CONDOMÍNIO EDILÍCIO: Os deveres dos condôminos e as sanções a que se sujeitam



CONDOMÍNIO EDILÍCIO: Os deveres dos condôminos e as sanções a que se sujeitam

Letícia Frota Soares           

SUMÁRIO: Introdução; 1. Dos deveres dos condôminos e das sanções; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

 O condomínio edilício se caracteriza pela existência de uma propriedade privativa e uma de uso comum. Dessa forma, cada condômino é proprietário de uma parte autônoma e, junto com os demais proprietários, das áreas comuns. Por ser uma propriedade coletiva, os condôminos devem seguir regras de convivência, que possibilitam a existência pacífica da estrutura condominial.

As obrigações dos condôminos estão especificadas de forma taxativa no Código Civil de 2002, nos incisos I ao IV do artigo 1336. As sanções, por sua vez, encontram-se nos parágrafos 1º e 2º do referido artigo. Além disso, tal matéria também é regulada de forma subsidiária pela Lei 4.591 de 1964, por meio dos artigos que não sofreram revogação pelo novo Código Civil. As referidas obrigações são de natureza propter rem, porque acompanham a coisa independente de eventual mudança de seu titular.

 1 DOS DEVERES DOS CONDÔMINOS E DAS SANÇÕES

 O primeiro dos deveres do condômino consiste em “contribuir para as despesas do condomínio na proporção de suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção”. Trata-se de uma obrigação positiva em que o condômino deve cumprir com sua parcela nas despesas condominiais, enquanto tiver a coisa.

Com o advento da Lei 10.931/2004, que alterou o teor dessa obrigação, houve a possibilidade de fixar-se contribuição diversa da proporção das frações ideais. Destarte, pode-se usar como base de cálculo o número de pessoas que utilizam a unidade ou “atribuir um valor determinado para cada andar, com os superiores valendo mais, ou menos, conforme o prédio tenha, ou não, elevador; depois, dentro de cada andar, atribui-se valor maior aos apartamentos ‘de frente’ que aos ‘de fundo’” (RODRIGUES, 2009, p. 224).

Tais despesas se destinam à conservação do edifício ou realização de serviços comuns no mesmo. Os valores que extrapolarem as despesas de uma administração comum, como o caso das despesas extraordinárias, relacionadas no artigo 22 da Lei do Inquilinato, devem ser postos em votação na assembleia extraordinária ou especial (COELHO, 2006, p. 30). Caso sejam relativas a despesas urgentes, a aprovação poderá ser posterior.

A referida obrigação tem natureza de ônus real, dessa forma “não pode o adquirente da coisa eximir-se do pagamento de despesas relativas a período anterior à transferência da unidade” (LOPES, 2003, p. 94), e nesses termos prescreve o artigo 1.345 do Código Civil: “O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”.

Segundo o artigo 12 da Lei 4.591/1964, o adimplemento da obrigação pode ser exigido, inclusive, em face do promissário comprador, e nesse sentido tem-se decidido: “Despesas condominiais. Ação de cobrança. Demanda que pode ser proposta tanto em face do proprietário, quanto do compromissário comprador” (2º TACSP, RT, 808/297). As despesas extraordinárias, contudo, são obrigações exclusivas do locador, conforme o artigo 22, X, da Lei do Inquilinato.

O novo Código Civil provocou uma diminuição considerável nas multas, em caso de inadimplemento das despesas. Assim, a multa que antes era de vinte por cento foi reduzida para dois por cento. Essa medida foi bastante criticada pela doutrina, pois incentivou o inadimplemento[1], ensejou insegurança tanto para as administradoras quanto para os demais condôminos que cumprem suas obrigações em dia.  “Essa porcentagem ridícula é piegas e demagógica, para dizer o mínimo, e retrata que, de última hora, foram inseridas disposições em um Código Civil que não honram nossa tradição do passado” (VENOSA, 2007, p. 333).

Contudo, a multa pelo não pagamento deve ser aquela prevista na convenção dos condomínios já existentes “por serem atos jurídicos perfeitos e não se tratarem de normas de ordem pública” (MALUF e MARQUES, 2009, p. 87). Nesse sentido, já se decidiu: “Aplica-se sobre o débito a multa de 20%, como previsto na legislação de regência da época. Todavia para as prestações devidas após a entrada em vigor, aplica-se a multa de 2% prevista no art. 1336 do novo Código” (STJ-Resp 7722.904 – 3ª Turma, Rel. Min. Menezes Direito – DJU 20/06/2005)

O inciso II do artigo 1336, do código Civil, determina ser obrigação do condômino “não realizar obras que comprometam a segurança da edificação”. A obrigação negativa impede a prática de ato que ameace a segurança do edifício ou prejudique sua higiene e limpeza, ou ainda, qualquer obra que impeça a utilização das partes comuns pelos demais condôminos, como exemplo, fechar parte do corredor para utilização pessoal. Como consequência dessa vedação, tem-se a inadmissibilidade da usucapião das partes comuns do edifício.

