ANÁLISE DO DISCURSO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA...



ANÁLISE DO DISCURSO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, NA SESSÃO DE POSSE NO CONGRESSO NACIONAL

Segundo Mussalin (2003), o panorama histórico dos estudos a respeito da análise do Discurso proposta por Pêcheux na década de sessenta na França, a teoria situava-se na reflexão em relação à linguística e o Discurso, embasando-a articulação de três regiões do conhecimento: o materialismo histórico; a Linguística e a teoria do discurso. A análise depreende o objeto do discurso como um processo das condições de produção a partir do pressuposto de que é constituído pelo tecido-social.

Pêcheux (1990a: 26) afirma que o discurso permite dizer algo além do texto mesmo, com a condição de que o texto seja de certo modo realizado.

Foucault (1997: 99) entende que o enunciado é uma função de existência que pertence exclusivamente aos signos a partir de práticas discursivas que acontecem na sociedade em forma de textos. O enunciado é um acontecimento único, aberto a repetição, a transformação e a reativação.

a enunciação é singular e irrepetível, o acontecimento tem data e lugar determinado. (apud Cardoso, 1999: 36)

Pêcheux (apud Achard, 1999: 65) afirma que a formação discursiva delimita aquilo que pode ser dito por um sujeito em uma posição discursiva em um momento dado em uma conjuntura dada.

Pêcheux (1997: 78) afirma que as palavras têm seu sentido num discurso que remete sempre a ocorrências anteriores, cristalizando práticas de textualização em formas textuais. Assim, essas práticas ocorrem em lugares sociais, organizados e reconhecidos como portadores de fala.

Desde o início Lula lutou pelas causas sociais trabalhistas, defendendo os direitos dos latifundiários paulistas. Quando os defendia teve que se posicionar politicamente, mas sua posição política não foi vista por alguns empresários como satisfatórias, e assim alguns políticos denegriam sua imagem perante o povo brasileiro em três campanhas eleitoral anteriores que se candidatou para ser o presidente da República. Após as três derrotas consecutivas Lula resolveu mudar seu discurso o que ocasional êxito em sua campanha eleitoral, sendo diplomado como Presidente da República.

Nas três campanhas consecutivas o partido PT lançou como candidato Lula que defendia os princípios socialistas, cuja ideologia critica o liberalismo econômico, tais princípios surgiam como forma de protesto contra as desigualdades provocadas pelo intenso processo de industrialização e contra as péssimas condições de vida. Outra característica do candidato Lula é participação em movimento popular, sendo considerado como parceiro na luta pela cidadania plena.

O slogan “mudança” da campanha eleitoral de Lula propõe desenvolvê-la num processo gradativo, continuado por meio de diálogo e negociação, com o sentido de colher resultados consciente e duradouro para favorecer toda a população brasileira. E para isso, o Presidente utilizou palavras chaves para conseguir implantar sua proposta de mudança, tais como: iniciativas de impacto financeiro-orçamentário; infra-estrutura; iniciativa com impacto político-institucional; inclusão social; inserção soberana; gestão do Estado; combate à corrupção; democracia e diálogo.

1º Turno

Total de urnas                                                    

320.458

 

Eleitores                                                      

115.254.113

 

Abstenção 

20.476.568

17,8%                              

       

No segundo turno obteve-se o seguinte resultado

a) O termo “mudança” no discurso do presidente:

(1) “Mudança esta é a palavra chave”

(2) “Mudar com coragem e cuidado, humildade e ousadia, mudar tendo consciência”

(3) “mudança é um processo gradativo e continuado”

No enunciado (1)mudança esta é a palavra chave” é possível inferir que não se trata apenas de uma mudança qualquer, de um presidente eleito para outro, mas de uma “mudança” com sentido de ruptura, ou seja, uma mudança de princípios, propostas e ideias de um partido que nunca chegou ao poder máximo na história do Brasil.

No enunciado (2) “mudar com coragem e cuidado, humildade e ousadia, mudar tendo consciência”, é possível considerar que “mudar com coragem” é um atributo do povo brasileiro que elegeu pela primeira vez um candidato de esquerda. Considerando ainda, a palavra “cuidado” e “humildade” é atribuído ao próprio Lula, pois ele recebeu autorização para mudar o país, mas essa mudança não deve ser de qualquer forma, deve ser uma mudança cuidadosa, o que implica não romper com a democracia.

No enunciado (3) “mudança é um processo gradativo e continuado”, podemos observar que a mudança será efetuada de forma a respeitar toda a diversidade política, econômica, social e institucional do país. O que implica em considerar mudança como seu processo gradativo e continuado sem a ruptura com a ordem social.

b) O Presidente reitera alguns fatos históricos da ascensão da economia brasileira.

