As penas alternativas como instrumento crítico frente às penas privativas de liberdade



AS PENAS ALTERNATIVAS COMO INSTRUMENTO CRÍTICO FRENTE ÀS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 

Jefferson Costa Portela e Diego Yury Tiburtino Galdino[1] 

Resumo 

O trabalho analisará as temáticas envolvendo processo evolutivo das penas, bem com suas origens nos sistemas penitenciários, destacando a mudança de paradigma das penas no estado democrático de direito.Analisando os aspectos críticos da pena privativa de liberdade, no sentido de demonstrar as falhas que norteiam aplicação dessas penas e as possíveis alternativas para a mudança do sistema punitivo de contensão social. 

Palavras chaves

Penas alternativas, criminologia, evolução, socialização. 

1 INTRODUÇÃO 

Ao pensar penas privativas de liberdades, epistemologicamente nos é remetido como uma evolução ao modo punitivo aplicado na Idade Média, que tratava a pena como forma de repreensão a determinada ação, através de demasiados meios de se afetar o corpo do agente, que cometeu o fato considerado e intitulado pelos detentores de propriedade ,como mal. A questão é que esse paradigma de suplício  que ao senso comum  se superaria, foi solucionado com a formação de um sistema tão obsoleto e cruel quanto  as penas de repressão corpóreas, mais objetivamente , a pena  de suplicio  de um âmbito mais vingativo e privado, passou a ser substituída pela  de forma objetiva ,pena de prisão, atuais e vigentes conhecidas  penas privativas de liberdade,  que gradativamente ampliou o sentimento de vingança da punição do âmbito restrito e privado para o âmbito público da sociedade como um todo. De fato de um o lado  sistema de penas evoluiu como forma de auto-afirmação do jus puniendi  como estado “legitimo”, de outro engendrou com as prisões mais insegurança e medo numa sociedade receosa.

Por isso que epistemologicamente a expressão penas privativa de liberdade ao senso comum nos da idéia de uma humanização das inescrupulosas penas de outrora, o que é por cima enganoso, já que essas penas tanto no seu sentido retributivo como preventivo, se mostrou e continua se mostrando ineficaz para o combate da criminalização e que suas conseqüências se constituem um ciclo que retroalimenta o crime, não sendo menos inescrupulosa.

 

Partindo dessa suscita síntese histórica da pena, cujo  ponto na fundamentação se dará não tão precípuo nessa discussão, e sim na própria reflexão do sistema  atual,   que tem o Brasil como o país de maior número de encarcerados da América latina,   encabeçado pelo carro chefe das penas privativas de liberdade. É nesse ponto que se questiona a função específica desse tipo de pena, herdada da idéia clássica de fazer apenas justiça, uma retributividade de uma corrosão dentro da sociedade. A pena seria apenas uma metalinguagem de si mesma, ou um fim culminando em si próprio[2], é, portanto que atualmente se pensa em maneiras conjuntas de se trabalhar essas penas, através de penas alternativas, logradas de socializar o cidadão, ou mesmo, torná-lo um ente inserido dentro desse meio capitalista quer seja como força de produção.

 

As penas alternativas seriam a aplicação de um direito penal condizente com a realidade factual de cada delinqüente. Não se estaria aqui substituindo a violência simbólica do jus puniendi, e sim humanizando um sistema heterogêneo e desigual.

 

2  EVOLUÇÃO OU “INVOLUÇÃO” DO SISTEMA DE PENAS

 

Ao analisar o direito penal moderno, verificamos a pena privativa de liberdade como forma de sanção mais representativa no aparelho repressor do estado. São elas que ilustram o poder coercitivo simbólico do sistema penal, trazendo uma herança impregnada de tentativas de ressocialização, já que atualmente essa pena nos denota cada vez mais uma neutralização do delinqüente.

