Psicanálise e Educação



PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO

“Quando um indivíduo nasce, ele não vem ao mundo como uma tela em branco, mas sim, inserido numa história familiar que compreende várias gerações e recebe uma série de missões e projeções dos pais, avós e família extensiva.”

Bowen

O que é psicanálise?

O presente capítulo tem como objetivo buscar subsídios na Psicanálise  para interpretar os problemas vividos pela família, pela escola e pela sociedade, provenientes da falta de limites na educação das crianças. Para relacionar Psicanálise/Educação e tentar entender alguns comportamentos humanos à luz da mesma faz-se necessário definir o que é psicanálise.

No Dicionário de Termos de Psicanálise de Freud (1978) encontra a seguinte definição:

Psicanálise é o nome: (1) de um processo para a investigação de processos mentais, que são quase inacessíveis de outra maneira; (2) de um método (baseado naquela investigação) para o tratamento das desordens neuróticas e (3) de uma coleção de informações psicológicas, obtidas dentro daquelas orientações, que, gradualmente, está sendo reunida numa nova disciplina.(p.158).

A Psicanálise, de acordo com a obra citada, é uma concepção dinâmica, que reduz à vida mental a interação de forças reciprocamente impulsoras, que são representantes psíquicas de uma fonte contínua de excitação proveniente do exterior do organismo (que se encontra nos limites dos domínios psíquico e físico) e são obstaculizantes.

Ela é caracterizada pelos métodos com os quais trabalha e não pelos assuntos que aborda. Os métodos são passíveis de serem colocados em prática, sem violar a sua natureza essencial, à história da civilização, à ciência da religião e à mitologia, tanto quanto o estudo das neuroses. O objetivo supremo da Psicanálise é o estudo do inconsciente na vida mental, procurando desvendar os complexos que foram reprimidos como resultado de sentimentos penosos a ele associados e que quando há uma tentativa para trazê-los à consciência, produzem sinais de resistência. Conforme se encontra no Dicionário de Termos de Psicanálise de Freud:  “Uma das tarefas da Psicanálise é levantar o véu da amnésia que cobre os anos iniciais da infância e trazer à memória consciente as expressões da vida sexual infantil, subjacentes.” (p.160).

A terapia analítica, ou seja, o campo de aplicação da Psicanálise é o das neuroses obsessivas e, além destas, aquelas anormalidades de caráter, que foram desenvolvidas, em vez dessas doenças.

A Psicanálise se originou como um procedimento terapêutico, foi além disso, mas nunca abandonou seu campo original de trabalho, e ainda presa o contato com o material clínico, para os seus progressos e desenvolvimentos posteriores.

Jacintho(2005) em seu trabalho “Compreensão Sociológica da Psicanálise” mostra que a Psicanálise é uma forma especial de psicoterapia e começou a ser cientifica na França, no século XIX, quando a psicologia se sustentava nos estudos sobre a hipnose. O autor também fundamenta os dados históricos e pesquisadores que seguem.

Nos séculos XV e XVI já existia a arte da psicoterapia sustentada por Vives (1492-1540), Paracelso (1493-1541) e Johann Weyer (1515-1588). Esses estudiosos davam explicações naturais para as causas da enfermidade mental e não um tratamento psíquico completo.

No século XVIII, Pinel (1745-1826) faz uma mudança radical no trato com o doente, oferecendo um tratamento humano, digno e racional. Seguido por Esquirol (1772-1826) que introduz um tratamento regular sistemático que engloba inúmeros aspectos ambientais psíquicos, que era denominado tratamento moral.

Liébeault (1823-1904) se torna referência mundial, utilizando o hipnotismo para tratamento. A técnica utilizada era pessoal e não interpessoal, uma vez que o tratamento era pessoal, direto e dirigia-se ao enfermo, o qual recebia influência curativa do médico em atitude totalmente passiva, não sendo considerada psicoterapia.

Chegando ao século XIX Bernheim (1891) trabalha realmente a histeria, a sugestão e a psicoterapia. Seguido por Janet em Paris, Breuer e Freud em Viena, os quais realizam trabalhos onde a relação interpessoal está evidente, surgindo assim à psicoterapia.

Com a introdução da Psicanálise, feita por Freud (1856-1939) a psicoterapia alcança um patamar científico. A psicoterapia alcança à psique pelo único caminho possível: a comunicação, que é feita pela palavra (linguagem verbal e pré-verbal) e tem como princípio à relação interpessoal médico/ paciente.

O desenvolvimento que acontece de forma muito rápida da hipnose de Breuer até a Psicanálise é fruto do trabalho magnífico de Freud, pois já na primeira década do século XX a psicanálise já se apresentava sistematizada como um corpo de doutrina coerente e amplo.

Freud começou seus trabalhos utilizando uma técnica denominada “Coerção associativa”, na qual ele descobre que a pessoa esquece as situações feias, desagradáveis e dolorosas que contrariam a ética ou a estética. E descobre posteriormente o ponto principal da psicanálise que é a “resistência psíquica” que o leva a criar a técnica da “associação livre”, a qual caracteriza a psicanálise.

O termo psicanálise foi utilizado por Freud, pela primeira vez em 1896, no artigo “L Hérédite et l’ Étiologie dês Névroses”, no qual ele escreve que as experiências de passividade sexual antes da puberdade é que são responsáveis pela histeria.

Para entender a psicanálise, os vários conceitos, termos, definições e o funcionamento da vida mental do indivíduo é necessário entender a teoria Topográfica ou 1ª tópica e a teoria Estrutural ou 2ª tópica.

Jacintho(2005) explica: “O termo ‘tópica’ significa teoria dos lugares (do grego) pertence desde a antiguidade grega à linguagem filosófica. Para os antigos, e em especial para Aristóteles, os lugares constituem rubricas, de valor lógico ou retórico, de que são tiradas as premissas da argumentação.” (p.31).

Analisando a citação é possível perceber a divisão do aparelho psíquico em certo número de sistemas, que possuem características ou funções diferentes e dispostas numa certa ordem em relação aos outros, o que possibilita compará-los a lugares psíquicos que oferecem uma representação figurada espacialmente.

D’Andrea (1986) em seu livro “Desenvolvimento da Personalidade” explica as duas tópicas. Na 1ª tópica ou teoria Topográfica o aparelho psíquico está dividido em três planos ou sistemas: o consciente, o pré-consciente e o inconsciente.

O consciente é uma parte relativamente pequena e inconstante da vida mental de uma pessoa. Está relacionado a tudo aquilo que ela está ciente em determinado momento e cujo conteúdo se origina de duas fontes principais - o conjunto de estímulos atuais, percebidos pelo aparelho sensorial e as lembranças de experiências passadas, relembradas naquele momento. Quanto mais a pessoa concentra sua atenção para os fatos da realidade, menos espaço haverá para as recordações do passado. Da mesma forma, quanto mais a consciência se ocupar das lembranças, menos atenta a pessoa estará para os fatos atuais.

O pré-consciente é o reservatório de tudo que pode ser lembrado no instante seguinte à consciência. É uma área intermediária entre o consciente e o inconsciente.

O inconsciente é uma área da vida psíquica, onde estão localizados os impulsos primitivos que influenciam o comportamento e dos quais não se tem consciência e um conjunto de idéias carregadas emocionalmente, que uma vez foram conscientes, mas devido aos seus aspectos intoleráveis foram expulsas da consciência para um plano mais profundo, de onde não poderão emergir voluntariamente.

Em relação ao mecanismo, o inconsciente obedece a leis contrárias àquelas dos processos conscientes e pré-conscientes. As leis de funcionamento do inconsciente são chamadas de processo primário, no qual não existe noção de tempo. Os conteúdos inconscientes não se desgastam, são sempre atuantes. Não existe lógica para o inconsciente, ele desconhece os princípios de identidade, contradição e causalidade. Impulsos contrários coexistem sem se opor, a noção de espaço não corresponde à realidade, ou seja, uma pessoa pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Não existem dúvidas ou incertezas no inconsciente.

Já o consciente e o pré-consciente são regidos pelo processo secundário, que apresenta as seguintes características: considera a seqüência de tempo dos eventos, estabelece relações lógicas, introduz fatores casuais, preenche lacunas na linha dos pensamentos. O processo de pensamento começa pelas idéias pré-conscientes que vão chegar ao consciente no estado de vigília.

Para Jacintho a divisão do aparelho psíquico em consciente e inconsciente é o ponto chave da Psicanálise. Somente o conhecimento desse sistema é que permite à Psicanálise compreender os processos patológicos na vida mental e encontrar para os mesmos um lugar na estrutura da Ciência.

Ser consciente é se basear na percepção mais imediata e definida, ou seja, um elemento psíquico não é consciente por um longo período de tempo.

No inconsciente existem processos mentais e idéias muito poderosas que produzem inúmeros efeitos na vida mental do indivíduo. O motivo pelo qual essas idéias não podem tornar-se conscientes é que existe uma força que se opõem a elas. Se não existisse essa força elas poderiam tornar-se conscientes e seria  pouca a diferença que tem em relação a outros elementos reconhecidamente psíquicos. O estado que as idéias ficam antes de serem conscientes é denominado de recalcamento, o qual se manifesta como resistência durante a análise.

O conceito de inconsciente é obtido a partir da teoria do recalcamento. O pré-consciente é o latente, que é inconsciente somente em termos descritivos e não no sentido dinâmico.