(4) “O Brasil conheceu a riqueza dos engenhos”

(5) “plantações de cana-de-açúcar nos primeiros tempos coloniais”

(6) “proclamou a independência nacional”

(7) “aboliu a escravidão”

(8) “conheceu a riqueza das jazidas de ouro, em Minas Gerais”

(9) “produção de café, no Vale do Paraíba”

(10) “industrializou-se e forjou um notável e diversificado parque produtivo”

(11) “Vamos mudar, sim”

Os fatos históricos citados anteriormente tiveram grande importância para a economia brasileira, tanto para a importação quanto a exportação; e Lula “relembra-os” com o objetivo de comparar a “elevação” da economia com a perspectiva da economia também ser registrado na história.

c) A Reforma Agrária, considerando que nos últimos vinte anos a briga pela terra tem acirrado, cujo principal sujeito é o MST.

d) Discurso de prioridade de Governo

(12) Combate à fome

e) Discurso de acordos internacionais: ALCA/ MERCOSUL

O presidente Lula afirma que para vivermos numa nação em que todos possam andar de cabeça erguida, teremos de exercer quotidianamente duas virtudes: paciência e perseverança. Somente com prudência nas decisões e persistência na concretização dos ideais, que todo o povo brasileiro poderá atingir as metas desejadas pelo PT, e consequentemente, os indivíduos poderão viver dignamente na sociedade. Logo a seguir, Lula diz duas frases interessantes: pisar na estrada de olhos abertos e caminhar com passos pensados, a primeira remete a ideia de que o ser humano ao andar necessite de olhos estarem abertos, que pode designar atenção e observação nos atos que serão tomados, no caso do Presidente da República é porta voz da população brasileira. E a segunda, para caminhar não precisa de passos pensados, talvez o presidente queira dizer que é necessário ter cautela e pensar antes de agir, tendo perseverança para alcançar os objetivos esperados por todos brasileiros.

A Análise do Discurso de orientação francesa, segundo que se desenvolveu há mais de quarenta anos é um campo que não tem fronteiras definidas por ser muito heterogênea, embora uma das tarefas do analista seja justamente dar atenção a esse aspecto, demarcando procedimentos de análise e o próprio conceito de discurso que não é simplesmente, um objeto dado no mundo, como se fosse algo transparente. Como objeto de teoria científica, ele precisa ser construído.

Numa sociedade há relações de classe que implicam certas posições políticas e ideológicas que, por sua, vez incluem formações discursivas interatuantes, e que determinam o que pode e o que deve ser dito, considerando certas posições na conjuntura social. É através dessas formações discursivas não estabelecidas que se possa reconhecer nos textos o cruzamento de vários discursos e, ao mesmo tempo a dominância de um discurso.

Para finalizar observa-se que o partido PFL deixou transparecer em suas atitudes que aderiram aos princípios liberais que são considerados como de direita. Enquanto que o partido PT tem sua origem no socialismo, o PT sempre defendeu as causas sociais - característica é que o Presidente intervém diretamente nas negociações de mercado interno e externo, e ainda é considerado como de esquerda porque se opõe aos princípios liberais. Enfim, Lula deixa explícita sua posição política em relação ao governo de FHC, para exemplificar temos que o povo brasileiro optou por novos horizontes e consequentemente trilhar novos caminhos.

Referências 

CARDOSO, Silvia Barbi. Discurso e Ensino.  Belo Horizonte. Autêntica: 1999.

FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.

_________________. Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997

GREGOLIN, Maria do Rozário V. A análise do discurso: entornos do sentido. Araraquara: Cultura Acadêmica, 2001.

PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas: Editora da Unicamp, 1995.

_____________. O discurso. Estrutura ou acontecimento. Trad. Eni Orlandi. São Paulo: Pontes, 1990.

_____________. A propósito da Análise Automática do Discurso: atualização e perspectivas. In: GADET, F. & HANK, T. Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. 3 ed. Campinas, São Paulo: Unicamp, 1997. (163-4).

____________. Análise automática do discurso. In: GADET, F., HAK, T. (Orgs) Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas: Editora da Unicamp, 1990. (61-161).

________________. O Papel da memória. (org. Pierre Achard. [ed al]); tradução e introdução José Horta Nunes. Campinas, São Paulo: Pontes, 1999.

POSSENTI, Sírio. Ainda sobre a noção de efeito de sentido. In: Análise do discurso: as materialidades do sentido. (orgs. Maria do Rosário Gregolin e Roberto Baronas). São Paulo: Claraluz, 2001 (45-59).

______________. Discurso, estilo e subjetividade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

Revista Isto É, 16 de outubro/2002 n° 1724. (p. 24).

Revista Isto É, 18 de setembro/2002 nº 1720. (p. 32 a 37)

Revista Isto É, 02 de outubro/ 2002 nº 1722.

Revista Veja Editora, 30 de outubro de 2002 nº 43.

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