No inciso III do mesmo artigo, encontra-se a obrigação de “não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrilhas externas”. Também obrigação negativa, visa manter a harmonia estética do edifício, pois “embora formados de apartamentos autônomos como propriedade individual de cada condômino e sem perder esta qualidade, se apresenta como um todo ou como unidade externa inconfundível com outro” (PEREIRA, 1999, p. 155).

É, então, proibido qualquer alteração nociva que modifique o perfil originário da fachada. Porém, há limite para essa proibição, qual seja o interesse coletivo. Sendo assim, caso nãoi venha a afetar a segurança geral do imóvel e não infringir as cláusulas da convenção, é lícito ao condômino fazer as modificações que lhe aprouver, como a colocação de grades ou redes de proteção nas janelas, o envidraçamento de sacadas, colocação de exaustores e aparelhos de ar-condicionado. Por ausência de disposição expressa sobre o tema no Código Civil, ainda é aplicável o artigo 10, § 2º, da Lei 4.591/1964, que exige a aquiescência da unanimidade dos condôminos para a modificação da fachada.

Finalmente, o inciso IV diz que o condômino deve “dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes”. A última das obrigações negativas impede o uso do condomínio de maneira diversa da estabelecida na convenção, seja ele residencial, não residencial, ou misto. Dessa maneira, se for residencial, não será permitida a existência de escritórios, lojas.

O mesmo dispositivo proíbe ainda que os condôminos adotem comportamentos que vão de encontro a moral da sociedade, porém, respeitando as escolhas e individualidades das pessoas, de forma que não fere os bons costumes o fato de um condômino se homossexual, divorciado, separado.

Caso o condômino não observe as determinações previstas no artigo 1336, II a IV, do Código Civil, é cabível multa de até o quíntuplo do valor da contribuição mensal devida ao condomínio. Se o condômino apresentar reiterado comportamento antissocial, poderá pagar multa de até o décuplo do valor estipulado para as contribuições condominiais.

É discutida na doutrina a possibilidade de expulsão de um condômino. Para Venosa (op cit, p. 336), essa medida é cabível em situações extremas, pois o direito de propriedade deve se sujeitar à função social do imóvel. De maneira diversa, Maluf (op cit, p. 108) entende que “esse tipo de reprimenda poderia infringir normas constitucionais que regulam os direito individuais, tornando-as, portanto, inócuas”.    

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Grande parte das obrigações condominiais está relacionada com a área econômica dos condomínios. Isso porque um condomínio enseja uma série de gastos, que devem ser saldados através de rateio proporcional. O escopo das normas condominiais é evitar a sobrecarga de alguns condomínios, em favor dos demais. Assim, são previstas sanções a fim de compelir esse tipo de situação.

Outras obrigações se relacionam à manutenção e harmonia da unidade, assegurando o bem-estar dos moradores e evitando a desvalorização do imóvel. De fato, a depreciação do edifício faz diminuir o valor imobiliário das unidades autônomas, e, consequentemente, causaria prejuízos a seus proprietários.

A vida em condomínio deve ser agradável e harmônica. Por isso, existem obrigações que visam garantir o bom convívio entre os moradores, seus dependentes, visitantes e todos os frequentadores do condomínio. Os condôminos devem ter sua privacidade preservada, entretanto, não se pode esquecer que devido a proximidade característica desse tipo de moradia impõe certas limitações às liberdades individuais, necessárias à convivência pacífica.

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS

 

COELHO, José Fernando Luiz. Condomínio edilício: teoria e prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

 FERREIRA, Rui Barbosa Marinho. Condomínio em edificações e incorporações imobiliárias. 12. ed. São Paulo: Edijur, 2004.

 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LOPES, João Batista. Condomínio. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

MALUF, Carlos Alberto Dabus; MARQUES, Márcio Antero Motta Ramos. O condomínio edilício no novo Código Civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínios e incorporações. 10. ed. Rio de Janeiro: 1999.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das coisas. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007.


[1] Segundo o IPEMIC (índice periódico de inadimplência condominial) a taxa de inadimplência aumentou em 30% após o advento da lei que reduziu o valor da multa.  


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