O CONSTITUCIONALISMO NO BRASIL: MODIFICAÇÕES AO LONGO DO TEMPO



O CONSTITUCIONALISMO NO BRASIL: MODIFICAÇÕES AO LONGO DO TEMPO

A necessidade de fundamentar os direitos individuais do homem. 

“Este é o tempo de partido, tempo de homens partidos. Em vão percorremos volumes, viajamos e nos colorimos. A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua, os homens pedem carne. Fogo. Sapatos. As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei. Meu nome é tumulto e escreve-se na pedra”. (Carlos Drummond de Andrade)                                                                    

          Bárbara Bandeira de Freitas de Berredo Martins e

                                                                                                          Karine Cabral Nascimento[1]             

Sumário: 1 Introdução; 2 Evolução histórica e as Constituições; 2.1 A Constituição Federal de 1988 e o direito de propriedade; 3 Conclusão; Referência.

 

RESUMO

Aborda-se nesse trabalho a evolução do controle de constitucionalidade, avaliando sua historicidade, influências, modificações e características principais. Levantando aspectos relevantes deste processo evolutivo pelo qual passa o constitucionalismo brasileiro desde a sua origem até hoje já apresentou características distintas, objetivos distintos. Fruto de grandes modificações, esse constitucionalismo será analisado de acordo com as constituições do Brasil, já que essas resumem em seus textos as características marcantes de cada etapa do constitucionalismo.

                                              

PALAVRAS-CHAVE

Constitucionalidade. Constitucionalismo. Constituições Brasileiras.

 

1 INTRODUÇÃO

            Analisando o Constitucionalismo em um de seus significados, podemos classificá-lo como um movimento social, político e jurídico, de alcance sociológico, fazendo com que as Constituições se dividam em quatro fases: (I) Liberal-centralizadora, que corresponde exclusivamente ao Império, tendo um Poder Moderador. (II) Republicana, que foi dominada pelo pensamento de Rui Barbosa e as obras de João Barbalho. É marcado por um nacionalismo realista e autoritário inaugurado por Alberto Torres. (III) Autoritária, que é marcada pelo período em que se desenvolvem as idéias contrárias a um constitucionalismo liberal e um nascente decisionismo autoritário. (IV) Período Liberal-Social, no qual voltou ao modelo centralizador, e abrangendo principalmente as Constituições de 1946 e 1988.

 

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E AS CONSTITUIÇÕES

Com a dissolução da Constituinte, D. Pedro I instituiu o Conselho de Estado, em Decreto de 12 de novembro de 1823, que elaborou o texto que se converteria na Carta outorgada de 1824. [...] Assinale, todavia, que a Constituição de 1824 foi elaborada a partir do Projeto de Antônio Carlos, de tendência nitidamente liberal, que não previa o Poder Moderador, afinal nela introduzido. A 25 de março de 1824 era outorgada por D. Pedro I a Constituição, que foi posteriormente submetida a plebiscito das Câmaras Municipais, destacando-se a do Rio de Janeiro.[2]

            Segundo Kildare Gonçalves Carvalho, a Constituição de 1824 se caracterizou pelo absolutismo na organização dos poderes e por um acentuado liberalismo no tocante aos direitos individuais e fundamentais do homem. Sendo influenciada pelo jacobinismo francês e pelos doutrinadores da Inglaterra, a Constituição Imperial sofreu duas principais reformas: a primeira foi a substituição da Regência Trina por uma Regência provisória, e a segunda foi q redução de poderes das Assembléias Legislativas das Províncias.

            “A dissolução da Constituinte é dos episódios políticos mais controvertidos de toda a história do País”, afirma Paulo Bonavides ao analisar que com essa dissolução, D. Pedro I instituiu o Conselho de Estado que elaborou o texto que se transformaria na Carta Outorgada de 1824. Afonso Arinos afirma que “assim como reinara, na Constituinte Imperial, o pensamento francês, prevaleceu, na Constituinte republicana, o pensamento norte-americano. O federalismo era velha reivindicação nacional. O presidencialismo não o era”.[3]

            Após a proclamação da República, o Direito sofreu influências norte-americanas, inaugurando-se o controle de constitucionalidade das leis. A Constituição de 1891 adotou a forma federal de Estado, com a distribuição dos Poderes entre união e Estados, consagrando-se a autonomia dos municípios em tudo quanto respeite ao seu particular interesse.[4]Adotou ainda a Lei n. 221/94 expressamente o controle difuso, ao prever que qualquer juiz ou tribunal poderia desaplicar as leis inconstitucionais. Sofreu revisão em 1926, final do Governo de Artur Bernardes.[5]

