A GUERRA DO CONTESTADO: CEM ANOS DE MASSACRE E PROGRESSO.



GUERRA DO CONTESTADO:

CEM ANOS DE MASSACRE E PROGRESSO.

Acadêmico: Rivanildo da Silva Lino.

Professor-tutor: Emiron Santos da Silva.

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI.

Licenciatura em História (HID 0203\3) História do Brasil Republicano.

30\10\2012.

 RESUMO.

O tema pesquisado procura mostrar que, a Guerra do Contestado foi um movimento revolucionário de maior repercussão na História de Santa Catarina, onde envolveu a população sertaneja de um lado e enfrentando de outro lado as forças militares tanto as nacionais como as estaduais. O movimento que ocorreu em terras administradas pelo município de Santa Catarina e leste do rio Peixe, e rotulado pelos estudiosos como “insurreição xucra” ou “guerra civil”, para os religiosos, ocorreu uma “revolução de fanáticos”, para os sociólogos, ocorreu um “conflito social”; para os antropólogos, foi um “movimento messiânico”, para os políticos, um desejo de destituir as oligarquias, para os administradores públicos podemos dizer, que ocorreu uma “questão de limites”, para os militares, tratou-se de uma “campanha militar” e por fim para os socialistas, aconteceu uma “luta por terras”. Por fim, dentro da visão dos historiadores regionais, podemos mencionar que o objetivo do Contestado, perpassa por todas as definições simultaneamente. Por isso, se faz necessário enfatizar que a história do Contestado foi um movimento que merece destaque na História do Brasil.

 Palavras-chave: Contestado; Movimento; História.

 I INTRDUÇÃO.

 A Guerra do Contestado foi um dos maiores conflitos armados da história republicana brasileira .Ocorrida entre 1912 e 1916 numa área de fronteira disputada pelos estados de Santa Catarina e Paraná. Além disso  podemos dizer que o Contestado foi um movimento social com forte presença religiosa, durante toda a sua existência e aderiram às vilas, santas pessoas de origens bastantes variadas: posseiros expulsos de suas terras, ervateiros impossibilitados de continuar o seu trabalho, trabalhadores desempregados pela estrada de ferro, antigas lideranças federalistas e importantes opositores políticos dos coronéis da região, em especial de Curitibanos e de Canoinhas.

  Assim, essa região foi marcada por essas disputas também devido a presença de uma rica floresta e uma grande região dedicada à plantação de erva-mate. E uma das imediatas manifestações desse problema se dava na pressão exercida pelos grandes proprietários de terra que forçavam agregados e posseiros a se estabelecerem em outras terras.

             Além disso, a construção de uma estrada de ferro interligando os estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, aumentou o problema social ali instalado. Por meio da liderança estadunidense Percival Farquhar, a Brazil Railway Company adquiriu uma grande área para a construção dessa estrada, onde diversas famílias já estavam instaladas. Após o processo de desocupação das terras, a companhia conseguiu a mão-de-obra  de mais de oito mil operários que participaram da gigantesca obra.

             Após a construção da estrada, a Brazil Railway adquiriu uma outra área com mais de 180 mil hectares onde realizaria a exploração da madeira. Por meio da utilização de um moderno maquinário para a execução desse novo empreendimento, a empresa estrangeira precisou de um contingente mínimo de mão-de-obra, o que terminou provocando a expulsão de outra leva de pequenos agricultores que também estavam fixados na região.

             Com a formação de um grupo de operários desempregados e camponeses desapropriados, a região do Contestado começou a presenciar um movimento messiânico. Onde diversos profetas, beatos e “monges” apareceram pregando ideais de justiça, paz e comunhão que seriam estabelecidos em um movimento de inspiração religiosa. O primeiro desses líderes foi o beato José Maria, que atacava o autoritarismo da ordem republicana e pregava novos tempos de prosperidade e comunhão espiritual. Dessa forma, esse conflito ganhou feição messiânica, sendo conhecido também como Guerra Santa, onde seu líder, José Maria era estimado pelos seus seguidores, pessoas socialmente desprovidas de tudo, como uma alma boa surgira para restabelecer a saúde dos adoentados e desprovidos.

