INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL “POST MORTEM” X PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA



INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL “POST MORTEM” X PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA: A (IM)POSSIBILIDADE DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA DA PROLE EVENTUAL 

Bianca marques Oliveira

Dayane Machado Borges

            Diego Vieira de Moura

João Gustavo Mendonça Machado

Rodrigo Coutinho Borges

Viviane Rodrigues dos Santos*

 

Resumo

O  principal objetivo neste trabalho é verificar através de pesquisa bibliográfica baseada em dados primários e secundários, as possibilidades em que o Código Civil garante a sucessão testamentária da prole eventual. O estudo justifica-se em função do conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (da prole eventual) e o Princípio da Segurança Jurídica (diante aos herdeiros já concebidos à época da abertura da sucessão) e em função da relevância social e jurídica perante o assunto. Diante pesquisa sob enfoque interdisciplinar por abranger vários ramos do Direito, baseando em concepções de autores e doutrinadores e ainda abrangendo legislação e os estudos foram direcionados ao Direito de Família que serve de base para analisar e entender o conceito de Inseminação Artificial “post mortem”, ao Direito das sucessões ao analisarmos a (im)possibilidade da sucessão testamentária da prole eventual e o  Direito Constitucional pelo conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Segurança Jurídica. Caso a criança venha a nascer após o término do inventário e da partilha poder ser tranquilamente solucionado de acordo com o próprio sistema jurídico atual em matéria de herdeiros legítimos preteridos. Deve-se admitir a petição de herança no prazo prescricional de dez anos da morte do autor da herança.

Palavras - chave: Técnicas de Reprodução Assistida. Concepção da prole eventual. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

1. Introdução:

 

O presente artigo científico, cujo tema é: “Inseminação artificial “post Mortem” X princípio da segurança jurídica: a (im)possibilidade da sucessão testamentária da prole eventual”, procurará responder, mais especificamente, ao seguinte problema: de acordo com o ordenamento jurídico vigente é possível que a prole eventual possa receber herança?

A relevância desta pesquisa justifica em função do conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (da prole eventual) e o Princípio da Segurança Jurídica (diante aos herdeiros já concebidos à época da abertura da sucessão). E em função da relevância social e jurídica perante o assunto.

Nessa direção, o objetivo geral do estudo  é verificar as possibilidades em que o Código Civil garante a sucessão testamentária da prole eventual. Para isso há de cumprir especificamente as seguintes etapas: analisar a aplicabilidade do princípio da segurança jurídica na sucessão testamentária da prole eventual; Verificar se existe prazo pré-estabelecido da concepção da prole eventual para que haja direito a sucessão testamentária; comparar a discussão doutrinária sobre a concepção de a prole eventual ter ocorrido ou não no casamento.

2. Inseminação Artificial “Post Mortem” e o Código Civil

É uma questão nova, que surgiu devido aos avanços tecnológicos em especial as técnicas de reprodução assistida. O Código civil não deixa de mencionar a respeito do assunto, pois, refere-se à inseminação artificial homologa post mortem, contudo verifica - se a falta de regulamentação jurídica específica que apresente uma solução transparente, levando em consideração a gravidade da questão.

Ressalta Silvo de Salvo Venosa:

O Código Civil não autoriza e nem regulamenta a reprodução assistida, mas apenas constata a existência da problemática e procura dar solução exclusivamente ao aspecto da paternidade. Toda essa matéria, que é cada vez mais ampla e complexa, deve ser regulada por lei específica, por opção do legislador.  (2007, p.256).

Faz-se interessante fazer um breve conceito de inseminação artificial post mortem, segundo Roberto Senise Lisboa “ocorre a inseminação artificial post mortem quando o cônjuge que contribuiu com o material genético veio posteriormente a falecer, antes do nascimento com vida do ser vivo”. (2006, p.). 

No entanto é uma situação bastante controversa entre grandes doutrinadores, o que gera a discussão é o fato de um filho nascido enquanto ambos os pais estavam vivos são considerados herdeiros legítimos, enquanto outro filho, nascido por inseminação artificial após a morte do pai pode ser no máximo herdeiro testamentário.