Com a Revolução de 1930, o Governo Provisório nomeou uma comissão para elaborar a nova Constituição, destacando-se o papel da Revolução Paulista de 1932, que exigia a restauração plena do regime democrático.[6]

            Com o aproveitamento do modelo fascista italiano e tendo como base a Constituição de Weimar, de 1919 (protótipo do Estado Social, ou seja, o Estado sobre a sociedade), a Constituição de 1934 se influencia na jurisprudência norte-americana do qual o Senado Federal tinha o controle de coordenação dos Poderes. Manteve-se a divisão de Poderes do federalismo, mas promoveu uma centralização legislativa em favor da União. Surgiu o Título da “Ordem Econômica e Social”, prevendo direitos econômicos e sociais e a ampliação do intervencionismo estatal. Ainda nessa constituição, foi previsto o mandato de segurança para defesa de direitos do ameaçado por ato ilegal, de qualquer autoridade.[7]

            No dia 10 de novembro de 1937, o Presidente Getúlio Vargas, que a ele cabia confirmar dispositivos de Decreto-lei, outorgou a nova Constituição brasileira. Essa nova Constituição possuía idéias contrárias a um constitucionalismo liberal e foi inspirada na Constituição polonesa de 1935, no qual suprimia o nome de Deus e limitou a autonomia dos Estados-Membros e restaurou a pena de morte[8].

            Por muitos anos, a Constituição de 1937 permaneceu inaplicável, pois os órgãos do Poder Legislativo de todos os níveis de governo foram dissolvidos e o plebiscito do qual o texto constitucional determinou não se realizou.

            Com a queda de Vargas, uma reconstitucionalização do País foi necessária. Foi realmente o fato que Getúlio Vargas teve uma saída honrosa do poder, mas sem abandonar a vida política; dando seu lugar ao Presidente Dutra. No primeiro ano de Governo do General Dutra, foi eleita a Assembléia Constituinte para elaborar uma nova Constituição, que substituiria a Constituição de 1937. Após longos debates parlamentares, que se estenderam por mais de sete meses de trabalho legislativo, foi promulgada em 18 de setembro de 1946, a nova Constituição Brasileira.[9]

            Inspirada na Constituição de 1934, a Constituição de 1946 era uma carta liberal democrática do qual tinha em seu conteúdo a preservação do regime republicano, federativo e presidencialista, além de estabelecer os mandatos presidenciais. Destaca-se também o fato de o bicameralismo tenha sido estabelecido.[10]

            Em 23 de janeiro de 1963, o Brasil começou a caminhar na direção da crise de 1964. No dia 24 de janeiro de 1967, cumprindo o disposto no Artigo 8, Ato Institucional nº4, o Congresso Nacional promulgava, depois de aprovado o projeto, aquela que seria a quinta Constituição Republicana: a Constituição de 1967.

Desfigurado o texto de 1946, cuidou-se então de consolidar, em nova Constituição, a obra do movimento militar, já que inclusive a Constituição de 1946 se achava em vigor por força do Ato Institucional n. 1, de 1964, que a manteve. [11]

            A Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 1/69 mantiveram, em linhas básicas, o sistema de controle da constituição de 1946, com as modificações da EC n. 16/65. A federação continuou a mesma, mas com dilatação dos Poderes da União sendo mais nominal que real pelo fato das autonomias locais serem esmagadas. A Emenda n. 7/77 possibilitou a concessão de medida cautelar nos processos objetivos.[12]

            Em 1964, o Brasil estava sob o regime da ditadura militar, e em 1967, estava sob uma constituição imposta pelo governo. A finalidade era apenas garantir os interesses da ditadura, fazendo assim brotar uma necessidade de uma nova Constituição, a partir de 1985, que seria a defensora de valores democráticos.

A Constituição Federal de 1988 assegurou diversas garantias constitucionais, com o objetivo de dar maior efetividade aos direitos fundamentais, permitindo a participação do Poder Judiciário, sempre que houver lesão ou ameaça de lesão a direitos.

Foi determinada a eleição direta para os cargos de Presidente da República, Governador de Estado, entre outros. Previu também uma maior responsabilidade fiscal além de ainda ampliar os poderes do Congresso Nacional, tornando o Brasil um país mais democrático.

