banda americana?'. Curioso, sim, porque todas as que citei e outras tantas eram sempre inglesas. s Seeds me chamaram atenção pela sonoridade crua, muito própria, singular. Uma banda que bateu de primeira."

"Meu amigo, hoje. Gozado isso. Quando era um garoto de 13 anos, com o rosto cheio de espinhas e todo desajeitado, me apaixonei por uma garota que não queria saber de nada comigo, só queria namorar caras mais velhos. Aí eu ia pro quarto e chorava, ouvindo Eric Burdon e os Animals tocando 'Don't Let Me Be Misunderstood'. Ele foi uma espécie de ponte que me fez atravessar minha primeira desilusão amorosa. Hoje quase 34 anos depois desta história, conheci e me tornei seu amigo, temos até algumas parcerias. Sou mesmo um homem de sorte... E tem mais uma coisa: Pra mim, Eric é um dos cinco maiores cantores vivos do rock'n'roll. "

Tomei contato com os Byrds via 'Mr. Tambourine Man. Na época, achava que a música era deles, e não do Dylan. O engraçado é que os ouvi no rádio AM! (risos) Depois que comprei o LP e vi a fotos dos caras, todos cabeludos, usando óculos escuros, pedi pra minha mãe me comprar uns óculos também. Ela me deu um de presente, mas era enorme, nem escuro era. Acabei tremendamente frustado porque não tinha como ficar parecido com Roger McGuinn. (risos) É uma das minhas bandas americanas favoritas, fluente no country, no folk, além dos vocais, que eles harmonizam como ninguém. Sua influencia está aí até hoje: dos Bodeans à banda nova, Golden Smog, passando pelos Jayhawks e Wilco, todos devem algo aos Byrds."

 

Um pouco tempo depois monta uma loja de discos, o que nos faz pensar em quanta cultura musical acumulada, o que lhe da a moral de preservar nos dias de hoje toda história da época. Depois disto, o emprego em uma estação de radio     baiana, o que lhe torna conhecido por pessoas ligadas a gravadoras em São Paulo e Rio de Janeiro.  No inicio dos anos 80 Marceleza vende o ponto de sua loja de discos e faz uma viajem a Nova Iorque onde toma contato com o movimento punk:

 

"Eu costumava tocar guitarra com a raquete de tênis do meu pai quando tinha apenas oito anos de idade. Eu queria ser Elvis, Jerry Lee, Little Richard, depois queria ser John Lennon, Mick Jagger, Keith Richard, Eric Burdon. Eu botava os compactos e fazia dublagem sem saber nada de inglês, ia só no som, sabe aquela... "I want by not you love me, I dont understand... Is very much" entendeu? Então a idéia de montar uma banda me acompanha desde que eu era bem pequeno. Mas morando na Bahia eu achava que isso era impossível, pois quando comecei a trabalhar para comprar meu próprio instrumento, o meu conceito de banda na época era Led Zeppelin, Deep Purple e eu imaginava que era preciso toda aquela parafernália para se ter uma banda. Aí veio o Punk Rock e deu no que deu."

 

Após voltar ao Brasil, Marceleza contata um amigo que tinha conhecido na TV Aratu: Robério Santana e juntos formam a banda Camisa de Vênus! Que em pouco tempo após o lançamento de um compacto ficam famosos na Bahia, o que lhes abrem a porta para gravarem um álbum. Após isto, ficariam famosos no Brasil inteiro, chegando a vender 300 mil cópias do disco “Correndo o risco” E lá se vão 32 anos fazendo Rock, literalmente “Botando pra fuder”.

 

(...) a verdade foi uma conjunção de fatores e não exatamente sorte. Eu tinha um programa de rádio em Salvador chamado "Rock Special". Comecei a tocar Clash, Sex Pistols, Plasmatics, toda aquela coisa do punk rock inglês e americano que ninguém na Bahia sabia o que era. Comecei a botar aquelas coisas na cabeça da moçada em 78,79. E em 80, formei o Camisa de Vênus. Então eu criei uma cena de rock and roll na Bahia, uma cena que não existia desde que Raulzito tinha saído de lá. A diferença que eu vejo entre o Camisa e Raulzito é que enquanto estava na Bahia ele tocava mais cover de Elvis, Beatles e o Camisa não, nós tínhamos nossas próprias letras e que normalmente contestavam a cena baiana... os baianos ficaram apavorados. Salvador ficou dividida entre os que adoravam e os que odiavam, e eu na verdade sempre gostei desta divisão, pois acho que a arte tem que ter esse sentido de contestar o que a maioria acredita. Eu não quero ser o dono da verdade, mas sem dúvida nenhuma me agrada a idéia de colocar uma interrogação na cabeça das pessoas."