Freud (n.d.), no livro “A interpretação dos Sonhos II”, mostra que o pensamento inconsciente procura chegar ao pré-consciente para conseguir passar a consciência. Ele teve a preocupação de esclarecer que o aparelho psíquico não pode ser considerado com um pedaço de terra com divisões estanques, com funções diferentes e separadas. Substituiu um modo topográfico de representação por um modo dinâmico, controlado por uma catexia de energia, que ligada ou retirada de um agrupamento psíquico sofra a influência de uma instância ou de outra. O que tem mobilidade não é a própria estrutura psíquica e sim sua enervação. Mas acredita ser possível fazer uso da imagem figurada do aparelho psíquico, para melhor compreensão de sua estrutura e funcionamento, lembrando que as estruturas psíquicas não devem ser vistas como se estivessem situadas em elementos orgânicos do sistema nervoso, mas “entre eles”, local em que fornecem seus correlatos.

Não é possível entender os processos inconscientes sem que eles manifestem na consciência algum efeito que possa ser observado e analisado. Porém o efeito consciente pode se manifestar de forma completamente diferente do caráter do processo inconsciente, não sendo possível à percepção interna encarar um deles como substituto do outro.

O estar consciente não pode ser extremamente valorizado para se ter uma opinião certa da origem do psíquico, uma vez que o inconsciente é a referência da vida psíquica, ou seja, ele é a esfera mais ampla que engloba em si a esfera menor do consciente. Como mostra Freud:

Tudo que é consciente tem um estágio preliminar inconsciente, ao passo que aquilo que é inconsciente pode permanecer nesse estágio e, não obstante, reivindicar que lhe seja atribuído o pleno significado do processo psíquico. O inconsciente é a verdadeira realidade psíquica; em sua natureza mais íntima, ele nos é tão desconhecido quanto à realidade do mundo externo, e é tão insuficientemente apresentado pelos dados da consciência quanto o é o mundo externo pelas comunicações de nossos órgãos sensoriais. (pp. 602,603).

O pensamento inconsciente é ativo tanto durante o dia como à noite. Nas produções intelectuais e artísticas não se pode valorizar apenas o caráter consciente, pois apesar do mesmo apresentar sua parcela de contribuição o caráter pré-consciente e inconsciente participam ativamente do processo.

O autor define dois tipos de inconscientes separado empregados pela Psicologia, mas para ele um é o inconsciente  que é inadmissível  à consciência e o outro é o pré-consciente pois suas excitações depois de observarem  certas regras e de passarem por uma censura, sem a consideração do inconsciente, chega à consciência. O pré-consciente possui uma energia de catexia móvel, parte da qual é denominada de atenção, que permite as excitações atravessarem uma hierarquia de instâncias para chegarem à consciência.

A consciência, considerada por muitos, tão poderosa e onipotente é definida por Freud apenas como um órgão sensorial para a percepção de qualidades psíquicas. Ela é suscetível a excitação por qualidades, mas incapaz de reter traços de alterações, ou seja não possui  memória. O material excitatório  chega à consciência proveniente das seguintes fontes: do sistema pré-consciente, sistema perceptível e do interior do próprio aparelho.

Freud (n.d.) afirma que: “Toda sorte possível de exemplos de como um pensamento pode ser apartado da consciência ou irromper nela, dentro de certas limitações, encontram-se reunidos no arcabouço dos fenômenos psiconeuróticos, e todos apontam para as relações íntimas e recíprocas entre a censura e a consciência.” (p.607).

Muitas vezes a censura é ludibriada, permitindo que uma fantasia que normalmente permaneceria no pré-consciente venha à consciência sob disfarces inocentes como uma queixa, um sintoma.

Para o autor a realidade psíquica é uma forma especial de existência, que não pode ser confundida com a realidade material. Os atos e as opiniões manifestas de forma consciente são, normalmente, suficientes para estabelecer julgamentos sobre o caráter humano. Os atos devem ser considerados antes e acima de tudo, uma vez que muitos impulsos que surgem na consciência são ainda reduzidos a nada pelas forças reais da vida anímica antes de se manifestarem em forma de atos. A complexidade do caráter do homem é muito rara e singular, impelida de um lado para outro por forças dinâmicas.

A 2ª tópica ou teoria Estrutural explica a atividade psíquica através de uma estrutura que foi denominada de aparelho psíquico e está dividida em três partes: id, ego e superego.

O id é a parte original desse aparelho e a partir dele se desenvolvem as outras duas. Constitui a parte herdada e que está ligada à constituição. O indivíduo ao nascer já possui esta estrutura, a qual está voltada para satisfação das necessidades básicas. Segundo D’Andrea: “A atividade básica do id consiste de impulsos que obedecem ao princípio do prazer, isto é buscam o prazer e evitam a dor, na medida em que essas sensações são definidas pela própria natureza do organismo. Nesse sentido a atividade humana, no início da existência, é basicamente animal.” (p.12).

Percebe-se pela citação que nesse período a criança, na busca por satisfazer seus impulsos não consegue avaliar sua racionalidade, nem as fontes de satisfação disponíveis. O que ela almeja é a gratificação imediata e não tolera frustração. O id representa a herança biológica da pessoa.

O ego é o intermediário entre o id (principio do prazer) e o mundo externo. Ao deparar-se com as demandas do meio, a criança necessita gradualmente, redirecionar os impulsos do id, para que estes sejam satisfeitos dentro do princípio da realidade e não do prazer, como acontecia nos seus primeiros meses de vida. Nessa fase ela deve suportar um sofrimento para depois alcançar o prazer e renunciar a um prazer que poderá fazê-la sofrer posteriormente. Tanto o id quanto o ego visam o mesmo objetivo: encontrar a satisfação e evitar a dor. Em relação ao mundo interno, o ego aprende a controlar as demandas dos impulsos decidindo se os mesmos poderão ser satisfeitos imediatamente, mais tarde ou nunca. Quanto ao mundo externo, percebe os estímulos, avalia sua qualidade, intencionalidade e a partir de lembranças de experiências passadas, protege-se dos estímulos percebidos como perigosos, utiliza os estímulos favoráveis e realiza modificações no meio, que possam resultar em benefício da própria pessoa. São atribuições do ego: perceber, lembrar, pensar, planejar e decidir.

O superego se forma à medida que a criança descobre que precisa se adaptar às demandas do meio obedecendo a normas e regras. O ego tem de lidar várias vezes com os mesmos tipos de problemas e aprender a encontrar soluções socialmente aceitáveis. No entanto o indivíduo não precisará parar para pensar cada vez que isto ocorrer, pois a decisão será automática, uma vez que as normas e regras impostas pelo mundo externo vão se incorporar na estrutura psíquica, construindo o superego. Este é chamado, popularmente, de “consciência” e representa a resposta automática, certo ou errado, que surge no indivíduo frente às diversas situações que exigem uma tomada de posição. O superego representa a herança sócio-cultural do indivíduo.

São funções principais do superego: inibir os impulsos do id, principalmente os de natureza sexual e agressivos, pois estes são os impulsos cuja exteriorização é mais condenada pela sociedade; persuadir os alvos realistas por alvos moralistas; lutar pela perfeição.

O id, o ego e o superego não podem ser considerados de forma isolada no seu desenvolvimento e funcionamento. Eles são interdependentes, ou seja, o ego desempenha papel integrador lidando simultaneamente com as demandas do id, do superego e do mundo externo.

      O id e o superego não são realistas, agem imediata e irrefletidamente, o primeiro buscando a qualquer preço o prazer e o segundo proibindo automaticamente. Já o ego é a parte racional que realiza uma transação realista considerando os aspectos da natureza do indivíduo e o tipo de meio que ele vive, decidindo o que fazer, quando e a forma, buscando sempre o bem estar integral do organismo. A citação de D’andrea, conclui o que foi exposto até aqui sobre o aparelho psíquico:

O desenvolvimento do homem como ser social, baseia-se num equilíbrio entre as forças dos impulsos primitivos e irracionais do id e as forças e exigências do superego e do meio a partir do qual este se formou. O bom resultado desse equilíbrio dependerá da existência de um ego fortalecido, de um superego moderado e do conhecimento da natureza dos impulsos do Id. Caso contrário, o equilíbrio da personalidade obedecerá a padrões desviados da normalidade, entendendo-se aqui, por normalidade a tendência a um completo bem-estar biopsico-social. (p.14).

Bessa (2005) em seu texto “O discurso Circulando entre O Real e o Simbólico” mostra um novo paradigma psicanalítico apresentado por Jacques Lacan a partir da década de 50. Assim como a descoberta do inconsciente, tal como é concebido pela Psicanálise, realizado por  Freud, no início do século XX, representou um paradigma para a Psicanálise, a releitura que Lacan fez das obras de Freud acrescentando conhecimentos do estruturalismo e da lingüística,  representou um novo paradigma psicanalítico, ao  tratar a Psicanálise num novo lugar - o lugar do discurso.

Os conhecimentos do estruturalismo e da lingüística possibilitaram a Lacan a interpretação psicanalítica tendo como parâmetros os três registros: simbólico, imaginário e real - RSI, que são considerados paradigmas lacanianos. Para essa nova forma de interpretar a Psicanálise, a analise é algo que se realiza no nível da fala e é necessário escutar, questionar e interrogar o discurso do analisando.

RSI foi um nome que Lacan atribui a estrutura psíquica após reler a obra de Freud, encontrar essas três instâncias e perceber a que registros cada uma se relaciona especificamente.

O imaginário é a área do sentido, como por exemplo, a pessoa apaixonada que sente completamente feliz. A pulsão que Freud postulou desde o início de suas obras se refere a essa busca constante que o indivíduo faz em busca de algo que preencha sua incompletude. Essa completude é imaginária e parcial.

Bessa acrescenta que: “... a ordem simbólica é algo que nos permeia e antecede. A linguagem já existia antes de nós e a criança já é falada e já ocupa um lugar no discurso de seus pais antes mesmo de ser concebida.” (p.02).

