ANÁLISE DA IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO - POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO POR ABANDONO DO ADOTADO



ANÁLISE DA IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO - POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO POR ABANDONO DO ADOTADO

Lucas Rodrigues Oliveira

Márcia Laís Soares de Sá

Maryhá Henriques de Morais

MONTES CLAROS – MG

 NOVEMBRO - 2012

ANÁLISE DA IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO - POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO POR ABANDONO DO ADOTADO 

RESUMO

O presente trabalho vem fazer uma análise psicológica e jurídica, pela doutrina e jurisprudência, além de artigos que se referem ao tema aqui tratado. Busca o artigo, analisar o instituto da Adoção e sua irrevogabilidade, discutindo a possibilidade do pagamento de indenização ao adotado devolvido pelos pais adotivos dentre outras consequências desse ato para o menor. Considera para essa análise também, julgados recentes, e o auxílio da Lei 12.010 de 3 de agosto de 2009.

Portanto, este artigo pretende especificamente encontrar prováveis causas que levam os pais a devolverem os filhos adotivos, e expor os efeitos dessa devolução para o menor com a possibilidade de se impor aos responsáveis pelo abandono o pagamento de indenização por danos morais ao adotado. É imprescindível para o desenvolvimento deste artigo o auxílio da psicologia, ciência que estuda o comportamento dos seres humanos. Unindo os aspectos legais à aplicação da psicologia ao ramo do Direito, busca-se com esse estudo especialmente dar atenção ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

 

PALAVRAS-CHAVES:

Adoção, Irrevogabilidade, Psicologia, Direito de família.

 

INTRODUÇÃO

Hoje no Brasil, há milhares de crianças e adolescentes abandonados, que vivem em abrigos à espera de um lar definitivo para viver. Existem também muitas famílias dispostas a adotar essas crianças. Há, entretanto, um rigor e todo um procedimento necessário para que alguém receba a permissão para adotar.

O código Civil de 1916 admitia a prática da adoção somente àquele que não tivesse filhos. Hoje, além de permitir que as famílias tenham a oportunidade de desfrutar da paternidade, a adoção é meio de fazer com que a criança órfã não cresça sem família, devendo prevalecer sempre o melhor interesse da criança e do adolescente. Nesse sentido,

O princípio do melhor interesse, no que se refere à adoção, determina que é mais relevante a felicidade da criança e do adolescente do que a mera situação jurídica alcançada pela verdade registral, desacompanhada de laços de afeto, ou, a adoção que se realiza no interesse exclusivo do adotante, sem alcançar sua verdadeira vocação de prioridade da pessoa em formação. (RIBEIRO, p. 71, 2010).

A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente no ano de 1990 veio garantir além de proteção integral à criança e ao adolescente, o seu direito de ser criado e educado no seio de uma família. O referido dispositivo de lei também dá ao filho adotado os mesmos direitos de filho biológico bem como o total desligamento da família natural, estabelecendo o procedimento necessário para efetuar a adoção.

A Lei 12.010 de 3 de agosto de 2009, a Nova Lei da Adoção, foi criada para trazer algumas modificações relacionadas à adoção tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente como no Código Civil revogando 10 artigos, com o intuito de assegurar da melhor maneira possível o direito da criança à convivência familiar.

A nossa Constituição Federal de 1988 estabelece em seu artigo 227, § 6º que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.

Ao se instaurar o processo para adoção, ocorre uma série de encontros e consultas psicológicas com a família que pretende adotar, para analisar o lar onde o adotado irá se inserir. O promotor e o juiz darão resposta favorável ou não ao procedimento, conforme as informações colhidas pelos psicólogos e assistentes sociais que trabalharam no caso através do Juizado da Infância e Juventude.

O próximo passo para concluir a adoção é o estágio de convivência no qual o juiz concede guarda provisória ao adotante durante um tempo para que o juiz avalie a relação entre o adotante e o adotado nas atividades cotidianas. Se a convivência for satisfatória ao adotado, o pedido de adoção será finalmente deferido.

O processo não é simples, pois durante o procedimento ou até mesmo após ele se efetivar, ocorrem diversas dificuldades que podem trazer prejuízo para o menor adotado e por isso precisam ser solucionadas. Um dos problemas que ocorrem após estar concluído o processo de adoção e a criança ou o adolescente já ter se tornado filho legítimo do adotante, é o arrependimento e o consequente interesse em devolver o adotado.

