Aprovação-reprovação



Aprovação-reprovação

Tem alunos para todo que é gosto e com as mais diferentes posturas. Sou professor e vejo isso diariamente. Existem aqueles que apostam a vida nos estudos e outros que só estão na escola por força de lei.

Tem aqueles que estudam porque querem aprender e outros que só estão na escola para criar problemas. Nem estudam e nem permitem a tranquilidade dos que desejam estudar: são perturbadores da ordem. Mas a escola tem que suporta-los por força de lei.

Mas também tem as escolas. E elas existem pra ensinar. Ensinar de tudo que pode ser útil para a vida do estudante. Desde ler e escrever e fazer contas até as mais complicadas operações matemáticas e todas aquelas equações e as informações de história, de geografia, de filosofia e de várias outras coisas. As escolas existem pra ensinar e, para isso, nem precisa da força da lei.

Mas nem sempre as escolas conseguem ser um lugar de ensino. Algumas determinações de leis pouco inteligentes fazem com que muito malandro frequente a escola. E, por determinação da lei, a escola tem que suportá-lo ou arrumar uma alternativa pela qual o malandro fique na escola perturbando os estudantes. Ele tem que permanecer na escola – veja bem: “permanecer” na escola não é se fazer aluno – e lá ficar por força da lei.

E hoje, para cumprir a lei de que todas as crianças devem estar na escola, acaba se criando dois problemas. O primeiro é a permanência dos bandidos nas dependências da escola, fazendo-se má influencia para os demais. O segundo é a produção da exclusão. Com um discurso de incluir todas as crianças portadoras de necessidades educativas especiais no universo escolar se instalou um regime de segregação. As escolas e os professores despreparados para essa clientela recebem-nos por determinação da lei, mas não os podem acompanhar adequadamente ou com a atenção que necessitam por que a escola não está equipada e os professores não estão preparados. Com isso o poder publico impõe a segregação pela força da lei.

E hoje é triste ver as condições e a situação do aprendizado. Uma lástima. Não são poucos os alunos que são aprovados sem as minimas condições de evoluir no processo dos estudos e da aprendizagem. Não são poucos os estudantes que terminam o ensino médio... e até a faculdade, sem saber ler... essas crianças que não sabem ler, nem escrever e nem fazer as operações básicas da matemática são fruto de um sistema em que vale não a aprendizagem mas os índices de aprovação; criou-se não um sistema em que se valoriza não o saber, mas as estatisticas. E a aprovação, infelizmente, não está condicionada ao aprendizado. O ideal seria que as notas de um estudante fossem proporcionais ao seu volume de aprendizado. Entretanto, pais e sistema querem aprovação independente de qualquer outra coisa. E, com isso, cresce o volume de estudantes que concluem os ciclos de estudo sem aprendizado. Mas estão amparados pela força da lei.

E isso tem implicações morais. A sociedade que dá tudo aos estudantes, aos filhos, às crianças, sem lhes cobrar a proporcional contrapartida de estudo, de respeito, de responsabilidade, está educando os jovens para a irresponsabilidade, para a delinquência, para o banditismo. É isso o que vemos diariamente nos noticiários. Não são filhos de favelados, mas os filhos da média e alta sociedade que estão sendo presos como integrantes de quadrilhas sofisticadas que roubam e traficam. O caráter de uma pessoa não se molda com festas, facilidades e futilidades, mas com trabalho, estudo e sacrifícios. Não por força de lei.

E isso tem implicações morais. Criou-se uma legislação que impede a criança de conhecer o valor do trabalho; que impede o estudante de ter que se esforçar e sacrificar horas de estudo para o aprendizado; que impede pais e professores de usarem de energia para cobrar responsabilidade dos menores. A consequência não podia ser outra, a não ser essa que vemos: crianças, adolescentes e jovens despreparados, desocupados, descomprometidos com o trabalho e o estudo. Recebem tudo prontinho, sem o sacrifício da conquista. Como recebem tudo pronto e “de graça”, nada valorizam e por isso não tem nada. Sábias são as palavra da raposa ao principezinho: “A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos”. Não se faz caráter por força de lei.

Talvez, quem sabe ainda haja tempo. Talvez, quem sabe se pais, professores, promotores, conselho tutelar, conselho disso e daquilo... pudessem se unir não para “passar a mão na cabeça”, mas para exigir novas leis e novas posturas e fazer novas exigências. Talvez, quem sabe se fossemos mais exigentes, menos condescendentes... talvez houvesse jeito...

Talvez, quem sabe ainda haja tempo, pois os jovens estão aí para aprender, resta saber o que lhes temos a ensinar! Talvez, quem sabe, nosso país ainda tenha jeito...

Que jeito???

 

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura – RO

Download do artigo
Autor: Neri P. Carneiro


Artigos Relacionados


Escola X Família No Contexto Escolar

Ser Professor

A Crise Da Leitura Na Escola

A Interação Entre A Escola E A Família: Um Problema Iminente E Desafiador

Ludicidade E Afetividade No Ensino De Filosofia Com Crianças Em Uma Escola Pública De Belém Do Pará

O Coletivo Escolar E Responsabilidade Da Educação: Da Escola, Da Família Ou Ambos?

Resenha Do Livro ''escola Cidadã'' De Moacir Gadotti