O artigo 1.798 do Código Civil é bastante taxativo ao estabelecer que “se legitimam a suceder as pessoas já nascidas ou já concebidas no momento da sucessão”.

Para Giselda Maria e Rodrigo da Cunha “o legislador ao formular a regra contida no mencionado artigo não atentou para os avanços científicos na área da reprodução humana ao se tratar das pessoas já concebidas”. (HIRONAKA, PEREIRA, 2004, p. 206).

Porém o artigo leva a entender que somente os filhos que foram concebidos antes da morte do autor da sucessão têm direito tanto à sucessão testamentária quanto à sucessão legítima, os filhos que foram concebidos após a morte do pai só têm direito se houver sucessão testamentária.

Alguns autores entendem que a prole eventual não poderá herdar, a menos que tenha sido concebida à época do óbito. Por isso considera a técnica de reprodução assistida inadmissível por representar violação ao Princípio do Melhor Interesse da Criança.

Contrariando, então a posição de alguns doutrinadores, enfatiza-se aqui o inciso III do artigo 1597 do Código civil “presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido”.

Maria Berenice Dias assegura:

O projeto parental iniciou-se durante a vida, o que legaliza e legitima a inseminação post mortem. A norma constitucional que consagra a igualdade da filiação não traz qualquer exceção. Assim, presume-se a paternidade do filho biológico concebido depois do falecimento de um dos genitores. Ao nascer, ocupa a primeira classe dos herdeiros necessários (DIAS, 2011, p. 117).

Giselda Maria e Rodrigo da Cunha fazem uma interpretação extensiva do artigo 1.798 do Código civil:

O art. 1798 do novo Código Civil disse menos do que queria, devendo o interprete proceder ao trabalho de estender o preceito para os casos de embriões já formados e daqueles a formar. O problema que surge caso a criança venha a nascer após o término do inventário e da partilha poder ser tranquilamente solucionado de acordo com o próprio sistema jurídico atual em matéria de herdeiros legítimos preteridos. Deve-se admitir a petição de herança no prazo prescricional de dez anos da morte do autor da herança. (HIRONAKA; PEREIRA, 2004, p.207).

Ainda havendo sucessão testamentária à prole eventual de pessoa certa e determinada, propõe o §4º do artigo 1.800 prazo de dois anos após a abertura da sucessão para que seja concebido o herdeiro esperado, sob pena de os bens reservados serem transferidos ao quinhão dos herdeiros legítimos.

3. Princípio da Segurança Jurídica

Alguns doutrinadores admitem que a possibilidade da inseminação artificial “post mortem” gera insegurança jurídica quanto aos herdeiros à época da abertura da sucessão, referente a uma possível alteração da partilha dos bens.

Conforme ilustra Guilherme Calmon Nogueira da Gama:

A violação ao do melhor interesse da futura criança, além da própria circunstância de ocorrer afronta ao princípio da igualdade material entre os filhos sob o prisma (principalmente) das situações jurídicas existenciais, não autoriza a admissibilidade do recurso a tais técnicas científicas. Assim, a questão se coloca no campo da inadmissibilidade, pelo ordenamento jurídico brasileiro, das técnicas de reprodução assistida post mortem. Deve-se considerar que o tratamento é diferenciado, no campo sucessório, entre os filhos, já que ao menos os filhos concebidos após a morte do pai somente poderão herdar na sucessão testamentária, e não na sucessão legítima. (GAMA, 2003, P.)

Embora Silvio Venosa não concorde com a sucessão da prole eventual “admite que unicamente na sucessão testamentária possam ser chamados a suceder o filho esperado de pessoa indicada, mas não concebido, aguardando-se até dois anos sua concepção e nascimento, após a abertura da sucessão, com reserva de bens da herança”. (2007, p.219).

