Concubinato Adulterino e o Princípio da Monogamia



Aline Barradas

"...o concubinato adulterino, por representar a negação ao princípio da monogamia, consiste em modelo de envolvimento afetivo não abarcado pelo Direito de Família, lhe sendo atribuído, em regra, apenas efeitos negativos. Vale dizer, a princípio, consta no ordenamento jurídico apenas normas desestimuladoras da prática do concubinato adulterino."

Tiago Quadros

A família brasileira passou por várias evoluções em sua estrutura. Uma família considerada "normal" para a sociedade antiga era composta necessariamente pelo pai, pela mãe e pelos seus filhos. Qualquer composição diferente desta não era considerada uma família.

A constituição federal e o código civil trouxeram uma nova visão de família, trazendo a consagração da família eudemonista. A família passou a ser formada no intuito de estruturar-se com o objetivo de trazer o bem-estar, a realização do indivíduo e não mais o sacrifício por uma estrutura conservadora ditada pela sociedade.

A família passa a ser composta por variadas formas de relações de afeto. Sempre no intuito de promover a dignidade do ser humano. Assim, muitas formas de constituição de família passaram a ser aceitas pela sociedade. Dentre elas, o chamado "Concubinato adulterino".

O concubinato adulterino é aquele em que o companheiro ou companheira desconhece que o seu par tem uma outra relação amorosa. Assim, esse tipo de relação é considerado uma união estável putativa.

A família passou a ser regida por novos princípios e valores que devem ser sempre observados, tais como o princípio da solidariedade, da dignidade humana, da boa-fé. Sendo assim, àquele indivíduo que tem a sua confiança traída, que é enganado na relação, vivendo uma realidade que acredita ser a verdadeira, o que na verdade não é, o ordenamento jurídico lhe concede todos os direitos como se casado fosse, mesmo que seu parceiro tenha uma relação mais longa com uma outra pessoa.

O novo conceito de família traz com seus valores a proteção a várias situações, antes não tuteladas, como o concubinato adulterino, baseada sempre em seus princípios e valores, reconhecidos constitucionalmente.

O direito brasileiro classifica o concubinato como adulterino ou de boa-fé e o concubinato impuro ou de má-fé, que, como o próprio nome já diz, é aquele em que o companheiro ou companheira tem a ciência de que seu parceiro vive em uma outra relação paralela.

A diferença entre os dois institutos reside no fato de que os seus efeitos jurídicos ocorrem de forma distinta.

Uma boa parte da doutrina e da jurisprudência não reconhece sequer os efeitos jurídicos para o concubinato impuro, utilizando como fundamentação o Princípio da Monogamia, que rege o nosso sistema.

Admitir o reconhecimento de efeitos jurídicos para o concubinato impuro seria, para o direito brasileiro, o mesmo que o Estado estar reconhecendo relacionamentos sexuais sem a "oficialidade do casamento".

A monogamia define-se como sendo o sistema de constituição familiar pelo qual o homem possui uma só esposa ou companheira e a mulher apenas um único marido ou companheiro.

Assim, o princípio da monogamia persiste em ser uma premissa indiscutível, sendo que toda a estrutura do Direito de Família, ao ser construída, tomou-o como referência.

A título de ilustração, citam-se, respectivamente, Washington de Barros Monteiro e Rodrigo da Cunha Pereira, que defendem o mesmo entendimento, senão vejamos:

"Em todos os países em que domina a civilização cristã, a família tem base estritamente monogâmica, que, no dizer de Clóvis, é o modo de união conjugal mais puro, mais conforme os fins culturais da sociedade e mais apropriado à conservação individual, tanto para os cônjuges como para a prole. A monogamia constitui a forma natural de aproximação sexual da raça humana. (MONTEIRO, 2001, v.2, p.54)"

Rodrigo da Cunha Pereira, por sua vez, defende:

"Começa-se, então, a fazer distinções através das expressões "concubinato puro" e "concubinato impuro". Essas expressões veiculam estigmas morais com as quais não se pode concordar. Porém, é necessário fazer uma distinção entre concubinato adulterino e não adulterino. Tal distinção não tem a função de discriminar ou de "moralizar". A importância desta distinção está em manter a coerência em nosso ordenamento jurídico com o princípio da monogamia. Se assim não o fizéssemos, estaríamos destruindo um princípio jurídico ordenador da sociedade. Todo o Direito de Família está organizado em torno desse princípio, que funciona, também, como o um ponto-chave das conexões morais. (DIAS e PEREIRA, 2002, p. 231)".

Diante de todo o exposto, constata-se que apesar da grande evolução que a estrutura da família brasileira sofreu, o princípio da monogamia continua sendo aplicado, como se fosse adequado à nova concepção de família. Entretanto, a monogamia, ao contrário do que alguns possam pensar, não consiste apenas em uma simplória regra referente à moral.

Na verdade assume absolutamente o papel de dogma imposto pelo próprio ordenamento jurídico, o que não é resultado de escolha por parte dos cidadãos. Entendo que o princípio da monogamia é, em verdade, resquício de um modelo de estrutura familiar arcaico.

Bibliografia

GOMES, Orlando. Direito de família. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

DIAS, Maria Berenice; PEREIRA (Coord.); Rodrigo da Cunha (Coord.). Direito de família e o novo Código Civil. 2.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 36. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v.. 5.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. 3 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1995.


Autor: aline barradas


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