             Entretanto, o governo federal não percebia com bons olhos o trabalho de José Maria, que passou a representar um risco para a ordem e segurança da região. Ele e seus seguidores foram severamente reprimidos pelas multinacionais e pela guarda armada do governo federal. Eles pretendiam dar fim aos povoados sertanejos e obrigá-los a sair por bem ou por mal dos territórios dos quais haviam tomado posse. Em novembro de 1912 ocorreu a batalha de Irani, o qual marcou este conflito e desencadeou a morte do monge José Maria, os sertanejos, inconformados com a morte de seu líder, partiram para o extremo, dando assim início a guerra civil. Novas sedes foram construídas por seus sectários, que não pretendiam se render, mais sim continuar lutando, desrespeitando o governo federal que, com o desejo de terminar definitivamente com esta guerra, resolveu usar todo o seu poderio militar e abater as últimas fortificações resistentes, utilizando para esse objetivo um grande número de soldados equipados com fuzis, canhões, metralhadoras e aviões, nunca antes usado em uma ação bélica desta magnitude. Assim sendo, a Guerra do Contestado acabou com a rendição dos revoltosos e muitas mortes, pois os mesmos resistiram bravamente antes de se dar por vencidos.

              Dessa forma, podemos dizer que essa guerra, teve vários aspectos em comum com a Revolta de Canudos, ocorrido na Bahia. Pois, ambas ocorreram nos primeiros anos após a Proclamação da República (1889), e nos dois casos, o foco foi uma grave crise econômica e social que assolava o país: inflação, desemprego incrementado pela libertação dos escravos (1888) e avanço das oligarquias sobre os pequenos proprietários de terras. Não por acaso, a origem dos conflitos acabou sendo mais ou menos a mesma também: disputas fundiárias. Tanto em um como em outro  episódio, o comando dos rebeldes coube a um líder religioso (Antônio Conselheiro e José Maria de Santo Agostinho, respectivamente). Que acusados de fanatismo e de pregar a volta da monarquia, os dois movimentos foram trucidados pelas tropas oficiais republicanas. Ao lado da Revolução Federalista, as guerras de Canudos e do Contestado entraram para a história como as maiores chacinas praticadas durante a Primeira República.

 II   MESSIANISMO E MISTICISMO (Católicos X  católicos).

             A maioria da população da Região do Contestado era formada por uma população cabocla, pobre e inculta, de índios, negros e luso-brasileiros que, ao longo dos anos, havia se internado nos sertões e nos campos e vivia do cultivo de roças, criação de porcos selvagens, extração da erva-mate, tropeirismo de carga e trabalhava nas fazendas de criação de gado como peões ou agregados.

            A forte ascendência portuguesa dos caboclos abrigava a crença importada do sebastianismo lusitano. Assim, a população revelava expressões de messianismo e de muito misticismo. Diante da ausência praticamente da Igreja Católica, os sertanejos buscaram conforto espiritual nos monges, profetas, curandeiros, pregadores e eremitas, que peregrinavam pela região, dentre eles destacando-se dois, de nomes João Maria de Agostinho e João Maria de Jesus.

            Assim, envoltos nesse misticismo popular, os seguidores de “monges” rejeitavam iniciativas tradicionais de catequese, como a dos franciscanos. Ou seja, os sertões reinventaram o catolicismo, onde no lugar dos sacramentos formais e da obrigatoriedade de frequência à missa, os homens do Contestado misturavam a rotina de festas e devoções aos santos com o consumo de bebidas alcoólicas, mágicas de videntes e pregações de monges.

            Essa “cultura rústica” resulta da mistura de elementos da colonização portuguesa com influência indígenas e africanas, consolidada pelo considerável isolamento cultural dos sertanejos. Vivia-se um vazio religioso oficial no interior do país desde que os jesuítas foram expulsos do Brasil, em 1759. A partir de então movimentos de caráter místico, com normas e simbologias próprias, passaram a conquistar cada vez mais adeptos. Estima-se que mais de 50 monges perambulavam pelo sertão na época do Contestado. Além deles, faziam parte do cotidiano os serviços das videntes, virgens e benzedeiras.

            Diante desse cenário de forte mobilização mística, era dura a missão dos religiosos tradicionais. Os franciscanos instalaram-se na região a partir de 1892. Originários do Império Austro-Húngaro, não dominavam a língua dos nativos e sofriam com as grandes distâncias percorridas em caminhos precários. O maior obstáculo, porém, foi mesmo a prosperidade do catolicismo “rústico”.

            Os frades franciscanos iniciaram uma pastoral exortando com cartas e pregações a necessidade do arrependimento dos crentes. As palavras surtiram efeito inverso ao desejado: ao impingirem críticas e responsabilidades ao venerado monge João Maria, foram totalmente rejeitadas pelos sertanejos. As orações franciscanas também não faziam sentido quando comparadas aos ensinamentos dos monges, com sua linguagem simplificada e temas cotidianos.