Para se constituir como sujeito é preciso que a criança incorpore a Lei, o Nome-do-pai, entrando na ordem simbólica, para adquirir a linguagem e se formar sujeito. Essa ordem do simbólico é formada por significantes que se associam, obedecendo a certas leis lingüísticas.

Dessa forma Lacan explica que o imaginário é o campo do sentido e o simbólico passa a ser a área do duplo sentido, ou seja, uma mesma palavra pode representar vários sentidos e, até mesmo, sentidos opostos.

Já o real se refere àquilo que não pode ser simbolizado. Ele está fora do registro do discurso. Na análise o real pode ser atravessado, porém jamais será simbolizado, visto que ele é o que resta do processo de simbolização.

A separação das três instancias, ou registros, foi feita apenas para fins de explicação e entendimento, pois na prática elas estão interligadas, ou melhor, entrelaçadas. O próprio Lacan representou essa união através do nó borromeano (conforme se encontra no anexo C).

O simbólico, o imaginário e o real são articulados de acordo com as propriedades do nó borromeano. Eles só existem segundo uma certa amarração, pois se um dos elos se solta, os demais se desfazem, ou seja os três registros formam o um, a unidade.

Para Freud o que gera a incompletude é a falta, o objeto perdido, a impossibilidade de saber qual é o objeto sexual.  Lacan se refere a essa falta, este objeto perdido para sempre o denominando de objeto a. Essa incompletude, esse objeto a, acompanha o indivíduo em todas as fases de desenvolvimento, conforme será visto no decorrer do presente capítulo.

 

 

4.2 - Relação entre Psicanálise e Educação

 

Ao discutir a relação entre Psicanálise e Educação ainda não existe consenso entre os diversos teóricos.

Pires (2006) no seu texto “O (im)possível diálogo da Psicanálise com a Educação” aponta duas correntes distintas de teóricos.

Para uma corrente não existe relação entre psicanálise e educação, elas se dirigem para lados contrários. Esta corrente de pensamento percebe que, o único ponto capaz de articular a Educação com a Psicanálise, é a análise do professor e a análise do aluno. A criança que através da análise trabalha seu sintoma terá mais condições de enfrentar a realidade do cotidiano e aprender de forma mais prazerosa. E o professor que pela análise reconhecer seu sintoma terá condições de se libertar da força de seu narcisismo, e não fará do aluno o seu ideal. Reconhecendo a existência e o poder do inconsciente poderá renunciar a sua fantasia de poder modelador.

De outro lado existe a corrente que acredita no “casamento” da Psicanálise com a Educação, embora despreze a possibilidade de criar uma “pedagogia psicanalítica”.  Esta considera a escola na sua dimensão social propondo ofertar ao aluno uma ordenação das leis que regem as relações humanas para que a partir do simbólico o aluno possa estabelecer sua caminhada. Uma das teóricas que defende essa postura é Maria Cristina Kupfer.

Kupfer (1989) em sua obra “Freud e a Educação - o mestre do impossível” utiliza um trecho de uma carta que Freud escreveu a Charles Berg:

O senhor compreende que eu abrigue certas suspeitas contra a técnica daqueles analistas que se dedicaram à popularização da Psicanálise. Esta me parece uma tarefa sumamente difícil, ou mesmo impossível: O homem da rua dificilmente admitirá nossa concepção da mente inconsciente, nem se mostrará disposto a aceitar a importância que concebemos aos impulsos primários. A Psicanálise talvez nunca chegue a ser popular. (p.96).

Após sistematizar e aplicar toda teoria da vida psíquica, no ano de sua morte, Freud chegou à conclusão que um homem do povo não conseguiria entender a Psicanálise e compreender a hipótese da existência ativa do inconsciente. Freud queria ensinar utilizando o mesmo método que um professor tradicional. Pretendia ministrar uma aula e posteriormente solicitar aos alunos que devolvessem, por meio de uma prova, que haviam aprendido corretamente seu pensamento. Situação que Freud percebeu ser impossível.

Kupfer acredita que ao pensar como um professor clássico, ao afirmar a impossibilidade das pessoas comuns aceitarem a Psicanálise, Freud tinha deixado de lado sua posição mais propriamente psicanalítica. Se ele tivesse deslocado um pouco seu foco de atenção, teria conseguido ser mais fiel às suas próprias idéias. Uma vez que é sabido, através do inconsciente, que a pessoa não tem controle sobre o que diz e nem tampouco sobre os efeitos de suas  palavras sobre o ouvinte. Não é possível saber o que o ouvinte fará com as idéias que recebeu, a que outra irá associá-las, que movimento de desejo o fará gostar mais de uma idéia e menos de outra. As palavras irão produzir efeitos no inconsciente do ouvinte que são impossíveis de serem previstos.

Devido às descobertas psicanalíticas de inconsciente e pulsão de morte não há como aplicar a Psicanálise à Educação, visto acreditar que em qualquer atividade humana o inconsciente introduz o imponderável, o imprevisto, o que desvanece. Não sendo possível criar uma metodologia pedagógico-psicanalítica, pois uma metodologia exige ordem, estabilidade, previsibilidade e estas características não existem no inconsciente.

Quando faz análise, existe uma metodologia, uma teoria da técnica, uma montagem propiciadora, contudo o psicanalista não tem controle sobre os efeitos que produz. Ele tem o conhecimento para saber como dirigir uma cura, mas não consegue saber por quais caminhos a pessoa em análise poderá se enveredar.

Assim como o psicanalista, um professor, que orientado por idéias psicanalíticas, organizar suas aulas com menos rigor, não terá controle sobre os efeitos que produzirá sobre seus alunos. Pode detectar através de uma prova o que o aluno assimilou naquele instante, mas não terá condições de saber as repercussões inconscientes de sua presença e seus ensinamentos.

Segundo a autora, a psicanálise pode transmitir ao educador, e não a pedagogia, uma ética, um modo de ver e entender a prática educativa. É um conhecimento que pode gerar uma filosofia de trabalho. Não podendo esperar nada mais, caso se queira ser coerente com as ideais freudianas. Para alguns essa contribuição pode ser considerada ínfima, mas se levar em conta, com o auxílio da própria psicanálise, o quanto é difícil para o professor renunciar a posição de poder que o lugar de professor oferece, verá que essa contribuição é muito importante. Freud escreveu muito sobre esse poder que reveste os professores e sobre o abuso que é feito dele. Explicou também que é desse poder que a pedagogia extrai sua eficácia, ou seja, ela reprime para ensinar, utiliza a energia libidinal sublimada e não sexualizada.

Um professor orientado pelos princípios psicanalíticos saberá suportar sinais de “rebeldia”, que serão importantes para o desenvolvimento intelectual dos alunos.

A interação entre o conteúdo trabalhado e a subjetividade de cada aluno é que possibilita o pensamento renovado, a criação, a geração de novos conhecimentos.  O mundo desejante que habita cada ser humano será preservado cada vez que o professor renunciar o controle absoluto de seus alunos. O professor saberá que estão em jogo forças que ele não conhece totalmente, mas que são fundamentais para a superação de professor enquanto figura de autoridade e indispensável para que o aluno possa desabrochar como ser pensante. Foi o próprio Freud que deixou como exemplo que o aluno deve “matar” o professor para se tornar mestre de si mesmo.

Kupfer reconhece a dificuldade do professor em aceitar uma pedagogia que o assassine, contudo esclarece que um mestre esclarecido vislumbrará nesse propósito uma forma de se libertar e tirar dos seus próprios ombros uma carga de controle excessiva e indesejável. Tendo que enfrentar outra que é a de permanecer tranqüilo, ciente de seus poderes e limites, humilde e impotente frente à tarefa de ajudar o aluno a assumir seu mais importante compromisso com a vida – “ser uma pessoa livre e produtiva.”

Essa visão psicanalítica dá origem a duas posições: a do(a) professor(a) e a do(a) aluno(a). Cabe ao(à) professor(a), conduzido(a)  pelo seu desejo, o grande esforço para organizar, articular, tornar lógico sua área de saber e transmiti-la aos discentes.

Já o(a) aluno(a) tem o papel de desarticular, esmiuçar, ingerir e digerir o saber transmitido pelo professor que provoca seu desejo e que oferece sentido. Buscando através da transferência, único caminho aberto entre professor(a)/ aluno(a), encontrar nas profundezas do inconsciente ecos que dão sentido à vida.

O(a) professor(a) deverá aceitar esse assassinato feito a ele(a) e ao seu conhecimento, sem renunciar suas próprias certezas, pois é nelas que encontra seu desejo. Contribuindo, assim, para uma relação de aprendizagem autêntica.

Já em 2001, em seu livro “Educação para o futuro: psicanálise e educação”, dez anos após “Freud e a educação - o mestre do impossível”, Kupfer afirma que ao analisar a Psicanálise, não apenas como um corpo de conhecimento, mas acrescentar a ela cem anos de práticas, análises, movimentos institucionais e também a educação vista como um conjunto de discursos sociais em circulação há mais de um século pode concluir que a psicanálise mudou o mundo da educação. Essa mudança não ocorreu no sentido que Freud almejava - no sentido de tornar as pessoas melhores ou de produzir pessoas mais felizes e menos neuróticas.

A mudança ocorreu a partir do momento que a psicanálise reconheceu a educação como um discurso social e começou a dialogar com ela nas escolas, na mídia, na universidade. A psicanálise se pôs a falar e aconteceu o mesmo que acontece com o sujeito em análise, transformou-se pelo efeito de suas palavras. Deixou o divã e ganhou as instituições, os hospitais e as escolas.

Kupfer afirma que: “A chuva poderá germinar a semente se o solo for fértil - o saber da psicanálise poderá ser operativo para um educador  se ele puder se apropriar desse saber.” (p.118).