Para Maria Helena Diniz devem-se evitar tais práticas, levando em consideração que o morto não exerce mais direito nem deveres a cumprir:

É preciso evitar tais práticas, pois a criança, embora possa ser filha genética, por exemplo, do marido de sua mãe, será, juridicamente, extramatrimonial, pois não terá pai, nem poderá ser registrada como filha matrimonial em nome do doador, já que nasceu depois de 300 dias da cessação do vínculo conjugal em razão da morte de um dos consortes. E, além disso, o morto não mais exerce direitos, nem deveres a cumprir. Não há como aplicar a presunção de paternidade, uma vez que o matrimônio se extingue com a morte, nem como conferir direitos sucessórios ao que nascer por técnica conceptiva post mortem, pois não estava gerado por ocasião da morte de seu pai genético (...). Por isso, necessário será que se proíba legalmente a reprodução assistida post mortem, e, se, porventura, houver permissão legal, dever-se-á prescrever quais serão os direitos do filho, inclusive sucessórios. (DINIZ, 1995, P.91).

Ainda havendo sucessão testamentária à prole eventual de pessoa certa e determinada, propõe o §4º do artigo 1.800 prazo de dois anos após a abertura da sucessão para que seja concebido o herdeiro esperado, sob pena de os bens reservados serem transferidos ao quinhão dos herdeiros legítimos.

4. Princípio Da Dignidade da Pessoa Humana

É relevante destacarmos que um dos Princípios mais importantes é o da Dignidade da Pessoa Humana que tem reflexo por todos os ramos do direito, se tratando de Direito de Família, principalmente no Princípio da Igualdade entre os filhos e no planejamento familiar.

A esse respeito o artigo 226, § 7º, CF/88, estabelece o seguinte: "fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas".

Observando o assunto sob o prisma do artigo 1597 do Código Civil, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana  e o grande avanço tecnológico referente as técnicas de reprodução assistida, a prole concebida após a morte terá direito a sucessão igualitário a qualquer um dos filhos, por ser considerada concebida na constância do casamento.

Corroborando referida hipótese, colacionam-se os seguintes doutrinadores:

Destaca Francisco José Cahali:

No sistema jurídico anterior ao novo Código Civil, era inadmissível a constituição de vínculo de parentesco; contudo, diante a regra do art. 1597, considera-se que o filho do falecido, fruto de técnica de reprodução assistida post mortem, terá o direito à sucessão como qualquer outro filho, havendo sério problema a ser resolvido quando ocorrer o nascimento da criança depois de já encerrado o inventário e a partilha dos bens da sucessão. (CAHALI, 2003, p.132 apud HIRONAKA, PEREIRA, 2004, P.20).

Débora Gozzo propõe a utilização da analogia como solução:

Considera possível reconhecer o direito sucessório a prole resultante de técnica de reprodução assistida post mortem, da mesma maneira que se admite a sucessão testamentária de filho eventual de pessoa certa e determinada, sugerindo o ajuizamento da petição de herança para tanto. (GOZZO, 2004, p. 42 apud HIRONAKA, PEREIRA, 2004, P.207).

Como impõe Carlos Albuquerque:

Não se poder excluir da participação nas repercussões jurídicas, no âmbito do direito de família e no direito das sucessões, aquele que foi engendrado com intervenção médica ocorrida após o falecimento do autor da sucessão, ao argumento de que tal solução prejudicaria ou excluiria o direito dos outros herdeiros já existentes ou pelo menos concebidos no momento da abertura da sucessão. Além disso, não devem prevalecer as assertivas que privilegiam a suposta segurança no processo sucessório. (2007, p. 6 e 7).

O simples fato do nascimento com vida da prole eventual, e comprovada a filiação já se faz suficiente para que seja considerado herdeiro legítimo, como qualquer outro filho.

5. Conclusão

Em se tratando de reprodução assistida houve um grande avanço tecnológico,  em consequência ficou prejudicado o entendimento jurídico, considerando que o Código civil não trata especificamente do assunto, apenas o mencionando. Isso ocorre pelo fato de no momento que foi editado o código civil, não existiam possibilidades em se tratando do assunto.

A questão do ponto de vista doutrinário é bastante divergente. Com o presente estudou visou traças os posicionamentos de cada corrente doutrinária.

Observando o assunto sob o prisma do artigo 1597 do Código Civil, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o grande avanço tecnológico referente as técnicas de reprodução assistida, a prole concebida após a morte terá direito a sucessão igualitário a qualquer um dos filhos, por ser considerada concebida na constância do casamento.