            Os sertanejos resitiam ainda à obrigatoriedade da participação na missa e da confissão individual. “Missa”, para eles, era a simples reza do terço, realizada pelo monge. Aceitavam o sacramento do batismo, mas este podia ser feito em casa, nas nascentes de água ou por ocasião da eventual presença do monge. A fim de se aproximarem dos sertanejos, os franciscanos chegaram a aprender receitas homeopáticas, aviando medicamentos caseiros. De nada adiantou. A desconfiança velada dos moradores locais em relação aos franciscanos tinha outro forte motivo: o estreito vínculo que esses frades mantinham com os poderes políticos e econômicos da região.

 III O PAPEL DA MULHER NA GUERRA DO CONTESTADO.

             Virgens, videntes e guerreira. No campo da batalha ou curando doentes, as mulheres do Contestado tinham o curioso dom de se comunicar com o além.

            Mesmo vivendo sob acentuado domínio patriarcal, muitas mulheres desempenharam papéis importantes no movimento do Contestado. A começar pelas “virgens”. O monge José Maria se fazia acompanhar de um séquito delas para auxiliá-lo nas rezas, nas pregações e no preparo de chás homeopáticos. As “virgens” eram escolhidas por ele e pelas lideranças dos Redutos ou Cidades Santas, entre aquelas que manifestavam piedade e pureza de alma. Não precisavam ser virgem no sentido biológico, pois havia entre elas mulheres casadas. Porém, as que mais se destacaram eram adolescentes. A proximidade com o monge lhes dava respeitabilidade e poder junto à comunidade. Na ausência do líder religioso, assumiam o papel de videntes.

            Outras mulheres tornaram-se líderes no interior dos Redutos e até mesmo no campo de batalha. Querubina de França, amiga e seguidora de José Maria, era uma das autoridades na Irmandade de Taquaruçu. Com a morte do monge, coube-lhe a tarefa de escolher as videntes que conversariam com o falecido e trariam suas predições para os devotos. A primeira vidente escolhida por  Querubina  foi sua neta Teodora, menina de apenas 11 anos de idade. “Teodora dizia tornar-se uma Santa Virgem, contando que falava com José Maria lá no mato e que recebia ordens para ir para Taquaruçu, e também para curar gente; um dia chegou uma mulher que estava muito doente; a virgem trouxe uma xícara cheia de sangue e deu para a mulher tomar, dizendo que Seu José Maria é que tinha mandado”, contou Alfredo Lemos, comerciante que visitava as irmandades. Entrevistada em 1961, já idosa, Teodora negou os poderes videntes: “Eu não via nada. Eram os velhos que se juntavam e diziam as ordens”.

            No campo das mulheres guerreiras, destaca-se a história de Maria Rosa. Muito jovem, ela participou de diversos confrontos armados entre os sertanejos e as forças federais, estaduais e de vaqueanos. “Maria Rosa era uma adolescente de seus 15 anos, loura, cabelo crespo, pálida, alegre, de extraordinária vivacidade. Não sabia ler nem escrever, mas falava com desembaraço. Era ela quem nas procissões marchava à frente carregando uma bandeira com a cruz verde. Às vezes permanecia encarcerada num pequeno quarto, só saindo para transmitir as ordens que dizia receber de José Maria durante períodos exóticos de vidência. O povo dos redutos considerava Maria Rosa uma santa e julgava que ela “tudo sabia”, descreve o sociólogo Maurício Vinhas de Queiróz. Maria Rosa exercia a plenitude do comando no Reduto de Caraguatá; rezava, definia as chefias, julgava, condenava os líderes religiosos e militares. Comandou os principais combates montada em seu cavalo branco, estandarte na mão esquerda e arma na mão direita. Morreu em 1914, lutando contra as tropas do general Setembrino de Carvalho, às margens do Rio Caçador.

 IV A BENDITA GUERRA.

             No cenário internacional, vivia-se a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). As questões militares em evidência, e o ambiente era favorável a propostas de modernização das Forças Armadas. Mas a própria composição das tropas no Contestado era um exemplo de como estávamos distantes das novidades técnicas e estratégicas em vigor na Europa. Ao lado de oficiais experientes, alguns treinados na Alemanha, havia jovens totalmente despreparados, participando pela primeira vez de uma operação de confronto direto. Entre praças, a situação era especialmente dramática. Uma parcela considerável foi recrutada de última hora. Não conhecia as condições físicas e climáticas da região conflituosa, tampouco o tipo de inimigo que combateria.