 

E esse meio simbólico de repressão, se inseriu inerentemente ao sistema de leis penais, constituindo-se externamente ao aparelho judiciário. As penas de prisão tiveram origem nos mosteiros da Idade Média, como forma de punição aos monges e clérigos que cometessem desvios com suas finalidades, com isso eram recolhidos em celas com intuito de restabelecimento de suas obrigações religiosas e conscientização pessoal.[3]Baseado nesse sistema punitivo, as prisões começaram a serem instituídas com função  de recolhimentos de delinqüentes, e que mais tarde no inicio do sec. XVIII, se difundiria em passos largos. E é justamente nesse século que ficam marcados modelos de sistemas prisionais, quer seja o pensilvânico ,arbuniano e  progressivo, cujo numa análise ampla representaram basicamente o que hoje colhemos com as penas privativas,  a impossibilidade de readaptação social , ou seja, eram notórios centros de neutralização de delinqüentes.Seria como analisa Michael Focault, um centro transformador de indivíduos num campo que pouco reproduz suas relações dentro de uma sociedade, uma espécie de quartel isolado do campo social.[4]

 

As penas no código penal brasileiro são norteadas por teorias absolutas e relativas, realçadas no art.59 desse mesmo código, no qual diz que quando necessário e suficiente ,haverá  reprovação e prevenção do crime.[5]Baseado nesse cenário ,as penas privativas de liberdade podem ser encarados como existencialmente absolutas e relativas, já que a idéia precípua de seu funcionamento estaria na ressocialização  como base para reintegração do delinqüente na sociedade .No entanto o que percebemos é a função mera intimidadora, no sentido da norma ser aplicado como um mal necessário a outro mal, sendo por tanto uma recapitulação, daquilo que se aplicava nos sistemas prisionais do sec.XVIII , a pena sendo uma retribuição neutralizadora , com função em si própria.Esse viés de outrora da norma, é salientado por Focault ,como um retrocesso presente :

 

Todo aquele “arbitrário” , que no antigo regime penal,permitia aos juízes modular a pena e aos príncipes eventualmente dar fim a elas ,todo aquele arbitrário que os códigos modernos retiraram do poder judiciário, vemo-lo se reconstruir progressivamente ,do lado do poder que gera e controla  a punição(...) O julgamento criminal é uma unidade arbitrária .[6]

 

 

O grande centro da discussão por tanto está  na contestação de que , as penas como um processo evolutivo do direito penal, que de um paradigma desinstitucionalizado  do estado transformou-se  na força punitivo do mesmo. E que gradativamente foi se solidificando em um sistema de penal feita para os oprimidos, com finalidade de neutralizá-los dos centros sociais, a fim de evitar o aumento dos índices de criminalidade. Sendo assim, num âmbito atual, todo esse processo de “evolução punitiva” , nos faz remeter a seguinte questão, quais seriam então a maneira de combater a criminalização , constatando que as penas de caráter privativo de liberdades, sozinhas não possuem eficácia ? .Gladston Fernandes de Araújo destaca algumas questões precípuas para o direito penal e posteriormente a aplicação coerente das penas, pontuando os seguintes elementos críticos para uma análise reformuladora do sistema penal: A transparência do discurso, a defesa dos direitos humanos, a não seletividade do controle e por fim o anti-autoritarismo.[7]

 

3. A FUNÇÃO DE ETIQUETAMENTO DA PENA DE PRISÃO

 

Outrora se pensava que o delito fosse um fenômeno natural, uma explicação intrínseca do próprio homem, levantados pela escola positiva. Mais anteriormente, os teóricos clássicos viam o delito de um ponto de vista de entidade jurídica ,tornando-se um pressuposto da sanção como forma de demonstração publica a ações diferentes da sociedade.Hoje o delito é visto necessariamente intercalado com o nosso sistema estratificado ,no qual a classe oprimida de indivíduos miseráveis sem poder econômico torna-se o berço da criminalização.Visto assim , as penas privativas vão apresentar alem do problema da ineficácia da ressoacialização que acaba sendo uma a-socialização, um estigma estereotipado ao individuo que volta ao meio social.Com isso se ao voltar em minha fala sobre a explicação do delito nascer do meio social, especificamente da classe pobre , perceberemos que o indivíduo é marcado pelo sistema , ou seja, se reinserir no mercado de trabalho oriundo de um estigma de preso cria restrições sociais , o levando  a voltar ao crime ,tão produtivo e lucrativo para ele.