Ainda que possa ser acusada de um texto analítico, demasiadamente minucioso e detalhista, a Constituição de 1988, mais do que um qualquer outro momento da história brasileira – além de ter contribuído para enterra a longa etapa de autoritarismo e repressão do golpismo militarista -, expressou importantes avanços da sociedade civil e materializou a consagração de direitos alcançados pela participação de movimentos sociais organizados.[13]                                                

            Foi a primeira Constituição a definir a função da propriedade urbana e é rígida, não sendo facilmente alterada exigindo um processo legislativo mais preparado para elaboração de emendas constitucionais. A Constituição introduziu ainda a figura da inconstitucionalidade por omissão (art. 103), o mandato de injunção (art. 105, LXXI), a argüição de descumprimento de preceito fundamental decorrendo da Constituição.[14]

 

2.1 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E O DIREITO DE PROPRIEDADE PRIVADA

            A Constituição de 1988, em seu art. 5º, XXII e XXIII, estabeleceu entre os direitos fundamentais da cidadania a propriedade privada, que seria o cumprimento de uma função social. Também preservou a propriedade improdutiva, impedindo a desapropriação de imóveis, fazendo com que seja considerada um retrocesso em relação ao Estatuto da Terra de 1964.

A propriedade ou a posse que não cumpre com sua função social, não pode ser defendida pelo judiciário, pois a Constituição Federal de 1988, ao estabelecer como princípio fundamental o cumprimento da função social, condicionou a existência da propriedade o cumprimento de sua função social.[15]

            A propriedade privada da terra foi criada nos países da América Latina no século XIX. No Brasil, essa idéia como absoluto surge com a Lei das Terras de 1850, estipulando que essas só poderiam ser adquiridas através da compra, pois no período da colonização no Brasil a terra era adquirida pelo instituto das sesmarias. Esse modo era considerado condicionado, retomada com a Constituição de 1934 introduzindo no ordenamento jurídico a função social da propriedade e também a de desapropriação por necessidade.

            A Constituição ainda preservou a propriedade improdutiva e reconheceu a União Federal para desapropriar imóveis rurais para fins da Reforma Agrária, que não cumprissem com a sua função social.

 

3 CONCLUSÃO     

            Como visto anteriormente, o constitucionalismo passou por grandes modificações, que puderam ser vistas em cada Constituição. Por ser fruto de circunstâncias históricas, esse constitucionalismo apresentou diversas faces, desde aspectos autoritários até liberais.

            Contudo, o objetivo do constitucionalismo desde sua origem era estabelecer e garantir os direitos individuais do homem, direitos esses que estão impressos no art. 5º da atual Constituição (1988): Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.[16]

            Apesar de as Constituições defenderem em grande parte os interesses das classes dominantes, é notável a defesa de interesses das minorias, pois se fez necessário estabelecer tais direitos, mesmo que a priori o objetivo não tenha sido democrático, mas hoje tais direitos se fazem indispensáveis à sociedade capitalista, repleta de diferenças sociais e econômicas.

           

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Constituição da República: instituída em 5 de outubro de 1988.

CARVALHO. Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição Direito Constitucional Positivo. 14ª edição. São Paulo: Del Rey.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 6ª edição. São Paulo: Del Rey, 1999.

MARES, Carlos Frederico. A função social da Terra. Porto Alegre: Sérgio Fabris editores.

WOLKMER, Antônio Carlos. História do Direito no Brasil. 4ª edição. Revista com alterações. Rio de Janeiro: Forense, 2007.


[1]Alunas do segundo período de Direito noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, 2008.2.

[2]CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 6ª edição. São Paulo: Del Rey, 1999.

[3]Kildare Gonçalves Carvalho. Op. Cit.

[4]WOLKMER, Antônio Carlos. História do Direito no Brasil. 4ª edição. Revista com alterações. Rio de Janeiro: Forense,2007.

[5]CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo. 14ª edição. São Paulo: Del Rey, 2006.

[6] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 6ª edição. São Paulo: Del Rey, 1999.

[7] Kildare Gonçalves Carvalho. Op. Cit.

[8] Ibidem.

[9] WOLKMER, Antônio Carlos. História do Direito no Brasil. 4ª edição. Revista com alterações. Rio de Janeiro: Forense,2007.

[10] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 6ª edição. São Paulo: Del Rey, 1999.

[11] Kildare Gonçalves Carvalho. Op. Cit.

[12] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição Direito Constitucional Positivo. 14ª edição. São Paulo: Del Rey.

[13] WOLKMER, Antônio Carlos. História do Direito no Brasil. 4ª edição. Revista com alterações. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p.145-146.

[14] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição Direito Constitucional Positivo. 14ª edição. São Paulo: Del Rey.

[15] MARÉS, Carlos Frederico. A função social da Terra. Porto Alegre: Sergio fabris editores.

[16] Constituição Federal, art. 5º p.22.

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Autor: Luciana Lima De Sousa


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