Seu Pai? O Burro Levou.
Dizia meu pai que estava vindo a pé para casa, à noite, quando viu um vulto de uma pessoa montada em um burro em sua frente. Ele percebeu que era gente conhecida e o burro também não lhe era estranho. Acelerou seu passo e se aproximou do cavaleiro, mas este se distanciava. Cada vez que ele se aproximava, mais e mais o homem do burro fazia o animal apertar o passo. Estava nesta peleja e meu pai começou a ficar com medo. Ele pensou: e se for o fantasma do meu sogro? Assim pensou e teve certeza, porque a capa preta era igual a que ele usava. O burro era o mesmo , de estimação, e até o chapéu era o dele!
Meu pai não teve mais dúvidas. Era Antonio de Sá! Ora essa! Esse velho nem morto pára de encher! Agora vem me perturbar querendo me ensinar a administrar o Surubim, de lá, de onde ele está. Reduziu o passo e começou a rezar. Rezou um pai nosso, dez ave-marias, um credo, uma salve-rainha, um ato de contrição e nada de conseguir chegar em casa. Prometeu levar um maço de velas no cruzeiro de Terra Nova em favor da alma dele; Iria mandar rezar uma missa na Barra do Mororó para todos os falecidos da família; Pediria uma novena na Fazenda Timbaúba e duas novenas na Fazenda Surubim, porque esses eram os lugares onde meu avô costumava ir quando vivo.
Tanto meu pai rezou e fez promessa que até esqueceu que o homem do burro era morto. Mas chegou em casa aliviado! Disse que teria que ir à cidade. Contou para minha mãe: Teu pai veio me fazer cobranças de novo! Vamos ter que ir para Parnamirim amanhã cedinho, falar com Padre Reginaldo e pagar todas as promessas que fiz, senão ele vai voltar para me encher o saco!. E minha mãe , que estava ouvindo no rádio a propaganda do filme E o Vento Levou que iria estrear em um cinema no Rio de Janeiro, sem entender bem o que meu pai falava e sem lembrar que seu pai era falecido, perguntou:
-Mas onde está meu pai, homem? Ele já morreu!
Ele respondeu:
- Seu pai? O Burro Levou!
Vocabulário:
Barra do Mororó: área de fazendas e currais pertencente à família Sá
João Corrêa: Fazenda de propriedade de Elísio Araújo , famosa pelo seu açude.
Morais: propriedade perto da cidade de Terra Nova
Surubim: Fazenda que Antonio de Sá deixou de herança para Djanira de Sá, sua filha.
Timbaúba: Fazenda que Antonio de Sá deixou para Nelson de Sá, seu filho.
Autor: Djalmira Sá Almeida
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