Assim deve-se assegurar ao sujeito nascido através de inseminação artificial “post mortem” o direito de ter sua paternidade reconhecida e ainda haver reconhecido seus direitos sucessórios da mesma maneira que se admite a sucessão testamentária de filho eventual de pessoa certa e determinada.

O que necessita ser regulamentado pelo Código Civil é um prazo determinado para o nascimento, para que tenha esse sujeito seus direitos sucessórios reconhecidos.

Enquanto não seja estabelecido esse prazo no ordenamento jurídico, recomenda-se que se faça o uso da analogia utilizando-se o prazo estabelecido no § 4º, do art. 1.800, do CC/2002, ou seja, o prazo de dois anos após a abertura da sucessão, através de ajuizamento da petição de herança, visando dar uma maior segurança quanto ao quinhão hereditário dos outros sucessores já concebidos no momento da abertura da sucessão.

Dessa forma, garantindo o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, não deixando a prole eventual desamparada pelo direito.

  1. 6.      Referências Bibliográficas

ALBUQUERQUE FILHO, Carlos Cavalcante de. Fecundação artificial post mortem e o direito sucessório. Disponível em: Acesso em: 04 ago. 2007. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

CASTILHO, Auriluce Pereira; MARTINS BORGES, Nara Rúbia; PEREIRA, Vânia Tanús. Manual de Metodologia Científica do ILES Itumbiara-GO. Itumbiara: ILES/ULBRA, 2011.DINIZ, Maria Helena. A ectogênese e seus problemas jurídicos. São Paulo: Max Limonad, 1995. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais: o estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

GOZZO, Débora. Comentários ao Código Civil Brasileiro: do Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2004. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novais; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das Sucessões e o Novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil, volume 5: direito de família e das sucessões. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista do Tribunais, 2006).

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 7. ed. v. 6. São Paulo: Atlas, 2007. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.


*    Alunos do 8º Período “A” do Curso de Direito do Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara/Go.

 

Bianca marques Oliveira

Dayane Machado Borges

            Diego Vieira de Moura

João Gustavo Mendonça Machado

Rodrigo Coutinho Borges

Viviane Rodrigues dos Santos*

 

Resumo

O  principal objetivo neste trabalho é verificar através de pesquisa bibliográfica baseada em dados primários e secundários, as possibilidades em que o Código Civil garante a sucessão testamentária da prole eventual. O estudo justifica-se em função do conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (da prole eventual) e o Princípio da Segurança Jurídica (diante aos herdeiros já concebidos à época da abertura da sucessão) e em função da relevância social e jurídica perante o assunto. Diante pesquisa sob enfoque interdisciplinar por abranger vários ramos do Direito, baseando em concepções de autores e doutrinadores e ainda abrangendo legislação e os estudos foram direcionados ao Direito de Família que serve de base para analisar e entender o conceito de Inseminação Artificial “post mortem”, ao Direito das sucessões ao analisarmos a (im)possibilidade da sucessão testamentária da prole eventual e o  Direito Constitucional pelo conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Segurança Jurídica. Caso a criança venha a nascer após o término do inventário e da partilha poder ser tranquilamente solucionado de acordo com o próprio sistema jurídico atual em matéria de herdeiros legítimos preteridos. Deve-se admitir a petição de herança no prazo prescricional de dez anos da morte do autor da herança.

Palavras - chave: Técnicas de Reprodução Assistida. Concepção da prole eventual. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

1. Introdução:

 

O presente artigo científico, cujo tema é: “Inseminação artificial “post Mortem” X princípio da segurança jurídica: a (im)possibilidade da sucessão testamentária da prole eventual”, procurará responder, mais especificamente, ao seguinte problema: de acordo com o ordenamento jurídico vigente é possível que a prole eventual possa receber herança?

A relevância desta pesquisa justifica em função do conflito existente entre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (da prole eventual) e o Princípio da Segurança Jurídica (diante aos herdeiros já concebidos à época da abertura da sucessão). E em função da relevância social e jurídica perante o assunto.