 

É nesse ponto que Alessandro Baratta irá salientar ao analisar que a lei penal se demonstra desigual na forma de distribuição de status do criminoso, ou seja, se desvirtua o foco das ações do dano social para ações do perfil de criminoso enquadrado no sistema penal[8], cujo delinqüente se mistifica como o pobre fora do mercado produtivo capitalista.Essa questão é deveras importante ao analisar a seqüela que o sistema de penas prisão causa ao individuo pobre, que pelo próprio Direito Penal positivo é coloca como ,”publico alvo”.

 

Dentro da realidade social, é possível analisar um nítido circulo da população criminal pobre , dentro do próprio sistema de quem sofre sanções penais. Baratta analisa por essa questão dentro dessa linha, verificando que existe uma própria regulação na sociedade dos que estão dentro ou fora dela, uma seletividade, reforçando que:

 

Tal distribuição desigual, em desvantagem dos indivíduos socialmente mais débeis, isto é , que têm uma relação subprivilegiada ou precária com o mundo do trabalho  e da população ,ocorre segundo as leis de um código social(second code)que regula a aplicação das normas abstratas por parte das instâncias oficiais.[9]

 

 

A pena atualmente é um mal infelizmente emergencial, a questão é que sua aplicação como forma objetiva de encarceramento traz seqüelas ainda mais graves, como forma de estereótipo ao indivíduo e sua praxe ineficácia ressocializadora.

 

4. ALTERNATIVAS PARA AS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

 

As penas privativas de liberdade analisadas sob um âmbito econômico, como faz de forma  brilhante  Claudio Guimarães, demonstram de maneira clara, a relação entre custo e beneficio de ambos os patamares no sistema penal, quer seja, pelo sistema carcerário, quer seja pelo delinqüente, de forma que a esse ultimo, Guimarães analisa que :

 

O comportamento delinqüente se assemelha, por tanto, a qualquer outro comportamento racionalmente desencadeado no qual o indivíduo, ante uma escolha qualquer, avalia os diferentes custos e benefícios possíveis e previsíveis e de sua conduta consciente de suas possíveis conseqüências. Na medida em que os ganhos ganham os custos, a conduta será praticada[10]

 

Logo se detecta que as penas privativas se mercantilizaram no sentido de ter parâmetros entre delinqüente e o sistema. Essa banalização da pena é o ponto precípuo para se reavaliar a função em si da mesma. Por que, se a sua função intimidadora fracassa, seu viés ressocializador é inapropriado por reproduzir um ambiente não social, e sua seqüela é etiquetar o individuo que carrega o rotulo de delinqüente e anormal, para o mercado capitalista. Sem dúvida algumas questões se perderam com a mudança predadora do se XXI, e com a notória banalização da pena de prisão é necessário hoje se pensar em possíveis soluções para reestrutura a função teórica que essa pena se propôs outrora, haja vista que estamos num estado democrático de direito, norteado por bases de direitos humanos.

 Dentro dessa crise do sistema penal, existem alternativas que podem substituir as penas de prisão, mesmo que de forma parcial. Através então das penas restritivas de direito, que se compreendem em : prestação pecuniária, perda de bens e valores , prestação de serviço à comunidade ou a entidades publicas , interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.[11]E claro que as formas de substituição desse tipo de pena em relação as privativas de liberdades deve haver requisitos a serem analisados, previsto no art. 44 do Código Penal brasileiro, no sentido de haver proporcionalidade dos crimes.Sucintamente a pena restritiva de direitos em casos mais supérfluos diminuiria o acumulo de encarcerados, por outro lado não afetaria a grande questão da mercantilização do sistema carcerário, que refere-se aos crimes de grande teor violento.De fato então as penas restritivas não apresentam a grande alavanca para uma mudança de caráter das penas privativas, porém já garante ,é bem verdade nas mãos do judiciário, uma possível alternativa para certos crimes.

