Filósofos da morte de Deus



Filósofos da morte de deus

 

Aqueles que prestaram atenção nas aulas de história e de literatura, certamente se recordarão de alguns períodos marcantes da história da humanidade: renascimento, e iluminismo, por exemplo.

Aqueles que ficaram muito atentos às aulas terão ouvido os professores falarem sobre alguns artistas e pensadores que condenavam as ações da Igreja e foram vistos como ateus.

Aqueles que ficaram muito atentos às aulas e estudaram bastante, certamente, neste momento, se recordarão de alguns desses personagens que marcaram o renascimento e o iluminismo; que condenaram a Igreja e colocaram as bases das reflexões filosóficas que se desenvolveram nos séculos XIX e XX quando começou-se a falar sobre a teologia e a filosofia da morte de deus. E daí a celebre afirmação do alemão Feuerbach, dizendo que o homem criou deus à sua imagem e semelhança; daí a afirmação de outro alemão, Nietzsche, dizendo que o homem matou deus: “Deus morreu! Deus continua morto! E nós o matamos! Como nos consolaremos, os assassinos dos assassinos?”.

Daí foi só mais um passo para a morte dos rumos da própria existência humana.

A questão, portanto, é esta: sabendo-se assassino de deus o homem percebe-se sem rumo, sem algo com o que se consolar: “Como nos consolaremos” é a indagação. Mas quem precisa ser consolado? os assassinos. E quem esses assassinos mataram? aquele que produz assassínios, o senhor da vida. Por ser senhor da vida é também senhor da morte!

Mas o que, realmente, aconteceu? Deus morreu? O homem o matou? O homem o havia criado e depois percebeu o equívoco? De onde vem essa ideia da morte de deus? Essa ideia ainda cabe nos dias atuais?

Ocorreu que o cristianismo – diferentemente das religiões chamadas de pagãs – apresenta uma ideia diferente de Deus. Enquanto para os pagãos as divindades podem ser quaisquer elementos da natureza ou objetos, para o cristianismo Deus é uma realidade imaterial, intocável, abstrata... e com vários outros atributos. Mas um Deus com o qual só se pode comunicar em atos de fé! Por esse motivo o cristianismo precisou provar que Deus existe, pois os não cristãos perguntavam como crer em um deus que não se vê? E a filosofia medieval passou séculos mastigando essa questão. Um livro do filósofo Duns Scotto tem por título “Pode-se provar a existência de Deus?”. Santo Tomás de Aquino, retomando a filosofia de Aristóteles, apresentou as “cinco vias” para se provar a a existência de Deus.

Ocorreu que a Igreja se apropriou desse deus e o subjugou, dominando não só a ideia de divindade mas também a crença e o saber. A igreja passou a ser senhora do saber, da verdade e da fé. E em nome dessa fé, dessa verdade e desse saber – em nome desse deus – perseguia e matava quem se apresentava com outras ideias. Dessa forma ao invés de manifestar Deus, acabou impondo uma ideia de deus.

Nos movimentos renascentista e iluminista, ocorre uma ruptura em relação a essa ideia. Como só se vence uma ideia com outra, no mundo eclesiocêntrico, no lugar do deus da Igreja (teocentrismo) instalou-se um universo centralizado no homem (antropocentrismo). Não mais os deuses ou a ideia de deus da Igreja aparecem como poderosos, mas o homem é quem detém o poder.

E que poder é esse? De onde ele vem? O poder da verdade da ciência. A ciência deu poderes inimagináveis ao homem que se sentiu divinizado.

O problema se instalou quando o homem deus, ao longo do século XX, descobre que o poder advindo da ciência é limitado. Não resolve todos os problemas, dilemas e dificuldades. Assim o homem divino passa a procurar não mais um deus que lhe ampare mas um sentido para sua existência. Só que não encontra, pois não existe. É a morte do homem.

Sem deus, sem o poder “divinificador” da ciência, sem sentido para existir o homem se dirige ao seu ocaso, numa sociedade embrutecida. Ao matar deus e perdendo a fé na ciência, perdem-se os valores de referência. A morte do homem se dá pela morte da ética. Por isso crescem: a violência, a ganância, a droga, as crises familiares, a bandidagem entre os políticos, o desinteresse em lutar contra a corrupção, a indiferença ecológica... Note a apatia em que nos encontramos diante das malandragens dos políticos, das catástrofes. Note que transformamos a solidariedade em negócio e o dinheiro passa a exercer um papel divino.

O outro só nos interessa se der lucro ou nos conferir alguma vantagem. Daí que vendemos nosso voto e a política passa a ser algo que só nos interessa se o candidato nos oferecer algo em troca. Não nos interessamos se é safado, ladrão, corrupto.... só nos interessa o que ele pode nos oferecer pessoalmente. Quanto ao resto...

… “e assim caminha a humanidade”... cavando a própria sepultura ou esperando que surjam outros deuses... ou, quem sabe..

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO


Autor: Neri P. Carneiro


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