A partir do instante que o educador busca o saber da psicanálise, ele já está formulando uma demanda, no corpo de conhecimentos que busca já está o seu desejo.

Nesse sentido cabe ao(à) professor(a) transmitir conceitos com rigor, encadeamento e lógica e ao educador /aluno ficará o papel de destroçar, despedaçar, engolir pedaços que despertam o seu desejo e transferir.

Quando a citação anterior se refere ao saber da Psicanálise como operativo, significa afirmar que o conhecimento da mesma poderá levar o(a) professor(a) a transmitir e fazer aprender utilizando um ato educativo da forma como ele é entendido pela Psicanálise, ou seja, “como transmissão da demanda social além do desejo. Como transmissão de marcas, como transmissão de estilos de obstrução da falta no outro.” (Kupfer, 2001, p.119).

O(a) professor(a) que se dedica a estudar Psicanálise se transforma, passa a enfrentar outros sentimentos - de angústia, de atuação, de defesa etc.. Ele(a) deixará de ver o aluno(a) apenas com um corpo que pode condicionar. O conhecimento da Psicanálise não é objetivo, assim como nenhum outro, existe uma “passagem” desse conhecimento para o inconsciente. A busca de informação dependerá da presença do sujeito, da forma subjetiva que cada um assimila o que recebe.

Muitos professores, ao perceberem o enfraquecimento da função paterna, nos dias atuais, e sentirem que perderam também sua posição e autoridade, recorrem à psicanálise em busca de caminhos alternativos para a prática pedagógica.

A Psicanálise, segundo Kupfer(2001) não é uma visão de mundo, uma doutrina, não é pragmática. Contudo ela já se encontra na cultura e não há como fugir às solicitações feitas pelos docentes. Assim a Psicanálise não tem a pretensão de controlar ninguém. O(a) professor(a) orientado(a) por seus princípios não pode ter a pretensão de manipular, resgatando dessa forma uma posição de educador(a) que já existiu e foi ocupada atualmente pelo(a) professor(a) que ensina sem saber a utilidade do que ensina. É como se tivesse falando a objetos. Para mostrar que não é um objeto o aluno se revolta, grita, apresenta atos indisciplinados que o(as) professor(a) não consegue controlar e se desespera.

Quando o(a) professor(a) recorre à Psicanálise passa a ver o(a) aluno(a) como sujeito, mesmo que não saiba como atingi-lo(a) e que métodos usar para transmitir o conhecimento.

A teoria psicanalítica pode ser transmitida na universidade, no ensino médio ou na instituição psicanalítica, produzindo os efeitos subjetivos de qualquer teoria que fale do sujeito. Kupfer (2001) afirma que: “Para a Psicanálise o sujeito do inconsciente se constitui na e pela linguagem. Desta perspectiva a linguagem não é instrumento de comunicação, mas a trama mesma de que é feito o sujeito.” (p.124).

À medida que uma criança cresce o sujeito se constitui, formando sua estrutura psíquica que é diferente do crescimento do organismo biológico. O bebê nasce sem a capacidade de simbolizar e para desenvolvê-la necessita do Outro (pai, mãe, alguém que cuida) que desejante da criança, faz com que esta ocupe um lugar em sua rede de significante.

No decorrer do seu desenvolvimento o sujeito não encontra quem dê respostas para o mistério de sua presença no mundo, pois essas respostas não existem. Com isso ele, movido pelo desejo de buscar respostas, vive em constante busca para sua falta (lacuna, vazio). Essa busca deixa marcas, inscrições que definirão o que ele fará em sua vida, os objetos que buscará para satisfação plena, para preencher a falta que o levou a direcionar seu percurso subjetivo. Não irá encontrar os objetos de satisfação plena, não terminará a busca e é isso que manterá sua vontade de viver.

Um professor que trabalha levando em conta o sujeito não se prende às técnicas de adestramento e adaptação, aos métodos de ensino, nem aos conteúdos tradicionais, fechados e inquestionáveis. Ele coloca os objetos do mundo para que o aluno, desejante possa encontrar suas respostas, escolha entre o que lhe é oferecido o que é mais condizente com seus desejos.

Dessa forma, Kupfer argumenta que a teoria da psicanálise e não a psicanálise do tratamento-padrão é útil para o(a) professor(a) e para o(a) aluno(a) na medida que possibilitará ao(à) professor(a) levar em conta, no ato de ensinar, a presença do sujeito.

Apesar de todos os estudos e pesquisas da Psicologia, Neurologia, Psicopedagogia sobre os problemas de aprendizagem cresce a cada dia a quantidade de crianças com problemas de aprendizagem nas escolas.

Patto(1990), citada por Kupfer(2001), aborda que o empenho dos(as) professores(as) em superar os problemas de aprendizagem está sendo em vão por que estes(as) acreditam que o problema está na criança. E, na verdade, os mesmos se encontram nas relações que se estabelecem no interior do cotidiano escolar, onde a escola ataca, nega e desqualifica o degrau, a diferença social, o desencontro de linguagens entre as crianças de extração pobre, de um lado, e a escola comprometida com outras extrações sociais, de outro.

Para mudar a situação seria necessária uma grande reforma no sistema educacional, que atingisse a estrutura administrativa, a reforma curricular e principalmente as mentalidades, o que é mais difícil. Enquanto essa reforma não acontece é necessário buscar formas para trabalhar com o sujeito, embasado em uma teoria que consiga criar instrumentos para lidar com um sujeito em articulação com o campo social. É importante se dedicar a cada criança vista como um sujeito determinado pela sua estória particular, produzida pelo seu encontro com a palavra, procurando descobrir seu estilo de aprender ou não aprender.

Estilo é uma marca particular da criança aprender, observando que o professor também tem seu estilo de apropriação do conhecimento construindo e se construído em um estilo cognitivo próprio.

Kupfer explica, através da citação,  porque algumas crianças conseguem aprender, mesmo que suas notas não sejam tão altas, e outras têm sua capacidade de aprender totalmente tolhida:

Em lugar de fazer o pêndulo oscilar demasiadamente para o lado do social ou para o lado psicológico, admite-se que um problema de aprendizagem advirá quando houver um choque, um confronto, entre o que se veicula no campo social escolar e o estilo cognitivo de uma criança-sujeito em particular. Portanto, o problema de aprendizagem está localizado no ponto de articulação entre um sujeito e o discurso social que o determina e passa a conformá-lo, ponto esse em que a articulação tem natureza de conflito, de choque, de atrito e, portanto, de paralisia, e não de determinação recíproca. (p.131)

Dessa forma, psicanalista e professor(a) precisarão trabalhar conjuntamente para descobrirem a abordagem de estilo de cada aluno. No consultório o analista deverá trabalhar para “capturar o fantasma” que atormenta aquele sujeito. E o(a) professor(a), na sala de aula, deverá trabalhar de forma a reconduzir o aluno ao estilo próprio que o leva a aprendizagem.

O(a) professor(a) deve apresentar aos(às) alunos(as) os objetos construídos pela cultura, para que tendo contato com os mesmos se sintam motivados a produzirem outros e não permanecerem as mesmas idéias e os mesmos objetos.

Na instituição escolar é possível ler os discursos que ali circulam da mesma forma como se lê o discurso de um sujeito em análise, pois ela está sujeita às leis de funcionamento da linguagem. Quando não há a circulação discursiva a escola começa a se atrofiar e não consegue atingir seus objetivos. A falta de circulação discursiva é o início do fim de uma instituição.

Por outro lado, quando existe circulação de discursos às pessoas se responsabilizam pelo que fazem e participam ativamente do processo. Mudam os discursos e são mudados por eles de forma ativa e permanente.

Um profissional orientado pela Psicanálise deverá, na escola, onde a ausência de circulação de discursos estiver dificultando a realização dos objetivos educacionais, ter como meta principal abrir caminhos para a circulação de discursos. A palavra circulando é a meta principal, visto que a palavra dita pelo sujeito a alguém, pode ser ouvida por ele. Esse profissional deve se colocar em uma posição de escuta, pois será o alvo de transferência, é a ele que são dirigidos os discursos. Irá ouvir os(as) professores(as), funcionários(as), alunos(as) e os pais, e a relação que estabelece entre essas falas vai dando contornos ao espaço escolar, dessa forma a transferência que é o suporte e as falas interligadas organizam o campo, no qual circulará o profissional psicanaliticamente orientado.

Para explicar a violência na educação Kupfer (2001) começa mostrando que existe uma violência própria da educação, ou seja, o esforço de humanização de uma criança se faz pela ação exercida por um adulto sobre a criança, que é imposta e forçada, sendo, portanto denominada violenta ao submeter o corpo a uma ordem, uma regulação, a um ritmo, a uma interpretação que nada tem de natural, embora não sejam arbitrárias.

A autora cita Michel Silvestre (1983) para explicar as três teorias da sedução de Freud. A primeira teoria da sedução diz respeito à iniciação da criança ao mundo adulto e conseqüentemente a formação de sua sexuação. Essa ação é chamada de educativa visto que essa sexuação é moldada, conduzida pelo adulto de forma violenta, traumática, gerando o sujeito histérico, iniciando em uma sexualidade que precisa gerar sintomas.

Na segunda teoria da sedução sai de cena o adulto que corrompe menores e aparece a criança sedutora, que já se dirige ao adulto e demanda-lhe algo. Baseada nessa teoria, aparece à sexualidade infantil, que torna uma criança que já fantasia a sedução exercida por um adulto sobre ela. Perdendo dessa forma uma boa teoria que dava suporte a violência da educação, pois o adulto de algoz se transforma em vítima.