 

 Uma das melhores bandas de rock do Brasil. Que começaria junto com outros, o reinado nos anos 80. Ah anos 80! ... Onde surgiram nomes lendários na cena do rock Brasileiro: Legião Urbana, RPM, Ultraje a Rigor, Titãs, Ira, Paralamas, kidabelha, Barão Vermelho, Engenheiros do Hawai entre outros... No meio disso tudo e de forma considerável Marceleza e seu grupo! O nome surgiu de uma comparação que faziam sobre o ensaio da banda ser algo que incomodava. Marceleza por achar na época o preservativo uma coisa incomoda, junta os fatos fazendo disso o batismo “Camisa de Vênus”. A banda começaria a ganhar grandes proporções a partir de 1983. Após a gravação de um compacto, ficam famosos na Bahia, o que lhes abrem a porta para gravar um álbum e um excelente contrato pela “Som Livre”. O grupo até que tenta, mas logo depois romperiam com a gravadora por esta querer mudar o nome da banda. Batem o pé e se negam a tal fato, ou melhor, Marceleza sugere de “Camisa de Vênus” para “Capa de pica” Mostrando assim a forte independência do grupo em manter sua originalidade e missão de “esculhambar a Bahia”!

 

             Quando achei que tinha chegado o momento de sair de Salvador. Nós já tínhamos feitos vários shows em Salvador, não tinha mais lugar pra tocar e eu não queria ficar me repetindo. Então percebi que naquela altura do campeonato, como já havíamos viajado principalmente para São Paulo e Rio, meu desejo de esculhambar com a Bahia já havia aumentado geograficamente, geopoliticamente, porque descobri que o Brasil é uma grande Bahia (risos)

 

 É interressantre notar as marcas originais do Camisa. A forma com que as letras mostram o conhecimento do grupo sobre o mundo. Letras diretas, positivas, sarcásticas. Com certeza letras muito bem elaboradas na visão de como os músicos observavam o mundo. Temas como dogmas religiosos, sexo, sentido da vida, são visíveis nas letras da banda. Marcelo Nova Mostraria as caras ao mundo!... Considerado hoje um dinossauro do rock, de forte personalidade, admirado por muitos. Continua Brilhando ao preservar as raízes e sempre compartilhando dos momentos passados com o publico.

Após enjoar de seu “autorama” resolve embarcar em carreira solo onde mostraria um forte amadurecimento em suas futuras composições. Entre elas “A ferro e fogo” composta ainda no Camisa para contrariar os que rotulavam a banda de Punk baiano. Marceleza e seus 60 anos de história, falando o que sente e o que vê:          

 

