Análise do Poema “Canção do Exílio”



Maria Carolina Gomes de Campos

Cristiane Pereira dos Santos

Adriana Helena Fernandes de Caravalho

 

 

1.1            Gonçalves Dias 

Nascido em Caxias, era filho de uma união não oficializada entre um comerciante português com uma mestiça cafuza brasileira (o que muito o orgulhava de ter o sangue das três raças formadoras do povo brasileiro: branca, indígena e negra), e estudou inicialmente por um ano com o professor José Joaquim de Abreu, quando começou a trabalhar como caixeiro e a tratar da escrituração da loja de seu pai, que veio a falecer em 1837.

Iniciou seus estudos de latim, francês e filosofia em 1835 quando foi matriculado em uma escola particular.

Foi estudar na Europa, em Portugal em 1838 onde terminou os estudos secundários e ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (1840), retornando em 1845, após bacharelar-se. Mas antes de retornar, ainda em Coimbra, participou dos grupos medievistas da Gazeta Literária e de O Trovador, compartilhando das ideias românticas de Almeida Garrett, Alexandre Herculano e Antonio Feliciano de Castilho. Por se achar tanto tempo fora de sua pátria inspira-se para escrever a Canção do exílio e parte dos poemas de "Primeiros cantos" e "Segundos cantos"; o drama Patkull; e "Beatriz de Cenci", depois rejeitado por sua condição de texto "imoral" pelo Conservatório Dramático do Brasil. Foi ainda neste período que escreveu fragmentos do romance biográfico "Memórias de Agapito Goiaba", destruído depois pelo próprio poeta, por conter alusões a pessoas ainda vivas.

1.2            O Romantismo

           O Romantismo surgiu na Europa numa época em que o ambiente intelectual era de grande rebeldia. Na política, caíam os sistemas de governo despóticos e surgia o liberalismo político (não confundir com o liberalismo econômico do Século XX). No campo social imperava o inconformismo. No campo artístico, o repúdio às regras. A Revolução Francesa é o clímax desse século de oposição.

            O Romantismo divide-se em três gerações: a primeira é a geração nacionalista ou indianista, a segunda é a geração do mal-do-século e a terceira é a geração condoreira.

            A primeira geração na qual se classifica a “Canção do Exílio” é marcada pela exaltação da natureza, volta ao passado histórico, medievalista, criação do herói nacional na figura do índio, de onde a denominação geração indianista. O sentimentalismo e a religiosidade também são características marcantes. Entre os principais poetas dessa geração podemos destacar Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães e Araújo Porto Alegre.

1.3             “Canção do Exílio”

 

                                                                               Kennst du das land, wo die Citroen blúhen ,

                                                                          Im dunkeln Laub die Gold- Orangen glúnhen?

                                                                                           Kennst du es wohl? – Dahin, dahin!

                                                                                                                     Mocht’ich… ziehn.

                                                                                                                                   Goethe

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

                                                       Gonçalves Dias (Coimbra, julho de 1843)

A “Canção do Exílio” é composta por cinco estrofes, sendo as três primeiras, quartetos e as duas últimas, sextetos. Todos os versos são heptassílabos - formados por sete sílabas poéticas. O poema também não apresenta nenhum adjetivo qualificativo em seus vinte e quatro versos, apenas expressões qualificativas, em uma comparação constante entre “lá” (refere-se ao Brasil) e “cá” (refere-se a Portugal).

O poema possui rimas, como a alternada toante “Sabiá” / “”, a consoante “flores” / “amores”. Podemos observar que tanto as rimas quanto a anáfora “Sem que eu volte lá” / “Sem que desfrute” /Sem qu’inda aviste”, a aliteração em “primores” / “palmeiras”, a anominação em “Nosso céu” / “Nossas Várzeas” /” Nossos bosques “/” Nossa vida”, são importantes para a cadência do poema. Importantíssimo também é a reiteração que há no poema: "As aves que aqui gorjeiam” /” Não gorjeiam como lá”; “ Nossos bosques tem mais vida”/ “Nossa vida mais amores”. Além de outras repetições: “Minha terra tem palmeiras”, “ Onde canta o sabiá”, que formam o ritmo do poema.

Quanto às figuras de linguagem existentes no poema, podemos observar, por exemplo, nas expressões “Minha terra tem palmeiras” (metáfora), “ As aves que aqui gorjeiam”          ( antítese) “ Nosso céu tem mais estrelas” ( metonímia), “ Que tais não encontro eu cá”, “Mais prazer encontro eu lá” ( comparação), “ Nosso céu tem...”, “Nossas várzeas te...”, “ Nossos bosques tem...”, “ Nossa vida...” (anáfora).