Já a terceira teoria da sedução é a que mais interessa a educação. Ela vê a sedução como um dispositivo pelo qual a criança encontra o Outro que representa algo a respeito de seu desejo sexual. Esse algo só pode ser compreendido se for deduzido da angústia, uma vez que a sexualidade é sempre traumática. Quando a mãe atribui sentido a ações reflexas de um bebê, que se manifestam no choro, e amamenta-o, ele passa a impor seu ritmo e chorará para obter o que deseja. Houve nessa relação um encontro com o Outro. Isso acontece pela imposição do simbólico e da linguagem sobre o corpo.

Tudo isso acontece não porque os pais são violentos, agressivos, gostem de bater nos filhos, mas sim pelo caráter violento que existe no estabelecimento da Lei, que é feito pela necessidade de impor uma restrição ao desejo materno. O estabelecimento da Lei é a violência da educação e é inevitável e estruturante. Outro nome que é dada a ela é “violência simbólica”.

A violência simbólica não acontece apenas uma vez, no início da constituição do sujeito, ela se apresenta ao sujeito em toda situação de aprendizagem, de confronto com o limite, com o não, com a morte.

Lacan, citado por Kupfer, explica que o professor comparece para o aluno apenas como um pequeno outro e não como um Outro barrado, sustentador de uma ordem, de uma posição, de uma referência.

Estão faltando no mundo contemporâneo, redes  de sustentação que possam remeter os sujeitos a uma tradição, a um passado e a significações capazes de orientar as ressignificações do futuro,  pois estamos vivendo em um mundo fragmentado. Dessa forma o professor entra para a sala de aula e não consegue representar uma ordem trans-histórica que o supera, para o aluno ele é visto como um “pequeno outro”, pequeno e insignificante e passa a sofrer dos alunos três posturas violentas: uma de natureza imaginária, uma de natureza real e uma de natureza simbólica.

A de natureza imaginária é quando os alunos enxergam o professor como “pequeno outro” e exercem diariamente pequenos ataques ao professor, como insultos, críticas a sua posição profissional e até mesmo a sua situação econômica e social. 

A violência real acontece quando os alunos deixam os insultos e começam a agir quebrando prédios, mobiliários escolares e até mesmo veículos de professores. A partir do momento que o aluno agride, quebra, destrói ele está buscando através da violência real a violência simbólica que lhe falta.

A violência simbólica acontece a partir do momento que o aluno escolhe colocar no lugar da autoridade falida da escola e da educação a lei do traficante de drogas. Tentativa fracassada, pois muitas vezes implica até a morte do adolescente ou jovem.

Sem saídas para tantas agressões o professor responde à altura. Perdeu sua autoridade e age de forma autoritária surgindo daí todos os problemas e dificuldades que são encontrados nas escolas brasileiras, que dificultam a produção do conhecimento, o crescimento do aluno e a falta de relações sociais proveitosas.

Analisando a concepção psicanalítica da violência na educação, três conseqüências são apresentadas:

O aluno depredador precisa ser ouvido em sua singularidade, ele não é apenas reflexo de injustiças sociais, é fruto de referências identificatórias construídas ou não na infância e que precisam estar fortalecidas.

A segunda conseqüência dessa visão é que apesar de não ser bem aceito o termo violência, pois o mesmo indica arbitrariedade, é necessário conservá-lo para que seja possível ver por detrás das violências imaginária e real a busca da violência simbólica.

E a terceira conseqüência mostra que os jovens estão buscando uma forma de restituição, de reencontro com uma ordem, embora não seja a maneira mais adequada.

A proposta de Kupfer (2001) é discutir a relação entre Psicanálise e Educação, principalmente as contribuições que a primeira pode oferecer a segunda. Ficando evidente que a Psicanálise pode ajudar imensamente o processo ensino-aprendizagem, não com receitas e fórmulas prontas, mas estabelecendo uma relação de diálogo, escuta, observação com os sujeitos do ato de aprender.

Muitas crianças fracassam na escola porque não são ouvidas e observadas devidamente. A escola atual não consegue atender de forma adequada os alunos provenientes das camadas mais pobres, que apresentam diferenças sociais e de linguagem.

Tanto a educação especial quanto o ensino  regular têm muito a ganhar e a melhorar se trabalharem à luz da Psicanálise.  É urgente que a e Educação e a Psicanálise encontrem o eixo comum que as une - o sujeito - e busquem trabalhar de forma conjunta, descobrindo caminhos para as inúmeras vicissitudes que perpassam os caminhos do processo ensino-aprendizagem, inclusive a (in)disciplina que é objeto de estudo do presente trabalho.

 

 

Como a psicanálise explica o desenvolvimento humano

 

De acordo com D’Andrea (1986) o ser humano possui o aparelho psíquico, conforme visto anteriormente, dividido estruturalmente e interagindo de forma dinâmica, necessitando para isso de um substrato energético, ou seja de energia mental. Uma pessoa apresenta diferentes graus de motivação quando realiza uma atividade, pode estar muito ou pouco motivada, pode sentir mais ou menos amor, ódio, alegria ou tristeza, esses sentimentos explicam a existência de diferentes cargas de energia.

A energia mental se origina no id e depende de específicas condições físico-químicas do organismo. A personalidade do indivíduo emprega essa energia para obtenção dos diversos fins, ou seja, determina todos os atos e comportamentos, imediatos ou não.

Freud (1948), citado por D’Andrea, dividiu o uso da energia psíquica em duas direções: uma construtiva e uma destrutiva.

A energia construtiva se dirige a um conjunto de impulsos que tem como função a autopreservação e a perpetuação das espécies. Foram nomeadas como impulsos de vida, sexuais ou Eros e a energia correspondente é denominada libido.

Por outro lado, a energia no sentido destrutivo está ligada a um conjunto de impulsos com a finalidade de reduzir o complexo molecular vivo a complexos inorgânicos mais simples e foram denominados de Tanatos ou impulsos de morte.

A energia mental, no sentido construtivo ou destrutivo, tem como fonte primária o id, contudo no desenvolvimento da personalidade ela estará disponível a qualquer uma de suas partes. Será usada para satisfazer os impulsos do id, alimentar as pressões do superego ou para fortalecer o ego na sua batalha adaptativa.

D’Andrea explica que Freud concebeu o desenvolvimento da personalidade a partir do conceito de libido. “Libido é um conceito biológico e significa a energia que está à disposição dos impulsos de vida ou sexuais.” (p.26).

Todas as pessoas crescem e se desenvolvem sustentadas pelos impulsos construtivos, os quais precisam de objetos do mundo externo para sua satisfação. O desenvolvimento pelo qual passa todo indivíduo é denominado de fases ou estágios e se diferenciam pelo tipo de objeto ao qual a energia do impulso está direcionada.

No início da vida, o objeto da libido se encontra na própria pessoa (bebê/ criança) e é denominada libido narcisista. A partir de momento que os impulsos buscam seus objetos no mundo externo, a libido vai deixando de ser narcisista e se transformando em libido objetal. Quanto maior a libido objetal mais madura e socializada é a pessoa.

O desenvolvimento da personalidade acontece em sete fases: oral, anal, fálica, latência, adolescência, maturidade e velhice. Cada fase representa para a pessoa resolução de certos problemas específicos, que são provenientes do próprio crescimento físico e da interação com o meio. A solução desses problemas resulta na passagem de uma fase para a outra e na formação da personalidade única de cada pessoa.

A fase oral corresponde ao primeiro ano de vida. Nesta fase o indivíduo enfrenta seu primeiro obstáculo: o nascimento, no qual o recém-nascido passa a viver a angústia própria do desligamento, que pode ser considerada a origem do fenômeno psicológico da angústia como aponta Freud (1997), no livro  “Contribuições à Psicologia do Amor”:            “O nascimento é tanto o primeiro de todos os perigos de sua vida, como o protótipo de todos os subseqüentes que nos levam a sentir ansiedade, e provavelmente foi à experiência do nascimento, que nos legou a expressão de afeto que chamamos de ansiedade.” (p.75).

A libido, na fase oral, esta localizada na porção superior do aparelho digestivo e sua energia está completamente direcionada aos impulsos de autopreservação, principalmente às necessidades de alimentar-se, contudo não está a serviço apenas das necessidades nutricionais, mas também da pura satisfação oral.

No início da fase oral a criança não distingue o mundo externo de si mesma. Sujeito e objeto mesclam-se e o seio materno é parte integrante da criança. Dessa forma, a libido é narcisista, ou seja, está voltada para o próprio indivíduo. Gradativamente o indivíduo vai convivendo com satisfações e privações e o ego vai se deferenciando da realidade externa.

Por volta dos seis meses a mãe, primeiro objeto de contato e que a criança percebe como parte de si mesma, começa a ser percebida como pessoa total, portadora de seus aspectos bons e maus. D’Andrea afirma que:

Quando a mãe oferece uma quantidade suficiente de afeto e calor, colocando medidas justas nas restrições às demandas da criança, esta ultrapassará com segurança o período oral, fortalecendo o ego e aumentando sua auto-estima. Estará, assim, preparada para enfrentar as novas dificuldades da fase seguinte do desenvolvimento. Entretanto quando isso não ocorre, pode haver fixações que impedirão um desenvolvimento normal nos outros estágios levando para a vida adulta, padrões orais de comportamento. (pp. 41,42)

O conflito básico, em termos psicossociais, a ser resolvido nesse período é o da confiança versus desconfiança. É necessário que a mãe estabeleça com equilíbrio as frustrações e gratificações às demandas do filho.

