DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL: os efeitos da aprovação da PEC 341



DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL: os efeitos da aprovação da PEC 341 

Letícia Frota Soares 

RESUMO

 Apresente-se sobre a proposta da PEC 341/2009, discorrendo sobre a importância do direito ambiental como norma fundamental, tal como a violação do princípio do não-retrocesso social, os fundamentos da proposta de emenda e os respectivos efeitos no ordenamento jurídico. 

 PALAVRAS-CHAVE

  Proibição do retrocesso; desconstitucionalização; PEC 341 

INTRODUÇÃO                             

A PEC 341 é uma proposta do Deputado Regis de Oliveira para reduzir sessenta e um artigos que julga ser desnecessária a localização destes na constituição, seria um meio de adotar a forma sintética semelhante às Constituições de países como os Estados Unidos, em busca de uma suposta estabilidade. Nessa redução de artigos estaria entre o rol dos escolhidos o art. 225 que trata da questão ambiental, inserido na Constituição de 1988.

Essa proposta fere os princípios basilares para o nosso Estado Democrático de Direito, por acabar com os artigos inseridos na Carta Magna de 88, uma conquista para nossa sociedade.

 

1 O DIREITO AMBIENTAL COMO DIREITO FUNDAMENTAL

A realidade mundial pós-guerra, em que os países foram divididos em desenvolvidos e subdesenvolvidos, forçou o homem a reconhecer uma nova categoria de direitos tidos como essenciais a sua sobrevivência. Na visão de Karel Vasak, os chamados direitos de fraternidade que têm por destinatário o gênero humano compreendido no contexto universal, ou seja, não mais restrito àqueles garantidos ao indivíduo ou a uma sociedade de um determinado Estado. Abrange a proteção a direitos que têm por tema a paz, a comunicação, o patrimônio comum da humanidade e o meio ambiente.

A Carta Magna de 1988, pela primeira vez na história, abordou o tema meio ambiente, que “é um dos mais importantes e avançados da Constituição” (SILVA, 2001, p.819), antes protegido somente em nível de norma infraconstitucional. O tema não se restringe ao art. 225, CF, estando consagrado ao longo de toda a carta de forma implícita ou não, inclusive na parte referente a direitos e garantias fundamentais (art. 5º: XXIII; LXXI; LXXIII), além de ser pressuposto que assegura o Direito fundamental à vida, demonstrando a importância de sua proteção e intangibilidade.

[...] o objeto de proteção do meio ambiente, localizado no epicentro dos direitos humanos, deve ser levado em consideração toda vez que uma política, atuação, legislação, sobre qualquer tema, atividade, obra, etc. tiver que ser criada e desenvolvida. Isso porque, na medida em que possui como ponto cardeal de tutela constitucional a vida e a qualidade de vida, tudo que se pretende fazer, criar ou desenvolver deve antes passar por uma consulta ambiental, enfim, para saber se há ou não a possibilidade de que o meio ambiente seja degradado.[1]

Há quem defenda que os direitos fundamentais devem ser vistos de maneira estrita, sob pena de se deturpar a verdadeira natureza desses direitos e criar infinitas reivindicações.

[...] como não ver que o intervencionismo do Estado-providência em todos os campos aniquila a autonomia das vontades, ou seja, a responsabilidade dos sujeitos de direito? Não será um sofisma reclamar tudo do Estado, quando se pretende promover o respeito à dignidade própria da pessoa humana? Ademais, a proliferação [exagerada] dos “direitos” provoca a sua desvalorização, de sorte que, se tudo é direito, nada mais é direito. [2]

Nesse diapasão, entende-se que o direito ambiental tem caráter relativo, podendo ser legislado por norma infraconstitucional sem prejuízo do mesmo.                                                      

 2 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL

 Existe o entendimento de que a limitação do constituinte reformador não se restringe às cláusulas pétreas, podendo a proteção rígida ser estendida a outros direitos como o caso do direito ambiental. Trata-se de um princípio implícito na Constituição, o da proibição do retrocesso social, que tem como escopo garantir a segurança jurídica tão primada no Estado Democrático de Direito. E nesses termos, o Tribunal Constitucional português já reconheceu a existência de tal princípio.

[...] a partir do momento em que o Estado cumpre (total ou parcialmente) as tarefas constitucionalmente impostas para realizar um direito social, o respeito constitucional deste deixa de consistir (ou deixa e consistir apenas) numa obrigação positiva, para se transformar ou passar também a ser uma obrigação negativa. O Estado, que estava obrigado a atuar para dar satisfação ao direito social, passa a estar obrigado a abster-se de atentar contra a realização dada ao direito social. (Acórdão n. 39/84 do Tribunal Constitucional da República Portuguesa) [3]

 Ele estabelece que as conquistas de garantias alcançadas progressivamente com a evolução da sociedade mereçam proteção, impondo a abstenção de medidas estatais arbitrárias que tentarem aboli-las, e assim manter a estabilidade desses direitos e atribuindo-lhes caráter de intangibilidade e irredutibilidade, de forma que só poderão sofrer modificação na soberania de outra constituição.