 Naquele momento, eu tava tão incomodado com tudo aquilo, aquela coisa de punk baiano. Naquele primeiro disco (pela Warner, Correndo o risco), tinha uma música chamada A Ferro e Fogo que eu gravei com 35 músicos. Uma orquestra sinfônica. 'Punk baiano, punk baiano'. Ah, é punk? Então eu vou mostrar quão punk eu sou. Falei com o meu amigo Peninha Schmidt, que era o produtor do disco: 'Eu quero uma orquestra.' 'O quê?'. 'Eu quero uma orquestra. Completa. Uma orquestra sinfônica, por que eu quero gravar uma música sem a banda. Eu fiz um texto chamado A Ferro e Fogo, que é uma odisseia épica e eu quero ilustrá-lo com nada de rock 'n' roll. Eu quero ilustrá-lo com uma orquestra sinfônica, eu quero fazer dessa música a trilha sonora para Os Dez Mandamentos, você entendeu? Vou tirar Cecil B. de Mille e vou botar Marcelo Nova fazendo a trilha sonora disso'. E ele disse: 'Porra! Vou atrás!'. Foi atrás, conseguimos encontrar o Maestro Ferrante, esqueci o primeiro nome dele. Um cara cabeludo, barbudo, que vibrava, que tinha essa visão de maestro de organizar tudo em forma de partitura, e separar os metais das cordas. Tanto que, quando eu fui cantar, gravar a música, eu vi 35 músicos. Húngaros de 70 anos de idade, era uma linguagem totalmente diferente. Tinha gente de São Paulo, do Japão, da Hungria, da Alemanha, todo mundo reunido ali, e aí entrou aquela coisa, eu disse: 'puta que pariu! É minha canção!'. E quando o disco ficou pronto e saiu, era uma coisa que destoava do resto do disco. Por que até então, eu tinha escrito algumas canções boas. Tinha escrito outras bobagens, mas quando eu escrevi A Ferro e Fogo... A Ferro e Fogo pra mim é a canção que me fez ver que eu poderia vir a ser bom no que eu estava fazendo. Quando eu terminei de escrever A Ferro e Fogo, eu li. E reli. E trabalhei em cima. E depois ensaiei. E depois gravei com a orquestra. E isso, meses e meses se passaram. Eu fui percebendo que era, pra mim, uma canção totalmente definitiva. O que eu escrevi antes de A Ferro e Fogo e o que eu passei a escrever depois dela. Ela me fez perceber que eu não ia passar o resto da minha vida escrevendo Eu Não Matei Joana D'Arc, Sílvia, Bete Morreu e outras canções. Eu tinha um caminho mais maduro, mais adulto, mais poético. Através dela eu descobri outros universos literários e sonoros para compor. Então o Camisa de Vênus deixou de me interessar naquele momento. A partir dali, foi ficando cada vez mais tênue a minha relação com o Camisa. Eu comecei a achar que aquilo era uma brincadeira de menino. É o que eu falei do Autorama agora há pouco em tom de brincadeira, agora se justifica o que eu disse. Eu tinha comprado o Autorama, eu tinha armado o Autorama, coloquei a pista do jeito que eu quis, dei inúmeras voltas com os carrinhos, adorei aquilo, ganhei as corridas, mas como todo brinquedo, uma hora ele já não era mais aquilo, não é? E até hoje, de uma certa forma, eu tenho que agradecer aos outros meninos da banda, por que quando eu saí, apesar do choque que eu provoquei com a minha saída, se por um lado eu dei o nome da banda pra eles. Eu disse: 'olha, vocês põem outro cantor no meu lugar, eu fico na banda até o outro vocalista estar definitivamente assentado, e você podem coninuar usando o nome da banda, mas eu tô saindo'. E eles disseram: 'não. Sem você não tem Camisa de Vênus'. Aí é a parte do agradecimento. Por que eu acho que o Camisa tinha marcas muito legíveis assim. Isso foi o início da minha carreira solo. Na sequencia, eu fui chamado por Andre Midani, que me disse: 'o que você está pensando em fazer?' O Andre foi muito cavalheiro comigo, por que quando eu decidi sair, eu ainda devia dois discos do Camisa pra Warner. Ele disse: 'Olha, se você quer sair da banda, quem sou eu pra dizer que você está errado ou certo?' Ele ouviu as minhas ponderações e embora eu tenho certeza que ele queria dizer 'olha, dá um tempo, vocês estão cansados, fazendo show em cima de show, pára um pouco, fiquem um ano se se ver'. O famoso apaziguador, né? Ele, não. Ele disse: 'Tudo bem'. Eu perguntei: 'Posso lhe pagar com um álbum duplo?' Ele disse: 'Pode'. Eu queria me livrar daquilo. E ele considerou o nosso álbum duplo, o Duplo Sentido (1987) como dois álbuns e eu paguei minha dívida para com a Warner. E aí, logo na sequencia, ele me pediu para uma das meninas que era diretora artística Warner me ligar: 'Olha, o André quer fazer um contrato da carreira solo com você e tal'. Foi quando eu assinei um contrato com a Warner prevendo três discos. O terceiro acabou não se concretizando. O primeiro foi o 'Marcelo Nova & A Envergadura Moral' (1988). O segundo foi 'A Panela do Diabo' (1989), que eu tive a bordo um outro cara (Raul Seixas) comigo (risos). E isso foi o início da minha carreira-solo. Claro que mal-acompanhado, né? (Risos).