A fase anal vai do segundo ao terceiro ano de vida, nesta a energia libidinosa concentra-se na atividade anal e é reforçada pelas exigências dos pais quanto ao controle dos esfíncteres. A libido se concentra na porção posterior do aparelho digestivo. O prazer da criança é obtido pela estimulação da mucosa retal e das partes adjacentes. Aliada a satisfação natural pelas atividades anais está a valorização que os pais atribuem a essa função.

Na fase anal o conflito predominante é da autonomia versus vergonha. A predominância de uma ou outra vai depender da cultura na qual o indivíduo está inserido. Algumas culturas incentivam a autonomia e outras o sentimento de vergonha.

A fase fálica compreende o período que vai dos três aos cinco anos, a libido dirige-se para os órgãos genitais e tem início a masturbação infantil. Nesta fase a criança passa por uma experiência importantíssima em seu desenvolvimento psicológico: o complexo de Édipo. A resolução satisfatória do mesmo levará a criança a deixar seu narcisismo e procurar a satisfação de seus impulsos no mundo que a rodeia, interessa-se pelo ambiente e começa a questionar sobre o significado e as causas dos fatos.

O nome fálico é relativo ao pênis e provém do fato da libido concentrar-se nos órgãos genitais que passam a ser a zona erógena predominante. O menino manipula o pênis e a menina o clitóris, seu análogo. É como se ambos os sexos possuíssem apenas um órgão genital - o masculino.

Além do complexo de Édipo existe, nesta fase, também o complexo de Castração. No complexo de Édipo a criança apaixona pelo progenitor do sexo oposto e rivaliza com o do mesmo sexo. No complexo de castração a criança tem medo de perder o pênis, como vingança, castigo por ter se apaixonado pela mãe. Ambos serão mais aprofundados posteriormente.

Na fase fálica o conflito básico é da iniciativa versus culpa. A iniciativa está ligada a busca de objetos de satisfação dos impulsos, ou seja, a busca do sexo oposto como objeto sexual, posteriormente a renúncia por esse mesmo objeto e a busca do progenitor do mesmo sexo para ser modelo de identificação. A culpa se manifesta em conseqüência dos sentimentos de onipotência, rivalidade, competição e ciúmes que acompanham o desejo de conseguir a qualquer preço os fins desejados.

A latência compreende a fase que vai dos cinco aos dez anos, nela há uma aparente interrupção do desenvolvimento sexual e os impulsos eróticos exercem menor influência na conduta. Os interesses da criança passam a se voltar para as atividades intelectuais, as amizades, os jogos e outras atividades.

A criança canaliza a energia psíquica para o fortalecimento do ego, que ficará mais equipado para lidar com impulsos e com o mundo externo. O superego também se desenvolve muito nessa fase.

O conflito da latência é a produtividade versus inferioridade. A primeira representa as necessidades de aprender e realizar algo, utilizando-se de suas potencialidades e capacidades. A segunda provém quando a criança fracassa em suas tentativas de produtividade e não obtém adequado estímulo do meio.

Já a adolescência inicia por volta dos dez ou onze anos, nesta fase aumentam os conflitos entre as três partes do aparelho psíquico e é necessário um determinado tempo para que elas estejam aptas a funcionarem, novamente, como um conjunto harmonioso, uma vez que com o aumento da velocidade de crescimento e amadurecimento físico os impulsos emocionais a ela associados se acentuam, levando a personalidade a reorganizar-se em busca de um novo equilíbrio.

Na adolescência acontece o amadurecimento dos órgãos genitais e o aparecimento dos caracteres sexuais secundários. É a época de definição vocacional, formação da identidade, escolha do futuro esposo ou esposa.

Na adolescência o conflito universal é a necessidade de ser reconhecido como adulto e o desejo de permanecer criança, esse conflito o indivíduo carrega por toda vida, mas é na pré-puberdade que ele é mais acentuado.

A maturidade vai dos vinte aos cinqüenta anos e é a fase que o indivíduo percebe que não é mais um aprendiz da vida, que possui uma identidade formada, é capaz de se relacionar intimamente com alguém do sexo oposto e está definido profissionalmente.

O conflito básico da maturidade é intimidade versus isolamento. A intimidade se refere à capacidade pessoal de participar de relações íntimas: amizade, amor, relações sexuais e mesmo intimidade consigo mesmo. E o isolamento se dá quando o indivíduo não tem condições de manter relacionamentos.

A velhice inicia após os cinqüenta anos. Porém se levar em conta um conjunto de ocorrências que representam o declínio global das funções físicas, intelectuais e emocionais, ocorre após os setenta anos.

O conflito básico da velhice é integridade do ego versus  desprezo. As pessoas que superarem de forma adequada cada fase de desenvolvimento chegam à velhice conseguindo integridade necessária para as mudanças desse período. Por outro lado às pessoas, nas quais o desenvolvimento não se realizou de forma equilibrada, passam a ter dificuldade para enfrentar os problemas próprios da idade aliados à falta de apoio do meio e chegam ao desespero.

Os três primeiros estágios ou fases, em especial a fase fálica, é que são prioridades para este trabalho, haja vista que são eles que poderão fazer com que os limites colocados ou não pela família interfiram nos comportamentos da criança dentro da escola, como aponta D’Andrea:

           

Freud considera que os cinco primeiros anos de vida são decisivos na formação da personalidade. A maneira como a pessoa resolve os problemas desses três primeiros estágios e os mecanismos de defesa ou adaptação utilizados são os responsáveis pela estrutura básica  do seu caráter, base esta que é o ponto de partida para o desenvolvimento  futuro. (p.27).

Com base na citação que considera fundamental que os pais eduquem e coloquem limites até os cinco anos, para que posteriormente o trabalho educativo se torne mais fácil, será feita uma análise de como a Psicanálise interpreta a (in) disciplina na escola.

Como a psicanálise interpreta a (in) disciplina.

No capítulo III foram trabalhadas as seguintes causas que podem gerar a indisciplina na sala de aula, propostas por Tiba (1996):

Distúrbios de ordem pessoal: psiquiátricos, neurológicos, deficiência mental; distúrbios de personalidade, distúrbios neuróticos, etapas de desenvolvimento: confusão pubertária, onipotência juvenil; síndrome da quinta série; distúrbios “normóticos”, distúrbios leves de comportamento; uso de drogas.

Distúrbios relacionais: educativos, entre os próprios colegas; por influência de amigos; distorção de auto-estima. (p.139).

Já La Taille (1996) trabalha a falta de limites, explicando que os pais não os impõem, a escola não os ensina, a sociedade não exige e a televisão os sabota. E trabalha a indisciplina como decorrência do enfraquecimento do vínculo entre moralidade e sentimento de vergonha. Mostra também que a vergonha surge na criança por volta dos dezoito meses, nesta idade ela já se reconhece no espelho e toma consciência de si mesma como objeto do olhar de outrem. A vergonha é presença constante na vida humana. Ela não se relaciona apenas à moralidade, mas é impossível pensar a moralidade sem a vergonha.

O autor se reporta a Freud e explica que o sentimento de moral começa com o controle externo (medo que a criança tem de perder o amor dos pais) e quando tem uma seqüência bem sucedida passa a ser controle interno a obediência às regras, e a não depender mais do olhar de outras pessoas. Freud parte do pressuposto que a interiorização das interdições paternas constitui o superego, o qual compreende o ideal-de-ego, que servirá como uma medida empregada para avaliar o próprio valor como pessoa. Ao cometer uma transgressão moral sente-se a culpa e a vergonha. Culpa por ter transgredido uma lei e vergonha de ter fracassado na busca da realização concreta do ideal incorporado.

La Taille trabalha também que a sociedade deixou de ter vergonha de não possuir valores morais em relação à comunidade e ao espaço público e passou a ter vergonha de não possuir bens, dinheiro e fama.

Fontes (2007), apontou várias conseqüências na escola geradas pela falta de limites na família que variam da  apatia do grupo, cochicho, troca de mensagens e papeizinhos, intervalos prolongados, exibicionismo até agressões a colegas e professores, roubos etc..

Lembrando que no capítulo II foi trabalhado o papel primordial que a família exerce no desenvolvimento do indivíduo, em Zagury (2001) foi possível  perceber  as mudanças ocorridas na família e na sociedade nas últimas décadas do século XX, expondo que o autoritarismo, as punições físicas e os castigos foram substituídos por uma relação mais autêntica e democrática. Nesse processo de mudança a maioria dos pais perdeu o rumo e não está conseguindo estabelecer limites, o que gera toda a problemática vivida pela família, pela escola e pela sociedade. Pois o ser humano não aprende a respeitar, se não aprendeu quais são seus limites frente ao mundo no qual vive. A pessoa quando nasce não possui esses  limites são os pais que precisam saber estabelecê-los.

Gomide (2004), Chalita (2001), Parolin (2005) e Tiba (1006) reforçam as opiniões de Zagury de que a família é o lugar privilegiado para promover a educação infantil, estabelecer os limites, os deveres e os direitos.

Zagury deixa evidente que estabelecer limites não é uma questão de opção é necessidade para formação de indivíduos equilibrados, que respeitem os seus semelhantes e saibam viver em sociedade. Quando esses limites não são ensinados há uma progressão de problemas, vários deles até irreversíveis.

Existe uma relação direta entre a falta de limites e a forma distorcida da criança e do adolescente ver o mundo, que leva os mesmos a marginalização, ao álcool, às drogas, aos problemas disciplinares na escola e aos inúmeros problemas que estes causam à sociedade como um todo. Os pais que não estabelecem limites, não desenvolvem responsabilidades e superprotegem em todos os momentos levam o filho (a) a considerar que o mundo existe para seu prazer.

Após a retomada de alguns aspectos dos capítulos II e III, será feita uma busca de como a psicanálise interpreta os comportamentos inadequados gerados pela falta de limites, que a família deveria estabelecer desde os primeiros anos da infância.