A adoção, como será detalhada posteriormente neste artigo, é irrevogável. Isso quer dizer que não se pode devolver a criança adotada. Mas infelizmente essa é uma realidade presente no Brasil, pois muitas pessoas que sonham em adotar uma criança, para realizar o desejo de ter filhos ou ter alguém que irá fazer companhia pelo resto da vida, acabam agindo com irresponsabilidade e esquecem que estão se relacionando com seres humanos, provido de defeitos como todos os outros. Por isso, diante de problemas que surgem com a convivência, acabam decidindo devolver o filho adotado.

A nossa legislação não prevê o que fazer nessas situações. Seria possível indenizar o adotado por danos morais decorrentes desse abandono? É necessária uma discussão sobre o problema da devolução do adotado, que pode gerar graves consequências.

IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO

A adoção no ordenamento jurídico brasileiro é ato irrevogável. Ou seja, uma vez concluído, o adotante não pode simplesmente se arrepender do ato e decidir devolver aquele que se tornou filho. O Código de Hammurabi, criado por volta do século XVIII a.C, já reconhecia o Instituto da Adoção e sua irrevogabilidade.

Destaca-se o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves de que a adoção

promove a integração completa do adotado na família do adotante, na qual será recebido na condição de filho, com os mesmos diretos e deveres dos consanguíneos, inclusive sucessórios, desligando-o, definitiva e irrevogavelmente, da família de sangue, salvo para fins de impedimentos para o casamento. (GONÇALVES, p. 402, 2011).

A irrevogabilidade busca proteger os interesses do menor, na medida em que o objetivo da adoção é proporcionar ao adotado a família que ele não teve. O próprio Código Civil de 2002 expõe em seu artigo 1.635, IV que se extingue através da adoção o poder familiar dos pais biológicos passando esse poder a ser exercido pela família substituta. Embora a adoção seja irrevogável, a realidade é que há famílias que devolvem os filhos adotivos fazendo com que eles se sintam novamente abandonados.

O convívio da criança no meio familiar deve ser propício para que ela cresça com dignidade e auxilie no seu desenvolvimento. Por isso é feita uma análise dos adotantes para garantir que a família substituta seja ideal para o adotado.

Adoção não é um ato de caridade e sim de amor, é um ato jurídico que faz originar uma família com todos os direitos e deveres garantidos pelo Código Civil e pela Constituição Federal. Portanto, ao desejar um filho adotado, deve-se ter consciência do principal objetivo do instituto de assegurar através da família, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

ABANDONO DO ADOTADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Importante para discussão do presente tema, destacar o julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que retirou a guarda dos pais que devolveram o filho adotado e os condenou a pagar uma indenização por danos morais, a seguir transcrito:

APELAÇÃO CÍVEL. PODER FAMILIAR. DESTITUIÇÃO. PAIS ADOTIVOS. AÇÃO AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ADOÇÃO DE CASAL DE IRMÃOS BIOLÓGICOS. IRRENUNCIABLIDADE E IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO.” O desembargador entendeu ser irrevogável a adoção. Anotou que no presente caso, os pais decidiram devolver os filhos adotados ao Poder Público por simples arrependimento. Puniu os infratores impondo-lhes indenização por danos imateriais às crianças. A prática de atos que dão ensejo a desconstituição do poder familiar é causadora, por ação ou omissão, de danos imateriais aos infantes (na hipótese, casal de irmãos) que experimentam sofrimentos físicos e morais, decepções e frustrações por não encontrarem um lar substitutivo capaz de proporcionar-lhes amor, harmonia, paz e felicidade. (SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça, Relator: des. Joel Dias Figueira Junior, 2011).

Ao realizar entrevistas e analisar a conduta do candidato a adotante, busca-se entender o comportamento desse indivíduo para que possa assim, prever como será a educação que a criança receberá no novo meio familiar. Somente é possível saber como será a convivência da criança com a nova família após ela vivenciar essa experiência.