Nessa direção, o objetivo geral do estudo  é verificar as possibilidades em que o Código Civil garante a sucessão testamentária da prole eventual. Para isso há de cumprir especificamente as seguintes etapas: analisar a aplicabilidade do princípio da segurança jurídica na sucessão testamentária da prole eventual; Verificar se existe prazo pré-estabelecido da concepção da prole eventual para que haja direito a sucessão testamentária; comparar a discussão doutrinária sobre a concepção de a prole eventual ter ocorrido ou não no casamento.

2. Inseminação Artificial “Post Mortem” e o Código Civil

É uma questão nova, que surgiu devido aos avanços tecnológicos em especial as técnicas de reprodução assistida. O Código civil não deixa de mencionar a respeito do assunto, pois, refere-se à inseminação artificial homologa post mortem, contudo verifica - se a falta de regulamentação jurídica específica que apresente uma solução transparente, levando em consideração a gravidade da questão.

Ressalta Silvo de Salvo Venosa:

O Código Civil não autoriza e nem regulamenta a reprodução assistida, mas apenas constata a existência da problemática e procura dar solução exclusivamente ao aspecto da paternidade. Toda essa matéria, que é cada vez mais ampla e complexa, deve ser regulada por lei específica, por opção do legislador.  (2007, p.256).

Faz-se interessante fazer um breve conceito de inseminação artificial post mortem, segundo Roberto Senise Lisboa “ocorre a inseminação artificial post mortem quando o cônjuge que contribuiu com o material genético veio posteriormente a falecer, antes do nascimento com vida do ser vivo”. (2006, p.). 

No entanto é uma situação bastante controversa entre grandes doutrinadores, o que gera a discussão é o fato de um filho nascido enquanto ambos os pais estavam vivos são considerados herdeiros legítimos, enquanto outro filho, nascido por inseminação artificial após a morte do pai pode ser no máximo herdeiro testamentário.

O artigo 1.798 do Código Civil é bastante taxativo ao estabelecer que “se legitimam a suceder as pessoas já nascidas ou já concebidas no momento da sucessão”.

Para Giselda Maria e Rodrigo da Cunha “o legislador ao formular a regra contida no mencionado artigo não atentou para os avanços científicos na área da reprodução humana ao se tratar das pessoas já concebidas”. (HIRONAKA, PEREIRA, 2004, p. 206).

Porém o artigo leva a entender que somente os filhos que foram concebidos antes da morte do autor da sucessão têm direito tanto à sucessão testamentária quanto à sucessão legítima, os filhos que foram concebidos após a morte do pai só têm direito se houver sucessão testamentária.

Alguns autores entendem que a prole eventual não poderá herdar, a menos que tenha sido concebida à época do óbito. Por isso considera a técnica de reprodução assistida inadmissível por representar violação ao Princípio do Melhor Interesse da Criança.

Contrariando, então a posição de alguns doutrinadores, enfatiza-se aqui o inciso III do artigo 1597 do Código civil “presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido”.

Maria Berenice Dias assegura:

O projeto parental iniciou-se durante a vida, o que legaliza e legitima a inseminação post mortem. A norma constitucional que consagra a igualdade da filiação não traz qualquer exceção. Assim, presume-se a paternidade do filho biológico concebido depois do falecimento de um dos genitores. Ao nascer, ocupa a primeira classe dos herdeiros necessários (DIAS, 2011, p. 117).

Giselda Maria e Rodrigo da Cunha fazem uma interpretação extensiva do artigo 1.798 do Código civil:

O art. 1798 do novo Código Civil disse menos do que queria, devendo o interprete proceder ao trabalho de estender o preceito para os casos de embriões já formados e daqueles a formar. O problema que surge caso a criança venha a nascer após o término do inventário e da partilha poder ser tranquilamente solucionado de acordo com o próprio sistema jurídico atual em matéria de herdeiros legítimos preteridos. Deve-se admitir a petição de herança no prazo prescricional de dez anos da morte do autor da herança. (HIRONAKA; PEREIRA, 2004, p.207).