Não obstante, tal proteção não pode ser vista de modo absoluto, sob pena de ferir o direito a defesa que podem ser restringidos pelo legislador. Dessa forma, admite-se que em tempos de crise e em casos excepcionais possa haver uma relativização desse princípio.

 3 OS FUNDAMENTOS DA PROPOSTA DA PEC 341

 O propósito de criar uma constituição sintética se funda na desnecessidade de a atual constituição permanecer programática, uma vez que se cessaram os motivos que a justificaram no momento de sua feitura. E que a forma escolhida pelo legislador constituinte, na assembléia de 1987/1988, foi fruto da recente saída de uma ditadura, onde na época restavam receios de que as mudanças governamentais pudessem refletir na perda de direitos já adquiridos pelas instituições sociais.

Justifica-se, outrora, a imensidão de dispositivos insertos no texto do diploma político para que fossem assegurados os direitos, diante das ondas de agressão de ditaduras e poderes tirânicos que sacrificam as pessoas. Nas modernas democracias, os poderes já se encontram razoavelmente consolidados.[4]

 Nessa concepção, existe o entendimento de que a carta magna deve ser constituída apenas de princípios, caso contrário ter-se-ia a mitigação de diversos dispositivos de caráter relativo e como decorrência criar-se-ia uma situação de desestabilidade e insegurança jurídica.

 4 OS EFEITOS DA DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO

 O mundo vem sofrendo de modo geral com a questão ambiental, este é um problema que gera preocupação com as presentes e futuras geração, mesmo não estando inserido no capitulo dos direitos fundamentais, esta já é uma questão que pode estar ligado como o direito a vida, pois como poderíamos viver num mundo sem o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Ora, só temos eficácia no direito ambiental por este estar resguardado no Art. 225 da Constituição Federal e ainda sim é regido por normas infraconstitucionais que dão eficácia no direito ambiental. Pense que, se não fosse ainda a rigidez constitucional que abrange nossos direitos que não podem serem violados seria um desrespeito com o povo brasileiro pela a conquista social alcançada diante de várias reformas constitucionais.

A PEC seria inconstitucional por violar os direitos assegurados por nossa Carta Magna de 1988, Os direitos elencados no Art. 5 não seriam “enxugados”, por se tratar de direito fundamentais e alguns artigos serem assegurados pela as cláusulas pétreas. Mas o fundamental vem sofrendo com o passar dos anos, a realidade do planeta vem piorando a cada dia, a rigidez ambiental que deveria ter sido introduzida em Constituições anteriores vem a ser pela primeira vez assegurada na nossa Constituição vigente.

As normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Compreendeu que ele é um valor preponderante, que há de estar acima de quaisquer considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as de iniciativa privada [...] estes não podem primar sobre o direito fundamental a vida, que estar em jogo quando se discute a tutela da qualidade do meio ambiente, que é instrumental no sentido de que o que se protege é um valor maior: a qualidade de vida.[5]

Desconstitucionalizar o Art. 225, não seria uma segurança no nosso ordenamento jurídico, seria uma violação ao princípio do não-retrocesso que garante que essa segurança seja efetivada. A PEC não beneficiária os cidadãos brasileiro em geral, e sim viria de uma forma trazer vantagens para as classes mais favorecidas e um grande prejuízo para a nossa nação que sofreria com as conseqüências da desconstitucionalização. 

 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Diante da proposta da PEC 341/2009, a desconstitucionalização do direito ambiental, feriria o princípio do não-retrocesso social, que assegura os direitos alcançados na vigente Carta Magna de 1988. Excluindo o direito almejado no artigo 225 que pode ser visto diante da nação mundial como direito fundamental, garantidor na qualidade de vida de modo geral.

Essa emenda não seria uma proposta eficiente e não surtiria os efeitos almejados pelo legislador, uma vez que a própria Constituição necessita de normas infraconstitucionais para a complementação de seus textos.

Falar da desconstitucionalização do direito ambiental, seria um desrespeito com a humanidade e com o direito a vida, uma vez que o respeito a dignidade da vida necessita do meio ambiente ecologicamente equilibrado e as normas infraconstitucionais não teria a eficácia suficiente para a nossa segurança jurídica.

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2006.

 FIORILO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental. - 10. ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2009.

 GOYARD-FABRE, Simone. Os Princípios filosóficos do direito político moderno.  São Paulo: Martins Fontes, 1999.

 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise. 3. ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2001.

 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição federal comentada e legislação constitucional. – 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.


[1] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2009, p.55.

[2] GOYARD-FABRE, Simone. Os Princípios filosóficos do direito político moderno.  São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 337

[3] STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise. 3. ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 55.

[4] Deputado RÉGIS DE OLIVEIRA, PEC 341/2009.

[5] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 821


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