Fixar laços de afetividade não é algo que se faz de modo instantâneo, o afeto vem com o tempo, com o convívio. Por isso é fixado pela autoridade judiciária um tempo denominado estágio de convivência para que se conheça profundamente o adotado e depois não se arrependa, e cause novos sofrimentos sociais e psíquicos à criança que viverá novamente a experiência de ser rejeitada.

A rejeição acontece em alguns casos de adoção no Brasil, não porque houve falha na avaliação psicológica do adotante, ou por culpa do adotado. Alguns pais adotivos resolvem devolver o filho para o abrigo de crianças afastadas do convívio familiar por diversos motivos como mau-comportamento, por não ter conseguido se habituar na nova vida ou mesmo por não ter se identificado com a criança.

A criança após fixar-se em uma nova família cria uma grande expectativa, a sensação de finalmente estar protegida e às vezes se apega imediatamente ao novo lar. É natural o desejo de se sentir amada. Toda criança tem o direito de crescer em uma família. O artigo 1º, §1º da Lei 12.010/2009 estabelece que o Estado tem o dever de intervir na proteção da família, orientando-a e apoiando-a para garantir à criança e ao adolescente o direito à convivência familiar.

 

POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO PARA O ADOTADO

Assim que o adotado se torna filho do adotante, este tem o dever de lhe fornecer todo o cuidado necessário para o seu desenvolvimento intelectual e emocional. Se a família, que escolheu o menor e passou por todo o procedimento necessário para ter a certeza de que desejava aquela criança como filha, resolve devolvê-la por qualquer que seja o motivo, ela não estará respeitando os direitos dessa criança garantidos pela lei.

Dessa forma também, o adotante não está cumprindo com sua responsabilidade afetiva e material de pai, adquirida imediatamente quando lhe foi concedida a adoção. Antes de homologar a sentença de adoção, o juiz é convencido pelo adotante de que como pai ele garantiria ao menor tudo o que ele precisa, deixando esclarecida a irrevogabilidade de tal instituto.

Quando pais biológicos abandonam o filho, eles podem perder o poder familiar por não ter cumprido com o dever de cuidado. Pais adotivos que devolvem os filhos estão, portanto, praticando o abandono e devem também perder o poder familiar. Porém, os efeitos patrimoniais como alimentos e herança devem continuar existindo.

Discute-se aqui a possibilidade de indenização por danos morais à criança abandonada pelo pai adotivo. Aquele que decide devolver o filho adotado viola o princípio da dignidade humana uma vez que o menor se sentirá novamente rejeitado, podendo criar em sua mente a ideia de que ninguém nunca irá amá-lo. Isso poderá trazer piores consequências no futuro se não houver um tratamento adequado.

A família, educação, saúde, dentre outros interesses, são direitos assegurados à criança e ao adolescente, por isso eles devem ser protegidos e amparados sempre que precisarem.

O Ministério Público tem competência para promover e acompanhar ações de destituição do poder familiar, bem como qualquer processo que envolva interesses de que cuida o Estatuto da Criança e do Adolescente. Por isso, é dever do referido órgão proteger integralmente a criança e o adolescente para defender seus interesses garantindo que haja reparação, na medida do possível, quando seus direitos forem desrespeitados.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Maria Berenice. OPPERMANN, Mara Cauduro. Adoção e o direito constitucional do afeto. Disponível em:

http://www.mariaberenice.com.br/uploads/ado%E7%E3o_e_o_direito_constitucional_ao_afeto_-_marta.pdf. Acesso em 15 nov. 2012

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro 6. Direito de Família.  São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

PRESOT, Regiane Sousa de Carvalho. A irrevogabilidade da adoção: um direito humano. Revista Internacional Direito e Cidadania. Disponível em: http://reid.org.br/?CONT=00000306. Acesso em 15 nov. 2012.

RIBEIRO, Paulo Hermano Soares. SANTOS, Vívian Cristina Maria. SOUZA, Ionete de Magalhães. Nova Lei de Adoção Comentada. São Paulo: JH Mizuno, 2010.

ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério,

Sanches. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2010.

VICENTE, José Carlos. Adoção – O que é adoção, seus efeitos e formas para se adotar. Disponível em: http://www.pailegal.net/veja-mais/ser-pai/analises/503-adocao-o-que-e-a-adocao-seus-efeitos-e-formas-para-se-adotar. Acesso em: 18 nov. 2012.

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