Ainda havendo sucessão testamentária à prole eventual de pessoa certa e determinada, propõe o §4º do artigo 1.800 prazo de dois anos após a abertura da sucessão para que seja concebido o herdeiro esperado, sob pena de os bens reservados serem transferidos ao quinhão dos herdeiros legítimos.

3. Princípio da Segurança Jurídica

Alguns doutrinadores admitem que a possibilidade da inseminação artificial “post mortem” gera insegurança jurídica quanto aos herdeiros à época da abertura da sucessão, referente a uma possível alteração da partilha dos bens.

Conforme ilustra Guilherme Calmon Nogueira da Gama:

A violação ao do melhor interesse da futura criança, além da própria circunstância de ocorrer afronta ao princípio da igualdade material entre os filhos sob o prisma (principalmente) das situações jurídicas existenciais, não autoriza a admissibilidade do recurso a tais técnicas científicas. Assim, a questão se coloca no campo da inadmissibilidade, pelo ordenamento jurídico brasileiro, das técnicas de reprodução assistida post mortem. Deve-se considerar que o tratamento é diferenciado, no campo sucessório, entre os filhos, já que ao menos os filhos concebidos após a morte do pai somente poderão herdar na sucessão testamentária, e não na sucessão legítima. (GAMA, 2003, P.)

Embora Silvio Venosa não concorde com a sucessão da prole eventual “admite que unicamente na sucessão testamentária possam ser chamados a suceder o filho esperado de pessoa indicada, mas não concebido, aguardando-se até dois anos sua concepção e nascimento, após a abertura da sucessão, com reserva de bens da herança”. (2007, p.219).

Para Maria Helena Diniz devem-se evitar tais práticas, levando em consideração que o morto não exerce mais direito nem deveres a cumprir:

É preciso evitar tais práticas, pois a criança, embora possa ser filha genética, por exemplo, do marido de sua mãe, será, juridicamente, extramatrimonial, pois não terá pai, nem poderá ser registrada como filha matrimonial em nome do doador, já que nasceu depois de 300 dias da cessação do vínculo conjugal em razão da morte de um dos consortes. E, além disso, o morto não mais exerce direitos, nem deveres a cumprir. Não há como aplicar a presunção de paternidade, uma vez que o matrimônio se extingue com a morte, nem como conferir direitos sucessórios ao que nascer por técnica conceptiva post mortem, pois não estava gerado por ocasião da morte de seu pai genético (...). Por isso, necessário será que se proíba legalmente a reprodução assistida post mortem, e, se, porventura, houver permissão legal, dever-se-á prescrever quais serão os direitos do filho, inclusive sucessórios. (DINIZ, 1995, P.91).

Ainda havendo sucessão testamentária à prole eventual de pessoa certa e determinada, propõe o §4º do artigo 1.800 prazo de dois anos após a abertura da sucessão para que seja concebido o herdeiro esperado, sob pena de os bens reservados serem transferidos ao quinhão dos herdeiros legítimos.

4. Princípio Da Dignidade da Pessoa Humana

É relevante destacarmos que um dos Princípios mais importantes é o da Dignidade da Pessoa Humana que tem reflexo por todos os ramos do direito, se tratando de Direito de Família, principalmente no Princípio da Igualdade entre os filhos e no planejamento familiar.

A esse respeito o artigo 226, § 7º, CF/88, estabelece o seguinte: "fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas".

Observando o assunto sob o prisma do artigo 1597 do Código Civil, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana  e o grande avanço tecnológico referente as técnicas de reprodução assistida, a prole concebida após a morte terá direito a sucessão igualitário a qualquer um dos filhos, por ser considerada concebida na constância do casamento.

Corroborando referida hipótese, colacionam-se os seguintes doutrinadores:

Destaca Francisco José Cahali:

No sistema jurídico anterior ao novo Código Civil, era inadmissível a constituição de vínculo de parentesco; contudo, diante a regra do art. 1597, considera-se que o filho do falecido, fruto de técnica de reprodução assistida post mortem, terá o direito à sucessão como qualquer outro filho, havendo sério problema a ser resolvido quando ocorrer o nascimento da criança depois de já encerrado o inventário e a partilha dos bens da sucessão. (CAHALI, 2003, p.132 apud HIRONAKA, PEREIRA, 2004, P.20).