 

 Marceleza Teve o privilégio de ser amigo e a gravar com o grande influenciador musical e porque não dizer: O pai do rock Brasileiro: “Mestre Raul Seixas”:

 

Cara, eu nunca desejei isso, eu nunca busquei isso (gravar um disco com Raul Seixas). Eu nunca nem sequer imaginei isso. Raul foi um cara que foi uma referência pra mim do ponto de vista de texto. Independentemente do valor estético-poético das canções brasileiras (pré-Raul), Raul foi o cara que instaurou a possibilidade de você, como ouvinte, se identificar com o que ele tava dizendo. Então eu acho que essa peculiaridade dele, essa característica dele é muito marcante. Quando eu ouvi Ouro de Tolo a primeira vez, eu não gostei nem um pouco da música. A música é aquele negócio (canta com voz anasalada): 'nana-nina-nina-nina', aquilo é chato. O arranjo é chato. Mas quando eu ouvi a letra, eu parei para ouvir a letra foi quase como se eu dissesse: 'porra, eu escrevi ese troço e esse cara tá cantando o que eu escrevi. Eu penso exatamente dessa forma'. Ele tinha essa capacidade. Os textos dele.. não era só uma coisa de apreciar a imagem a qual o texto remetia. Não! 'Porra, é isso aí! É isso aí o que eu quero dizer'. Então, gravar com ele, 25 anos depois de tê-lo visto com Os Panteras, foi uma experiência de vida mesmo, de estar no lugar certo na hora certa, de destino mesmo. Na verdade nós nos tornamos amigos primeiro. Nós só fomos compor e gravar um disco quatro anos depois de estarmos andando juntos direto. Se não houvesse amizade, jamais teríamos sido parceiros. Por que a gente saía pra beber, saía pra incomodar os outros, ele ia na minha casa, eu ia na casa dele, a gente ouvia muito Lightnin' Hopkins e Howlin' Wolf e enfim... Até chegar no Panela, foi uma trajetória de amizade. Nós ficamos de 83 até 87, quando gravamos nossa primeira música juntos (Muita Estrela pra Pouca Constelação, do dicso Duplo Sentido, 1987), nós ficamos andando junto. Por que ele apareceu um dia em show do Camisa no Circo Voador (Rio de Janeiro), e disse que queria assistir o Camisa por que era a única banda do rock brasileiro que prestava. Chamei ele pra subir no palco na maior cara de pau, por que nós não nos conhecíamos pessoalmente e cantamos Be-Bop-a-Lula, Whole Lotta Shakin' Goin' On. Quando acabou, ele deu uma declaração no JB dizendo que a única banda que prestava no rock brasileiro era o Camisa de Vênus. Aí ficamos uma semana sem falar com ninguém, né? (Tirando onda) 'Aaah, Raulzito que falou, porra! Aaahhhh!' (Risos) Mas Raul era um cara muito bem-humorado. Louco. Completamente doido, como é fácil de presumir e uma pessoa que - muito pouca gente sabe disso - era muito bem-humorado.

 

 Marceleza também possui o status de ter feito o primeiro disco 100% acústico da história da musica brasileira, o “Blackout”:

 

Eu estava fazendo uma turnê no início dos anos 90, e Collor de Melo (único Presidente da história do Brasil a ter sofrido um impeachment) confiscou as cadernetas de poupança de todo mundo, então uns seis ou oito shows que eu tinha agendado foram cancelados.

Fui para a estrada com um violão apenas, sem banda, eu e mais um músico, e era uma coisa para tocar em teatro, etc. Eu comecei a gostar daquela sonoridade, porque nunca tinha explorado isso. Sempre fui o cara da linha de frente, e de uma hora pra outra eu estava sentado numa cadeira tocando violão. Então comecei a achar que tinha algo ali no som que me interessava, e aí resolvi fazer um disco acústico quando era uma ousadia completa.

O presidente da gravadora disse pra mim: “você é maluco, rapaz, quem faz isso é sertanejo. Você é do Rock” (risos). Mas este é um dos meus problemas: eu estou sempre à frente da humanidade, pena que são só 10 minutos e os caras me pegam (risos). Aí a MTV veio e fez o negócio do “Unppluged”, e minha ousadia acabou virando fórmula. O mundo é traiçoeiro, cara (risos).