 

O problema está no dilema, de como aplicar penas alternativas se o sistema penal é pautado na pena privativa de liberdade como sanção máxima e repressora. A questão então é bem mais ampla do que a simples aplicação de penas alternativas, e sim a mudança de paradigma de direitos. Essa questão pode ser bem analisada, com a aplicação do Direito Alternativo, vigente do pluralismo jurídico que hoje nós temos. E a criminologia, hoje está muito a contribuir para a diminuição da criminalização, através de uma teoria materialista do Direito e do Estado, de forma a abolir nossas diferenças sociais.[12]

 

CONCLUSÃO

 

A evolução das penas nos mostra que  hoje vivemos num retrocesso do suplício das penas medievais, isso por que nosso sistema é encabeçado pela penas de prisão, em que nessa analise do sistema punitivo nos mostrou deveras ineficaz. Desencadeado diversas seqüelas numa sociedade extremamente insegura, e estratificada, cuja detenção de poderes econômicos torna-se a base para a sobrevivência no selvagem sistema capitalista.

 

Porem existe possibilidades de uma mudança de paradigmas para torna o sistema punitivo igualitário, basta torna as penas como um meio, ou mesmo instrumento para o acesso a socialização do individuo perdido nesse dilema de opressores e oprimidos.

 

 

Bibliografia

 

GUIMARÃES. Carlos Alberto Gabriel.A função neutralizadora como fonte de legitimação da pena privativa de liberdade.R. Minist.Públ.Est.Ma.São Luís, n.9, jan/dez 2002

 

GRECO. Rogério.. Curso de direito Penal . 11ºed . Rio de Janeiro :Impetus, , 2009

 

FOUCAULT,Michel .Prisão. Vigiar e Punir nascimento da prisão .29º ed.Rio de Janeiro :Editora Vozes , ,2004.

 

Vade Mecum Acadêmico de Direito /Anne Joice Angher, organização. 8º ed. São Paulo :Rideel, ,2009

 

FERNANDES DE ARAÚJO, Gladston.Criminologia Crítica no Brasil.Criminologia Crítica . R. Minist.Públ.Est.Ma.São Luís n-7,jan/dez.2000

 

BARATTA,Alessandro.Do “Labeling Approach” a uma criminologia critica. Criminologia crítica e crítica do direito penal:introdução à sociologia do direito penal.3ºed .Rio de Janeiro : Editora Revan..2002

 

GUIMARÃES.Claudio Alberto .Teorias econômicas dos delitos e das penas:Fundamentos Gerais .Crítica Criminológica aos fundamentos economicistas do direito penal e processual penal. R.Minist.Públ.Est.Ma.São Luis ,nº13jan/dez.2006

 

 


[1] Alunos do terceiro período de Direito Noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, 2009.1

 

[2] GUIMARÃES. Carlos Alberto Gabriel.A função neutralizadora como fonte de legitimação da pena privativa de liberdade.R. Minist.Públ.Est.Ma.São Luís, n.9, p.104 jan/dez 2002

[3] GRECO. Rogério. DAS Penas . Curso de direito Penal . 11ºed . Rio de Janeiro :Impetus, p.494 , 2009

[4] FOUCAULT,Michel .Prisão. Vigiar e Punir nascimento da prisão .29º ed.Rio de Janeiro :Editora Vozes ,p.195 ,2004.

[5] Vade Mecum Acadêmico de Direito /Anne Joice Angher, organização. 8º ed.São Paulo :Rideel, p.335 ,2009

[6] FOUCAULT, Michel. Op Cit p.206

[7] FERNANDES DE ARAÚJO, Gladston.Criminologia Crítica no Brasil.Criminologia Crítica . R. Minist.Públ.Est.Ma.São Luís n-7 p.43 ,jan/dez.2000

[8] BARATTA,Alessandro.Do “Labeling Approach” a uma criminologia critica. Criminologia crítica e crítica do direito penal:introdução à sociologia do direito penal.3ºed .Rio de Janeiro : Editora Revan. p.162.2002

[9] BARATTA.Alessandro .Op cit .p 179

[10] GUIMARÃES.Claudio Alberto .Teorias econômicas dos delitos e das penas:Fundamentos Gerais .Crítica Criminológica aos fundamentos economicistas do direito penal e processual penal. R.Minist.Públ.Est.Ma.São Luis ,nº13,p.81  jan/dez.2006

[11] GRECO.Rogério.Op cit . 9. Penas restritivas de direitos.

[12] FERNANDES DE ARAÚJO,Gladston.Op cit p.45

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