Débora Gozzo propõe a utilização da analogia como solução:

Considera possível reconhecer o direito sucessório a prole resultante de técnica de reprodução assistida post mortem, da mesma maneira que se admite a sucessão testamentária de filho eventual de pessoa certa e determinada, sugerindo o ajuizamento da petição de herança para tanto. (GOZZO, 2004, p. 42 apud HIRONAKA, PEREIRA, 2004, P.207).

Como impõe Carlos Albuquerque:

Não se poder excluir da participação nas repercussões jurídicas, no âmbito do direito de família e no direito das sucessões, aquele que foi engendrado com intervenção médica ocorrida após o falecimento do autor da sucessão, ao argumento de que tal solução prejudicaria ou excluiria o direito dos outros herdeiros já existentes ou pelo menos concebidos no momento da abertura da sucessão. Além disso, não devem prevalecer as assertivas que privilegiam a suposta segurança no processo sucessório. (2007, p. 6 e 7).

O simples fato do nascimento com vida da prole eventual, e comprovada a filiação já se faz suficiente para que seja considerado herdeiro legítimo, como qualquer outro filho.

5. Conclusão

Em se tratando de reprodução assistida houve um grande avanço tecnológico,  em consequência ficou prejudicado o entendimento jurídico, considerando que o Código civil não trata especificamente do assunto, apenas o mencionando. Isso ocorre pelo fato de no momento que foi editado o código civil, não existiam possibilidades em se tratando do assunto.

A questão do ponto de vista doutrinário é bastante divergente. Com o presente estudou visou traças os posicionamentos de cada corrente doutrinária.

Observando o assunto sob o prisma do artigo 1597 do Código Civil, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o grande avanço tecnológico referente as técnicas de reprodução assistida, a prole concebida após a morte terá direito a sucessão igualitário a qualquer um dos filhos, por ser considerada concebida na constância do casamento.

Assim deve-se assegurar ao sujeito nascido através de inseminação artificial “post mortem” o direito de ter sua paternidade reconhecida e ainda haver reconhecido seus direitos sucessórios da mesma maneira que se admite a sucessão testamentária de filho eventual de pessoa certa e determinada.

O que necessita ser regulamentado pelo Código Civil é um prazo determinado para o nascimento, para que tenha esse sujeito seus direitos sucessórios reconhecidos.

Enquanto não seja estabelecido esse prazo no ordenamento jurídico, recomenda-se que se faça o uso da analogia utilizando-se o prazo estabelecido no § 4º, do art. 1.800, do CC/2002, ou seja, o prazo de dois anos após a abertura da sucessão, através de ajuizamento da petição de herança, visando dar uma maior segurança quanto ao quinhão hereditário dos outros sucessores já concebidos no momento da abertura da sucessão.

Dessa forma, garantindo o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, não deixando a prole eventual desamparada pelo direito.

  1. 6.      Referências Bibliográficas

ALBUQUERQUE FILHO, Carlos Cavalcante de. Fecundação artificial post mortem e o direito sucessório. Disponível em: Acesso em: 04 ago. 2007. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

CASTILHO, Auriluce Pereira; MARTINS BORGES, Nara Rúbia; PEREIRA, Vânia Tanús. Manual de Metodologia Científica do ILES Itumbiara-GO. Itumbiara: ILES/ULBRA, 2011.DINIZ, Maria Helena. A ectogênese e seus problemas jurídicos. São Paulo: Max Limonad, 1995. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais: o estabelecimento da parentalidade-filiação e os efeitos jurídicos da reprodução assistida heteróloga. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

GOZZO, Débora. Comentários ao Código Civil Brasileiro: do Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2004. HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novais; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das Sucessões e o Novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil, volume 5: direito de família e das sucessões. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista do Tribunais, 2006).

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 7. ed. v. 6. São Paulo: Atlas, 2007. Disponível em: . Acesso em: 07/04/2011.


 
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Autor: Dayane Machado Borges


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