EXISTE ÉTICA E POSSIBILIDADE DE OFERECER DIGNIDADE NO ESTUDO ANATÔMICO REALIZADO COM CADÁVERES?



Em principio, esta reflexão possibilita uma analise mais detalhada sobre o estudo realizado com cadáveres. Deste modo, o autor Cury (2005) retrata em seu Livro o Futuro da Humanidade, a história de um jovem estudante da medicina, Marco Polo, que expressa suas expectativas em relação ao estudo anatômico do corpo humano, quando entra para a faculdade, contudo, percebe, no decorrer da historia que as outras pessoas não esperam o mesmo que ele.

Deste modo, a discussão a ser feita é de certo modo, se existe ética e a possibilidade de oferecer dignidade para aquele que já não abita o seu corpo. Essa reflexão somente será possível de se fazer, levando em consideração a perspectiva e percepção de quem está estudando. Desta forma, é possível afirmar que, a ética, o respeito, a dignidade propriamente dita será dada por aquele que esta manuseando um cadáver com a finalidade de obter um conhecimento.

De certa forma, é importante salientar que o próprio estudo anatômico realizado com cadáveres, somente poderá ser feito com a fragmentação do corpo, com base nessa afirmação, é correto dizer que, a percepção de se estar lidando com pessoas pode ser perdida no momento em que o corpo é analisado por partes.

Desse modo, Cury (2008) ressalva, no decorrer da trajetória de Marco Polo, que os alunos emanam em seus comportamentos o desejo de aprender a arte de salvar vidas, contudo, ao se depararem com cadáveres dispostos como animais, sem ao menos antes passar por uma preparação do que é a morte, tal imagem poderiam destruir seus sonhos.

Nesse momento, surge outra reflexão, se por acaso é o estudante que tem que ter a percepção de ser ético e praticar a complexa ciência de forma digna visando respeitar aquele corpo que algum dia participou desse espetáculo que é a vida, então é possível dizer que, é importante a existência de um preparo dos alunos antes de se depararem com a imagem da morte.

Com base em Pessini, Ruiz (2007), os aspectos ético-legais no estudo de cadáveres consistem em utilizar cadáveres não reclamados, sem qualquer documentação, de causa natural ou não natural, sendo que se for desta ultima forma, é preciso submeter a necropsia no órgão acometido, e morte comprovada por resultado de ação criminosa. Tudo com base na Lei 8.501, de 30 de novembro de 1992.

Contudo, o perigo é caso não já preparação com abordagens filosóficas e psicológicas, que o estudante se torne lógicos e objetivos, e não consigam perceber o lado humano das pessoas. (CURY, 2005).

Segundo Pessini, Ruiz, (2007) como uma forma de amenizar essa situação que por vezes é bastante polêmica, visto que muitas pessoas discordam da utilização de cadáveres no estudo do corpo humano, é, em relação à tecnologia, o uso substituto de programas e material sintético semelhantes às partes do corpo humano. Entretanto, esse tipo de subsidio não apresenta a mesma forma e textura que cadáveres humanos.

Para esses autores, esse meio de substituir a utilização de cadáveres, pode fazer com que o profissional não seja qualificado. O que pode prejudicar o processo de ensino-aprendizagem dos estudantes.

A reflexão necessária agora é entender como o estudante poderá expressar dignidade sobre um cadáver não reclamado, que, contudo, também já foi uma pessoa, viveu emoções, sofreu e compartilhou de experiências semelhantes a dos estudantes que o estar dissecando e cortando seu corpo em partes.

Desse modo, Marco Polo (CURY,2005) acreditava que cada ser humano é um mundo, não existe o fato de alguém não ter um nome, algum dia ela sorriu, amou, chorou, construiu uma historia, e pelo simples fato de ter vivido, merece respeito dignidade.

De acordo com Prates, Cabral (2010) o que precisa ser feito é criação de alternativas que minimizem as dificuldades da aquisição de cadáveres, seja implantando programas de divulgação de como se pode doar seu corpo para fins educacionais, ou sugerindo a desburocratização por parte de órgãos teoricamente competentes. Em todos os casos, os autores concordam com a utilização dos cadáveres para estudo e pesquisa.

Entretanto, é importante relevar que todo ser humano é dotado de personalidade, nesse caso, é considerado um atributo jurídico, em que todas as pessoas, nascidas vivas, são dotadas disto, o que confere a todas as pessoas a possibilidade de atuar no mundo jurídico, nas chamadas relações jurídicas; ora sendo titular de direitos, como um crédito, a vida, a honra, herança, a intimidade, o nome, a incolumidade físico e psíquica; ora sendo obrigado a algum dever, como a assistência ao cônjuge, um débito, ao socorro, ao pagamento de algum bem de valor. Dentro desses direitos encontram-se os chamados “direitos de personalidade”: uma categoria especial de direitos, ligados intimamente à simples condição humana, decorrente da simples condição de ser humano, que tem como princípio fundamental a dignidade da pessoa e da vida humana.

Por fim, é entendido que para se obter o conhecimento necessário é preciso a utilização de corpos reais, contudo, é necessário rever questões como a preparação do individuo enquanto formando de uma profissão que tem que ter a vida como instrumento de trabalho. É importante que se tenha paixão pela vida e pelas pessoas, para que se possa demonstrar respeito por aqueles que já não estão entre nós.

REFERÊNCIAS

  • CURY, Augusto Jorge, 1958- O futuro da humanidade: a saga de marco polo. Augusto Cury. - Rio de Janeiro. Sextante.  2005.
  • PESSINI, Leo, RUIZ, Cristiane. Anatomia humana e ética: dignidade no corpo sem vida? São Paulo. Paulus. 2007.
  • PRATES. Nadir Eunice Valverde Barbato de. CABRAL, Richard Halti. O anatomista. Revista de Divulgação Científica da Sociedade Brasileira de Anatomia. Ano –1, Volume –2, Abril-Junho, 2010.

 

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Autor: Vanúsia Santos Ferreira


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