            O primeiro general designado para comandar a repressão foi Carlos Frederico Mesquita, veterano da Guerra de Canudos (1896-1897). Mas depois de apenas dois meses deu por encerrada a expedição federal no Contestado, alegando que o que ali se verificava era uma disputa política, sintoma da crise de poder entre os coronéis. Responsabilizou os governadores do Paraná e de Santa Catarina pela situação em se encontrava a região.

            Terminada a primeira missão, o governo manteve pequena unidade militar no Contestado, comandada pelo capitão Matos Costa (1914), outro que havia atuado em Canudos. Ele também reconheceu a crise política ali estabelecida, em especial a usurpação das terras dos sertanejos por parte dos coronéis. Tentou encontrar uma solução pacífica para o conflito, negociando com os líderes rebeldes e buscando apoio entre políticos do Rio de Janeiro. Matos da Costa denunciava os desmandos e as ilegalidades cometidos pelos coronéis da Guarda Nacional, sobretudo a grilagem de terras e as violências praticadas contra os sertanejos. Sua morte numa emboscada, em agosto de 1914, foi o estopim para que o governo federal organizasse, em concordância com os dois governadores, uma grande expedição militar, cerca de 6.000 soldados e 2.000 jagunços a serviço dos coronéis locais, para reprimir de vez a rebeldia dos sertanejos do Contestado.Ceará naquele mesmo ano, após a derrubada da oligarquia local e os conflitos com as tropas leias ao padre Cícero.

            Ao chegar ao Contestado, em setembro de 1914, Setembrino encontrou as tropas em completa desordem: os soldos estavam atrasados, o fardamento em frangalhos, os soldados descontentes com o descaso do governo. Os jornais recebiam cartas anônimas de soldados relatando suas dificuldades. O jornal  O Estado, de Florianópolis, publicou em 1º de setembro de 1915 o texto de um soldado não identificado: “Muitos dos nossos companheiros quase andrajosos já não parecem soldados da pátria, e sim mendigos de estrada. Sr. Redator, a Pátria encontrará em nós soldados dispostos a defendê-la e manter suas leis, mais é preciso que não nos desprezem”.

            Por ocasião do combate de Taquaruçu, ocorrido em fevereiro de 1914, o médico Antonio Alves de Cerqueira redigiu um relatório emocionante, publicado na imprensa, publicado na imprensa catarinense e reproduzido nos volumes de História escrito pelos oficiais militares, sobre o impacto negativo da guerra tanto entre os militares quanto entre os sertanejos: “Fazia pavor e pena o espetáculo que então se desenhava aos olhos do espectador. Pavor motivado pelos destroços humanos; pena das mulheres e das crianças que jaziam inertes por todos os cantos dos redutos”. Ele descreve com minúcias as péssimas condições do serviço de saúde do Exército, bem como o horror das vítimas espalhadas entre a lama e cinzas.

            A situação maculava a imagem da corporação e ressuscitava o espectro de Canudos. A imprensa nacional afirmava que o governo brasileiro, ao descuidar dos soldados em atividade no Contestado, repetia os mesmos erros cometidos no sertão baiano. A tragédia da guerra nordestina ainda assombrava o presente.

            Em dois meses, Setembrino de Carvalho regularizou a situação das tropas e deu início à sua estratégia repressiva. Ao constatar que os regulamentos militares para tempo de guerra estavam todos defasados, ordenou ao seu Estado-Maior traduzir regulamentos franceses e alemães para que fossem adotados no campo de batalha. Equipamentos bélicos de última geração foram enviados para a região, e um serviço de telefonia e telégrafo foi habilitado para facilitar a comunicação entre os oficiais. A fotografia foi adotada como um instrumento de propaganda contra as criticas da imprensa nacional. Imagens de um Exército glorioso, bem equipado e disciplinado eram publicadas em revistas de prestígio, como Fon-Fon e Careta, e em jornais como A Noite, no Rio de Janeiro.

            Em abril de 1915, o governo ordenou o fim da operação comandada por Setembrino. Passado sete meses de combate, o Exército já havia destruído muitas vilas rebeldes e prendido ou matado os principais líderes do movimento. Em maio, concluiu-se a retirada das tropas federais. Permaneceu na região um pequeno contingente do Exército que, em parceria com os coronéis locais e seus jagunços, se encarregou de selar o fim da rebeldia sertaneja. Foi uma das fases mais sangrenta da repressão.