De acordo com o exposto no item 4.3 todo ser humano, desde que nasce até o fim de sua vida, passa por fases ou períodos de desenvolvimento. Nas três primeiras fases – oral, anal e fálica – que corresponde dos 0 aos 5 anos, a libido (energia vital, fonte de impulsos sexuais) se concentra em determinada zona erógena do corpo da criança. A resolução satisfatória dos problemas próprios a cada uma é que possibilitará o desenvolvimento de um sujeito equilibrado. Nas demais fases, quando as três primeiras resolveram de forma equilibrada o conflito inerente a cada uma delas, a energia se concentrará em outros aspectos como por exemplo o intelectual, na latência. Quando estes não são resolvidos de forma adequada surgem os mais diversos problemas que são vivenciados pela família, pela escola e pela sociedade como um todo.

Segundo D’Andrea (1982), no período oral, primeiro ano de vida, as expectativas orais encontram a oposição dos limites que a mãe impõem e na fase anal, um aos três anos, quando acontece o treinamento dos esfíncteres, a rebeldia é controlada pelas barreiras impostas pelo meio, no qual a criança está inserida. Nas duas primeiras fases os conflitos se dão em função de se confrontarem com a realidade externa: mãe e meio social. Já na fase fálica, três aos cinco anos, o conflito sexual se manifesta sem uma causa exterior expressa nitidamente. Com o passar do tempo e a evolução do homem o conflito passou de um problema real externo para uma situação interior herdada dos antepassados.

O conflito sexual da fase fálica está relacionado ao complexo de Édipo. As descobertas desse fenômeno se deram pelo estudo que Freud fez das manifestações inconscientes de seus pacientes neuróticos, descobrindo freqüentes fantasias de incesto com o progenitor do sexo oposto e ciúmes, associados a instintos homicidas, ao progenitor do mesmo sexo. Essas idéias carregadas de afeto foram denominadas de complexo de Édipo porque Freud as associou a uma lenda grega “Édipo rei, a tragédia” (que consta no anexo D do presente trabalho), na qual Édipo, sem saber, mata o pai Laio, casa-se com a mãe Jocasta, tem quatro filhos com ela, vivem por muito tempo em completa felicidade. E ao descobrirem a verdade, Jocasta enforca-se e Édipo vasa os próprios olhos e é perseguido pela fúria dos deuses.

Posteriormente Freud descobriu que o complexo de Édipo não acontecia apenas com as pessoas doentes, mas era uma manifestação comum a todas as pessoas nesse período de desenvolvimento. Freud (1987) citado por Miranda (2001) esclarece numa carta enviada a seu amigo Fliess:

Verifiquei, também no meu caso, a paixão pela mãe e o ciúme do pai, e agora considero isso um evento universal no início da infância [...] Sendo assim, podemos entender a força avassaladora de Oedipus Rex [...] a lenda grega capta uma compulsão que toda pessoa reconhece dentro de si mesma. Cada pessoa da platéia foi, um dia , em germe ou em fantasia, exatamente um Édipo como esse, e cada qual recua horrorizado, diante da realização de sonho aqui transposta para a realidade, com toda a carga de recalcamento que separa seu estado infantil de seu estado atual. (p.193).

As idéias de Freud causavam muito espanto e muitas não eram aceitas, pois este anunciava a existência da sexualidade infantil, fato muito criticado na época e que nos dias atuais ainda não é aceito por muitas pessoas que consideram a criança como um ser inocente e assexuado. Comparar uma criança ao Édipo era considerado um grande absurdo.

Gay (1988), citado por Miranda, esclarece que a sexualidade existe desde a infância e se manifesta da seguinte forma: “Os primeiros contatos do bebê com o mundo são lições externas e muitas vezes penosas, de educação sexual; o seio da mãe, o calor de seus braços, sua voz tranqüilizante, suas ausências inexplicáveis e apavorantes, constituem uma preparação decisiva, e por vezes bastante árdua, para a carreira de amante na vida adulta.” (p.193).

Esta citação comprova que o estar com o outro não é um aspecto natural, mas determinado pela energia libidinosa, pelas pulsões. Se fosse natural quando o bebê estivesse com sua necessidade de alimentação satisfeita ele dormiria tranqüilo, sem necessitar da atenção da mãe e só voltaria a buscá-la quando sentisse fome.

Freud (1997), no livro “Cinco Lições de Psicanálise”, enfatiza de modo categórico o papel primordial que as impressões da tenra infância tem no desenvolvimento do homem e afirma que:

Na vida onírica a criança prolonga, por assim dizer, sua existência no homem, conservando todas as peculiaridades e aspirações, mesmo as que se tornam mais tarde inúteis. Com força irresistível apresentar-se-lhe-ão os processos de desenvolvimento, repressões, sublimações e formações reativas de onde saiu, da criança com tão diferentes disposições, o chamado homem normal - esteio e em parte vítima da civilização tão penosamente alcançada. (p.39).

O autor esclarece que a criança possui desde o nascimento instintos e atividades sexuais. Estes instintos que ela traz consigo é que origina, através de etapas muito importantes, a sexualidade considerada normal no adulto. A principal fonte de prazer sexual infantil é a excitação de determinadas partes do corpo particularmente excitáveis, como: órgãos genitais, orifícios da boca, ânus, uretra, pele e outras superfícies sensoriais. Esta primeira fase da vida sexual infantil é alcançada no próprio corpo e recebe o nome de zonas erógenas.

Na verdade o que acontece é que quando o bebê se alimenta do leite ele ganha também o contato prazeroso, a aconchego, os afagos, o calor, a voz e o cheiro da mãe. E são esses aspectos que Freud denominou de sexualidade infantil, a qual não possui uma determinação biológica, ela é experienciada no âmbito psíquico por cada um a sua maneira. Os conflitos referentes à sexualidade se apresentam de forma mais intensa na fase fálica, quando acontece o complexo de Édipo e o de Castração.

O complexo de Édipo, como mostra D’Andrea, provoca sentimentos ambivalentes, ou seja, ao mesmo tempo em que o menino ama a mãe e odeia o pai, desenvolvendo rivalidade e luta aberta (muito rara) ele sente que quer bem ao pai. Já para a menina esse complexo é vivido de forma mais difícil, uma vez que no início da fase fálica o menino e a menina são fortemente ligados à mãe e a elegem como objeto de amor. Ao eleger o pai como objeto amoroso e a mãe se transformar em rival, processo inverso ao do menino, a menina precisa passar pelo sofrimento de se desligar emocionalmente da mãe. Esses sentimentos contraditórios constituem o aspecto mais importante do complexo, visto que o objeto amoroso também é disciplinador e o odiado é provedor de segurança e proteção.

A resolução satisfatória dos conflitos dessa fase dependerá muito da compreensão dos pais, como nas fases anteriores. Nesta a criança irá monopolizar o objeto amado (pai ou mãe) e irá hostilizar os demais membros da família com os quais tiver que dividir a atenção do objeto de  amor, o que pode gerar muitos conflitos familiares, necessitando sempre do equilíbrio dos pais.

A partir do momento que o conflito se resolve de forma satisfatória a criança, para evitar a perda do amor, começa a se identificar com o progenitor do mesmo sexo, que passa a ser o objeto ideal a ser imitado, se tornando modelo e referência de comportamento. Desistindo do amor incestuoso passa a substituí-lo por outras “figuras permitidas”, onde encontra traços desejáveis do objeto que amara. O menino procura ser tão valoroso como o pai, e a menina procura ter todas as qualidades da mãe.

A resolução insatisfatória do complexo de Édipo poderá levar a criança a ter dificuldade nos relacionamentos amorosos que posteriormente irá estabelecer e colaborará na formação do núcleo inconsciente das neuroses.

Miranda (2001) explica que a anatomia da criança ao nascer não é decisiva para sua opção sexual, não é destino. Para se tornar homem ou mulher, vai depender da introgeção dos códigos que fazem parte da cultura. A resolução do complexo de Édipo, que é definido na relação com o outro, visto que desde o nascimento o homem depende de outro ser semelhante a ele e que possui os códigos da vivência humana (“não matar”, “não praticar o incesto”...), é que vai definir o “ser homem” ou “ser mulher”.  Quando existe a troca de objetos e os impulsos amorosos do menino se dirigem ao pai e da menina à mãe, pode ser um dos caminhos que leva ao homossexualismo.

Mesmo que a criança não tenha um dos pais o triângulo amoroso - pai/ mãe/ filho - acontece, pois a mesma cria esse progenitor em sua fantasia e elege uma pessoa dentro ou fora do lar para ser a referência.

Da mesma forma que o complexo de Édipo é um fenômeno que acontece em todo indivíduo o complexo de castração também é universal. Os sentimentos ambivalentes durante o Édipo são extremamente sofridos tanto para o menino quanto para a menina.

D’Andrea mostra que para o menino o pênis se tornou a parte mais importante do corpo na busca pelo prazer e o sentimento que nutre pela mãe, leva-o a ter medo da vingança ou de castigos aplicados  por seu pai. As idéias e emoções ligadas ao medo é que constituem o complexo de Castração. Toda criança carrega em si elementos precursores desse complexo que são: o nascimento - trauma original ao perder o útero e que constitui uma base traumática para todas as separações reais ou imaginárias que a pessoa passa, o desmame (fase oral) e a evacuação das fezes (fase anal). A perda do seio e das fezes prepara a criança emocionalmente para a perda do pênis. Esse complexo trabalha a perda dos órgãos genitais, mas simbolicamente se relaciona a qualquer tipo de perda ou separação. O medo de perder o amor de pessoas importantes significa um insulto ao ego e equivale a tirar-lhe uma parte.