 

 

 

 

 

1.3.1 Escansão dos versos do poema “Canção do Exílio”

 

7   Min/há/ ter/ra /tem/ pal/mei/ras, A
6   On/de/ can/ta o/ Sa/bi/á; B
7   As/ a/ves/, que a/qui/ gor/jei/am, C
6   Não/ gor/jei/am/ co/mo/ lá. B

7   Nos/so/ céu/ tem /mais/ es/tre/las, D
7   Nos/sas/ vár/zeas/ têm/ mais/ flo/res, E
7   Nos/sos/ bos/ques/ têm/ mais/ vi/da, F
7   Nos/sa vi/da/ mais/ amo/res.E

 

7   Em/ cis/mar/, so/zi/nho, à noi/te, G
6   Mais/ pra/zer/ en/con/tro eu/ lá; B
7   Mi/nha/ ter/ra/ tem/ pal/mei/ras, A
6   On/de/ can/ta o/ Sa/bi/á. B

7   Min/há/ ter/ra/ tem/ pri/mo/res, E
6   Que/ tais/ não/ en/con/tro eu/ cá; B
7  Em/ cis/mar/ — so/zi/nho, à/ noi/te — G
6  Mais/ pra/zer/ en/con/tro eu/ lá; B
7  Mi/nha/ ter/ra/ tem/ pal/mei/ras, A
6  On/de can/ta o/ Sa/bi/á. B

7  Não/ per/mi/ta/ Deus/ que eu/ mor/ra, H
6  Sem/ que eu/ vol/te/ pa/ra lá;B
7  Sem/ que/ des/fru/te os/ pri/mo/res E
6  Que/ não/ en/con/tro/ por/ cá;B
7  Sem/ qu'i/nda a/vis/te as/ pal/mei/ras,A
6  On/de/ can/ta o/ Sa/bi/á.B

 

1.4            Análise do Poema

 

A primeira publicação da "Canção do Exílio" no Brasil se deu em 1846, com a publicação do livro Primeiros Cantos.

Na primeira estrofe do poema o eu - poético traz a imagem de sua terra natal, exaltando as belezas da natureza, comparando-a com natureza da terra que se encontra exilado.

Um fato importante é que os elementos como “palmeiras” e “Sabiá”, são símbolos que caracterizam a terra brasileira, ou seja, a palmeira é uma árvore que traz consigo a imagem do Brasil e as raízes nacionais. O sabiá que é escrito com a letra maiúscula pelo poeta torna-se a ave símbolo da nação brasileira.

Na segunda estrofe, vemos a exaltação “exagerada” e sem medidas aos atributos que podem ser encontrada “lá” (Brasil). Nota-se também que a natureza brasileira é colocada com superioridade à portuguesa, ficando implícito que o primeiro é melhor que o segundo.

Essa estrofe é considerada a mais importante do poema, pois pode ser encontrada parafraseada no Hino Nacional Brasileiro escrita por Joaquim Osório Duque Estrada.

Na terceira é quarta estrofe a poesia é marcada pela distinção do “lá” e “cá”, ou seja, o lá    ( terra natal) é o prazer “ Mais prazer encontro eu lá”, é ser  livre, é a beleza natural das estrelas, o mais belo cantar de uma ave. Observa-se dessa forma, que somente em seu solo pátrio.

A quinta estrofe caracteriza-se pela finalização do poema, mas não do martírio de estar exilado em terra estranha. O eu- poético roga a Deus para que ele possa voltar à sua pátria.

 

 

1.6 Intertextualidade e Paródias do Poema “Canção do Exílio”

                                                                                                  

A "Canção do Exílio" é um dos poemas brasileiros que mais possui intertextualidades e  paródias. Escrita em 1843, em Coimbra, onde o poeta estudava, a canção transformou-se num ícone múltiplo. Representa, antes de tudo, a saudade (e a idealização) da terra natal, um sentimento universal e sem idade. Além disso, tornou-se a expressão do nacionalismo num país que acabara de conquistar sua independência política.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             

 

Garcia (2005) define paródia como:

a negação do texto original, vai de encontro a ele. É uma recriação de caráter contestador, matem algo de significação do texto original, mas constrói todo um percurso de desvio em relação a ele, uma espécie de insubordinação crítica. 

Dessa forma, podemos observar um exemplo de paródia no poema de Murilo Mendes              “Canção do Exílio”:

 

 

CANÇÃO DO EXÍLIO

         Murilo Mendes (1930)

 

Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha
                                 [Gioconda].

Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.

Ai quem me dera chupar uma carambola de
                                     [verdade]
e ouvir um sabiá com certidão de

                                        [idade].       

    Diferentemente da “Canção do Exílio” de Gonçalves Dias, o poema de Murilo Mendes ridiculariza o nacionalismo demonstrando que a pátria brasileira é uma mistura de elementos estrangeiros e que a cultura e natureza estão possuídos por elementos que não são genuinamente brasileiros. 

      Quanto às intertextualidades podemos observar em outras obras como a de CANTO DO REGRESSO À PÁTRIA (Oswald de Andrade (1925)), CANÇÃO DO EXÍLIO (Casimiro de Abreu (Lisboa, 1855)), NOVA CANÇÃO DO EXÍLIO (Carlos Drummond de Andrade (1945)).

Bibliografia

 

 

CINTRÃO, Sylvia. Canções de exílio e evasão. Nossos Bosques têm mais vida, 2003. Disponível em:
Acesso em 16 de Novembro de 2010.

GARCIA, Lidiane da Cruz. Canção do exílio: análise intertextual. Cáceres, 2005.

GOLDSTEIN, Norma. Versos, sons, ritmos. São Paulo: Ática, 5 ed., 1989.

MARQUES, W.J. O poema e metáfora. Revista Letras, Curitiba, nº 60, p.79-93, jul/dez. 2003.

TERRA, Ernani; NICOLA, José De. Literatura e produção de texto para o ensino médio: curso completo. São Paulo: Scipione, 2 ed., 2002.


Autor:


Artigos Relacionados


Promessas

Liberdade! Liberdade!

Textos Traduzidos (parte Iii)

Aprendizados Bíblicos Sobre A Oração (parte 7 De 7)

Vento

Quem Se Propõe Plantar Tem A Obrigação De Colher

"viajantes"