 

 Explica com orgulho o processo de inserção do vocabulário cotidiano nas Musicas do Camisa :

 

Mas eu tive uma relação muito boa com o presidente da RGE, o falecido Marcos Silva, por que ele confiou em mim. A RGE era uma gravadora de música sertaneja, de brega. Ele não tinha nenhuma intimidade com o tipo de música que eu fazia. Nenhuma. E quando eu fiz isso ele achou que aquilo tinha uma importância. Embora ele não entendesse aquilo, ele apostou na coisa. Ele disse: 'Porra, Marcelo, vá lá e faça'. Por que quando eu gravei o Viva (RGE, 1987), ainda havia Censura no Brasil. E todo o disco foi censurado. E mesmo assim, Sílvia tocou no rádio pra caralho. Mas os palavrões não iam ao ar. Era o bipe que ia no lugar dos palavrões. Era bipe. Bip! mas apesar disso, ele apostou. Ele não entendia. Ele achava que o negócio do palavrão poderia vir a ser uma revolução. Quando na verdade, a única coisa que eu fiz, quando inseri aquela série de palavrões - por que, para o bem ou para o mal, historicamente, eu fui o artista que inseriu o palavrão na música popular brasileira, nunca houve isso antes de mim, independente de estilo, de gênero, nunca houve. O única palavrão foi 'bosta' (Geni & o zepelim, de Chico Barque). Quando o que queria mesmo com aquilo era tirar meu chapéu pra Plínio Marcos, a quem eu tinha visto no Teatro Castro Alves, com Dois Perdidos Numa Noite Suja, e a dramaturgia brasileira naquele momento do final dos anos 60, início dos 70, ela vivia de traduções de Brecht, de Pirandello. Não tinha um autor nacional. Plínio foi o primeiro cara a pegar e levar peças pelo Brasil com uma linguagem que incluía o nosso vocabulário cotidiano. 'Vá tomar no cu, seu filho da puta! Seu viado!' (Risos) Eu me lembro que metade do Teatro Castro Alves se levantou e foi embora! Isso no finalzinho dos anos 60. A pequena burguesia baiana foi toda embora chocada! Como é que alguém poderia dizer numa peça de teatro: 'vá tomar no cu, seu filho da puta'! (Risos) Escândalo total! O Camisa tinha um grito da plateia que me persegue até hoje, o 'bota pra fuder', tinha Sílvia, a versão de My Way. Inserir a linguagem do cotidiano, sabe? Eu achava que o Camisa era um veículo bom pra isso. A forma como a banda se apresentava, as coisas que a gente dizia, elas se prestavam a esse tipo de coisa. Como é que eu vou explicar pra ele (Marcos Silva) que aquilo era uma homenagem a Plínio Marcos? Ele nem sabia quem era Plínio Marcos! Mas ele apostou e disse: 'Tudo bem! Vá lá e faça. Eu sei que você é bom no que você faz'. Ele me bancou! E eu sou grato a ele até hoje. E já tem mais de dez anos que ele morreu. Mas ele me incentivou a ir fundo nisso.

 

 Bem, de forma resumida, um pouco da trajetória destes importantes nomes!

 

Fomos expulsos da Som Livre e o resto é história. O Camisa se tornou a banda que se tornou.” M.N

 

Uma banda Baiana. Uma banda Brasileira. Uma banda universal. Revolucionaria. Onde todos os fatos levaram a existi-la!

 

“Éramos nós e eles, não havia meio termo. As pessoas ou adoravam o Camisa e queriam ir pros shows, ou as pessoas detestavam o Camisa. Não havia meio termo, o que muito me agradava, aliás.” M.N     

 

 E como nada na vida é por acaso, a frente dela Marcelo Nova, Nascido em 51. Cinco anos depois de Rauzito. Aos embalos de Elvis. O tal do Rock ’N’ Roll mostrava as caras. Eles estavam lá! Foram testemunha ocular da história e entraram nela! Seres musicais! Rauzito: Precursor do Rock Brasileiro! Marceleza escalado no mesmo time!

 

“Nunca me interessou fazer parte de time que está ganhando. As pessoas só querem jogar no time que está ganhando. Eu não tenho nenhuma vontade de jogar em time que está ganhando: eu gosto de jogar pelo amor ao jogo. Eu gosto de botar a bola por entre as pernas do zagueiro e fazer um gol de letra.

Não me interessa se é no Estrelinha de Pirapora ou no Real Madrid. Até prefiro que seja no Estrelinha de Pirapora, porque eu dou vazão ao meu espírito anárquico. Jogar em time que está ganhando é muito chato.

É muito fácil e é muito chato!” Marcelo Nova!

 

Metamorfose ambulante, continuam rolando, rolando. A vida é isto! O Rock é isto!...

 

 

                                                                                                          12/07/2012

                                                                                                                      Cristian Maidl

 

                   


Autor: Cristian Maidl


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