            A bem sucedida campanha renderia a Setembrino de Carvalho a previsível ascensão ao topo da carreira militar e política: chegou a chefe do Estado Maior do Exército em 1922, tornou-se marechal em 1924 e foi ministro da Guerra entre 1922 e 1926.

            A experiência militar na divisa do Paraná com Santa Catarina foi fundamental para a cristalização da memória histórica do Contestado. Os oficiais foram os primeiros a investigar as raízes da rebeldia sertaneja. Dermeval Peixoto, Herculano Teixeira d’Assumpção, José Vieira da Rosa, Antonio Alves de Cerqueira, José Octaviano Pinto Soares e Ezequiel Antunes tinham vínculos estreitos com entidades científicas da época, como os Institutos de História e Geografia espalhados pelo país. Coube a esses “historiadores de farda” fixar a imagem de que os rebeldes eram fanáticos e ignorantes, fantoches de políticos espertos e gananciosos, vítimas dos governantes e do descaso da Igreja. Embora alguns tenham acusado os políticos locais de contribuir para que os sertanejos se rebelassem contra a ordem estabelecida, faltava a esses oficiais a capacidade de enxergar racionalidade por trás da rebeldia. Não compreendiam a lógica da organização sertaneja nem reconheciam suas reivindicações firmadas na crença compartilhada nos monges e santos. Ainda hoje permanece o uso de seu vocabulário depreciativo para se referir aos sertanejos: fanáticos, facínoras, bárbaros, ignorantes.

            Não há dúvida de que o Contestado foi bem aproveitado pelo Exército. Além de fixar a memória histórica do evento e de contribuir para a modernização da corporação, ele influenciou a implementação da lei do serviço militar obrigatório no Brasil. Não à toa, no mesmo ano em que se deu por encerrada a Guerra do Contestado (1916), convocou-se o primeiro alistamento obrigatório, cujo recrutas foram selecionados por sorteio.

            No entanto, vale voltar àquela frase autoindulgente do tenente Paula Cidade, desta vez dirigindo-a para órfãos, viúvas e mães dos soldados que morreram em combate (isto para ficar apenas do lado dos vitoriosos). Será que para eles valeu o sangue derramado?

V CONSIDERAÇÕES FINAIS.

           Percebemos que a Guerra do Contestado mostrou a forma com que os políticos e os governos tratavam as questões sociais no início da República. Onde os interesses financeiros de grandes empresas e proprietários rurais ficavam sempre acima das necessidades da população mais pobre. E não havia espaço para a tentativa de solucionar os conflitos com negociação. Quando havia organização daqueles que eram injustiçados, as forças oficiais, com apoio dos coronéis, combatiam os movimentos com repressão e força militar.

            Pode-se dizer que com o final desse conflito, quem mais ganhou foi o Exército Brasileiro que, vindo de desgaste anteriores desde a Guerra do Paraguai, Campanha de Canudos e participações desarticuladas, desorganizadas e desastrosas nas intervenções em diversos Estados da incipiente República, passou a se apresentar como uma organização nacionalista, sólida e responsável, digno de respeito, assim abrindo caminho para, conforme a pregação de Olavo Bilac a instituição do Serviço Militar no Brasil.

            Por fim, podemos dizer que para a posteridade, o Homem do Contestado legou a Santa Catarina uma herança cultural que inclui: uma lição de valentia e bravura, não se submetendo à tirania e à opressão, preferindo lutar e morrer tentando ser livre; a consolidação do exemplar regime de minifúndios policultores, provocando a todos a possibilidade de, mesmo pequeno, ser grande; o nobre sentimento de defesa de seu patrimônio ambiental, desde quando o equilíbrio ecológico passou a ser ameaçado pela devastação; finalmente, uma contribuição ímpar na descoberta de caminhos para levar os catarinense a conquistar a sua cidadania através da ação comunitária.

 REFERÊNCIAS:

 COTRIM, Gilberto. História Global: Brasil e geral. São Paulo: Saraiva, 2005.

SCHMIDT, Mario. Nova História. São Paulo: Nova Geração, 1999.

RODRIGUES, Rogério Rosa; MACHADO, Paulo Pinheiro; TONON, Eloy.

 Revista História Bibliote


Autor: Rivanildo Da Silva Lino


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