Apesar de saber que a masturbação não causa nenhum mal, algumas instituições da sociedade a condena e as pessoas vão passando o medo da castração para as crianças, de geração em geração. O menino, inicialmente, burla as ameaças e continua se masturbando, mas ao perceber que as meninas não possuem o pênis passa a acreditar que elas o perderam e que se persistir em tal prática também ficará sem o seu.  Nesse sentido Souza(2006) aponta que: “O sentimento agressivo contra o pai ou a mãe, segundo a teoria freudiana, acaba por gerar um mecanismo de defesa: a criança passa a sentir que o pai ou a mãe a ameaça, e procura se defender. Dessa forma, cresce nela o temor pela figura paterna ou materna.”.(p.5).

De acordo com Souza as primeiras teorias sobre o complexo de
Édipo explicavam o complexo para o menino e atribua para a menina o mesmo processo apenas de forma inversa. Ela amaria o pai e se tornaria rival da mãe. Posteriormente houve uma alteração que explica de forma diferenciada o complexo de Édipo na menina.

Para a menina o complexo seria mais problemático pelos seguintes motivos, conforme mostra a psicanalista holandesa Halberstadt - Freud, citada por Souza (2006):

A menina descobre que ela não tem, como o menino, um pênis de que possa se orgulhar, e isso a faz ficar com ciúme dele. Durante a fase fálica ela também deseja cortejar sua mãe, seu primeiro objeto de amor desde a fase pré-edipiana. Porém a ausência do pênis põe fim a sua fantasia de substituir o pai, ela então passa a sentir rancor pela mãe, culpando-a por não ter-lhe dado o tão desejado órgão. A princípio ela pode fantasiar que tem um pênis em algum lugar, que o teve alguma vez, ou que o terá algum dia, mas finalmente tem que admitir o fato de que é uma menina e resignar-se a ele. Seu clitóris a faz sentir-se inferior, e ela acaba por deixar de usá-lo como fonte de satisfação masturbatória e de fantasia. (p.12).

Freud (1931), no artigo “Sexualidade Feminina”, citado por Souza, afirma que a menina precisa mudar de sexo e de objeto, ou seja, a mulher possui a vagina, que é o órgão feminino e o clitóris que é o análogo do membro masculino, ao passo que o menino possui apenas um órgão sexual - o pênis. Assim a sexualidade da mulher é dividida em duas fases: a primeira masculina (centrada no clitóris) e a segunda propriamente feminina (vagina); outro aspecto diferente é que no homem o objeto de amor é o mesmo do período pré-edipiano  - a mãe, a menina troca de objeto, busca o pai; a mudança de zona erógena acontece concomitante a mudança de sexo do objeto; e a terceira disparidade entre a menina e o menino é que enquanto o menino sai do complexo de Édipo pelo de Castração, a menina da sai da Castração para o Édipo. (conforme consta nos anexos E e  F deste trabalho).

Miranda (2001) esclarece que o complexo de Édipo significa muito mais que “apaixonar-se” pela mãe. A relação que se estabelece entre mãe/ filho, na qual a mãe ocupa o lugar de tradutora do filho, é que possibilita a sobrevivência emocional do sujeito. No início da vida o bebê não tem condições de nomear seu desejo, não dispõe da palavra, é a mãe que exerce esse papel, servindo de elo entre o filho e o mundo, colocando-o em interação com o simbólico.

Lacan (1999), no Seminário V, trabalha o mito do Édipo em três momentos. No primeiro momento a criança tenta satisfazer o desejo da mãe, ser “tudo” para ela. Neste momento a função paterna aparece apenas de maneira velada, como símbolo que pode existir em algum lugar, como mostra o autor: “No primeiro tempo e na primeira etapa, portanto, trata-se disto: o sujeito se identifica especularmente com aquilo que é objeto do desejo de sua mãe.” (p.198).

A mãe é o objeto de todas as pulsões da criança. A criança tenta ser o falo da mãe, ou seja, aquilo que a mãe deseja.

Já no segundo momento o pai aparece, no plano imaginário, como privador da mãe, ou seja, como aquele que desvincula o sujeito de sua identificação, e liga-o ao mesmo tempo ao primeiro aparecimento da “Lei”.

A partir do momento que a mãe busca confirmação na palavra do pai, se mostra incompleta, o pai passa a ser percebido como onipotente. É a própria mãe que instaura o pai como aquele que faz a “Lei”.

A criança percebe que o pai tem o falo e o pai priva a criança do objeto de satisfação: a mãe. Por medo da Castração o menino se identifica com o pai. A criança percebe que existe a diferença homem/ mulher pela linguagem.

Finalmente no terceiro momento o pai deixa de ser percebido como onipotente, no sentido de ser tudo e passa a ser visto como potente, uma vez que é ele que pode dar aquilo de que a mãe precisa, conforme mostra Lacan (1999): “Em terceiro lugar, o pai se revela como aquele que tem. É à saída do complexo de Édipo. Essa saída é favorável na medida em que a identificação com o pai é feita nesse terceiro tempo, no qual ele intervém como aquele que tem o falo.” (p.200).

Dessa forma a mãe coloca o pai na posição de quem sanciona, aquele que exerce a função de representante da “Lei”. E é essa lei que libera o sujeito do assujeitamento ao desejo materno e possibilita, por meio de identificação, que se  situe como feminino ou masculino. O menino por medo da castração, se idêntica com o pai. Existe também o instante que a menina se sente castrada e passa a se identificar com a mãe para conquistar o pai.

Ferreira (2006) em sua dissertação de mestrado “Função Paterna e Adolescência na Escola: Um Estudo Correlativo em Uma Instituição Particular” aponta algumas mudanças que ocorreram na família, impostas pelo capitalismo e pela evolução da ciência, que influenciam diretamente a educação dos filhos, a colocação de regras e limites para os mesmos, que são: “A família nuclear ao longo dos anos foi se transformando”. (p.24). Está aumentando cada vez mais o número de separações e divórcios e conseqüentemente surgindo novos modelos de família, mães ou pais que cuidam sozinhos dos filhos; novas famílias em que marido e mulher já possuem filhos de uniões anteriores. “O pai já não é mais o provedor exclusivo”. (p.24) Este se divide entre o trabalho e o lar, mudança que se efetivou a partir do século XIX, o pai perdeu o poder absoluto, o domínio sobre a família. A mulher, que antes se limitava a cuidar dos filhos, da casa e do esposo conquista seu espaço no mercado de trabalho, tendo que ausentar e deixar os filhos aos cuidados de outra pessoa. Todas essas mudanças alteraram significativamente a educação que as famílias dão aos filhos, em relação a estabelecer limites e regras que possibilitem aos mesmos respeitarem as pessoas de sua convivência, seja na família, na escola ou na sociedade. 

Alberti (1988), citado por Ferreira (2006), afirma que: “Os filhos que tiveram contato maior com o pai ou com alguma figura forte, como um avô, em geral, não enveredam para a marginalidade. Esse convívio, ainda que por um prazo curto, é fundamental para que os jovens desenvolvam algumas noções de limites e regras...” (p.24)

Ferreira aponta que as mudanças profundas pelas quais a família passou, em relação à falta de limites para os filhos e de exemplos dos pais, tem levado muitos adolescentes a buscarem referência em colegas da mesma idade, nos vícios, nas armas, no dinheiro fácil. Dessa forma é possível associar esses problemas mencionados pelo autor, aos problemas vividos pelas crianças e adolescentes na escola: desinteresse, indisciplina, falta de respeito aos colegas e profissionais da escola. Esses problemas se originam em casa, afloram na escola e se estendem à sociedade conforme mostra Jacques Akerman (1999) citado por Ferreira: “Constata-se nos dias atuais, o enfraquecimento da figura paterna, seja enquanto genitor, o pai da realidade, seja enquanto função simbólica da paternidade, que sustenta esse próprio genitor”. (p.25)

A falta de limites originada pela ausência ou pela falta de responsabilidade do pai é apontada, por Ferreira, como responsável pelo que tem acontecido nas instituições de saúde, para onde são encaminhadas crianças e adolescentes problemáticos e também nas escolas, onde se espera que os profissionais dessas instituições assumam o papel que é do pai, no sentido de colocar limites, regras, enfim de educar.

Neste trabalho “Ausência de limites na família e suas conseqüências na escola, analisadas psicanaliticamente”, foi possível perceber através de autores ligados à Educação e de autores ligados à Psicanálise a função primordial que a família exerce na constituição do sujeito, como aponta Ferreira:

A função do pai para Freud é a interdição. Assim, o pai é uma função, não importa por quem é exercida. Primeiro a Lei, depois o desejo. A função paterna é a garantia de algo da ordem da clivagem, da falta, da ordem da abertura do acesso a erogeneidade, do acesso ao inconsciente ou do gozo ou reciprocamente da interdição.  (p. 26).

É a castração que possibilita que o gozo seja recusado e que permite a constituição do sujeito do desejo.

O professor na sala de aula enfrentará inúmeras dificuldades ao lidar com crianças e adolescentes que não tiveram um representante da “Lei”, que não foram interditados e castrados. Irá enfrentar inúmeras contradições, poderá se sentir impotente, mas precisará discernir o que é responsabilidade sua e o que não é. Precisará “escutar”, usar o diálogo como interlocução, manter a postura firme que corresponda ao lugar de professor, construir e dividir responsabilidades, estabelecer limites como “Lei”, enfatizar o desejo de saber e a pergunta.

Entre as inúmeras indagações que finalizam esse trabalho, duas são cruciais:

- Como chamar de volta os pais às suas responsabilidades?

- Como fazê-los perceber a importância dos limites na formação dos filhos?

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Autor: Helena Maria De Aguiar


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