LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR: Imunidade Cultural



LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR: Imunidade Cultural[1]

 

Antonio Luiz Ewerton Ramos Neto

Guilherme Evangelista de Menezes[2]

Fabiano Ferreira Lopes [3]

 

Sumário: Introdução; 1 Limitações Constitucionais ao poder de tributar ; 2 Imunidades x Isenções; 3 Imunidade Cultural ; 3.1 Imunidades culturais no âmbito do TJ-MA;    Considerações Finais.

 

 

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo explanar acerca das limitações ao poder de tributar presente na Constituição Federal, através de seus artigos 150 a 152, não deixando de abordar sobre os importantes princípios fundamentais do Direito Constitucional Tributário, presente nos mesmos. Após tal introdução será elucidado a respeito da diferença existente entre imunidades e isenções, não deixando de discorrer sobre a imunidade da alínea d, imunidade cultural, de “livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão”. Por fim será visto o âmbito de incidência das imunidades culturais, na seara dos Tribunais Superiores.

PALAVRAS-CHAVE

Poder de Tributar; Isenção; Imunidade Cultural;

 

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo demonstrar o que vem a ser imunidade tributária destinada aos livros, revistas e jornais, bem como o papel destinado a sua impressão (artigo 150, VI, “d”, da Constituição Federal), não deixando de abordar, através de jurisprudências e doutrinas, que tal imunidade pode ser estendida para os livros eletrônicos, mídias digitais e outros instrumentos virtuais.

Nesse sentido buscou-se analisar primeiro as limitações constitucionais ao poder de tributar, mencionando o que vinha a ser competência tributaria, explanado que tal competência não é de caráter absoluto e que por isso existe as limitações a esse poder de tributar, inerente aos entes federados, elencando de forma taxativa os princípios basilares e outros imunidades referente a esta limitação.

Em seguida, foi feita uma distinção conceitual e fática entre os termos imunidades e isenções, abordando que por mais que sejam conceitos jurídicos parecidos, tem suas diferenças relevantes, sendo que, por fim, foi aprofundado a respeito do que viria a ser imunidade e isenção, não deixando de mencionar suas diferenças. 

Posteriormente procurou-se definir e compreender o conceito de imunidade cultural presente no artigo 150, VI, “d”, da Constituição Federal, elencando o que seriam livros, jornais, periódicos e o papel destinado à impressão, explanando a respeito de cada um e da incidência da imunidade sobre estes objetos, não deixando de mencionar a respeito dos livros e periódicos que se utilizam das mídias eletrônicas, falando se tais meios de informações seriam contemplados por tais imunidades. Ainda, por fim, mencionando o posicionamento do STF a respeito desta celeuma.

Derradeiramente foi abordado o âmbito de incidência da imunidade cultural nos tribunais do Estado do Maranhão, enfatizando se estes magistrados estão decidindo de acordo com o entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante no território brasileiro. Vale apartar que foram destacadas jurisprudências que melhor exemplificavam o entendimento dos tribunais do Maranhão, não deixando de fazer a devida correlação com o que é decidido pelos órgãos superiores e outros magistrados.

 

1 LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR

O Estado, no exercício da sua soberania, tem o dever de exigir dos seus indivíduos os tributos como forma de custear as despesas coletivas (SABBAG, 2012, p.377). A Constituição Federal de 1988 outorgou, em seu artigo 145, a União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal o poder de instituir determinados tributos como impostos, taxas e contribuições de melhoria.

De acordo com Luciano Amaro (2008, p.93):

A competência tributária é a aptidão de criar tributos (...) O poder de criar tributos é repartido entre os vários entes políticos, de modo que cada um tem competência para impor prestações tributárias , dentro da esfera que lhe é assinalada pela Constituição.

Todavia tal soberania não é absoluta, uma vez que a própria Carta Magna, em seu artigo 150, limitou o Poder de tributar dos entes públicos. Vale ressaltar que as limitações ao poder de tributar têm como base dois importantes aspectos: os princípios e as imunidades. Vem para corroborara essa ideia o STF, entendendo que as imunidades e os princípios são limitações constitucionais ao poder de tributar, ganhando a estrutura de cláusulas pétreas (art. 60, § 4º, IV, CF) (SABBAG, 2012, p.286).

Vale ressaltar que a Constituição não restringiu a atuação de outros tipos normativos (lei complementar, resoluções do Senado, convênios), já que tais mecanismos vêm para balizar o poder do legislador tributário no que diz respeito à criação ou modificação de tributos, o que denota que os limites da competência tributária não se restringem somente aos que estão expressos no texto constitucional (AMARO, 2011, p. 128).

Visto isso, limitação ao poder de tributar pode ser analisada como toda e qualquer restrição que é imposta pelo sistema jurídico às entidades dotadas desse poder (MACHADO, 2011, p.276). Já para Luciano Amara (2011, p.129),

as chamadas “limitações ao poder de tributar” integram o conjunto de traços que demarcam o campo, o modo, a forma e a intensidade da atuação do poder de tributar (ou seja, do poder, que emana da Constituição, de os entes políticos criarem tributos).

Como dito acima a Constituição ela não veda a limitação ao poder de tributar somente a sua competência, deixando em aberto pra que outros tipos normativos possam atuar nesta seara. Tais normas de menor rigidez atuam com o objetivo de complementar a norma constitucional, visando definir o modo pelo qual se deve dar esse exercício (AMARO, 2011, p. 131).

Por fim pode-se entender limitações ao poder de tributar, em sentido estrito, como conjunto de normas estabelecida pela Carta Magna, em seus artigos 150 a 152, nas quais residem princípios fundamentais do direito tributário como, legalidade (art. 150, I); isonomia (art. 150, II); irretroatividade (art. 150, III, “a”); anterioridade (art. 150, III, “b”); proibição de confisco (art. 150, I art. 150, IV); liberdade de tráfego (art. 150, V); imunidades (art. 150, VI); outras limitações (arts. 151 e 152) (MACHADO, 2011, p. 277). Tais princípios não serão aprofundados, pois não fazem parte do recorte do trabalho, todavia será explanado ademais a respeito das imunidades, se restringindo mais a imunidade cultural.

2 IMUNIDADES X ISENÇÕES

Imunidades e isenções são institutos que possuem uma similitude entre eles muito grande, sendo que aos olhos de uma pessoa leiga podem ser vistas como sinônimos. Todavia apesar de tais similitudes “são categorias jurídicas distintas, que não se interpenetram, mantendo qualquer tipo de relacionamento no processo de derivação ou de fundamentação, a não ser em termos muito oblíquos e indiretos” (CARVALHO, 2012, p.239).

Como forma de corroborar o que foi dito acima, Paulo de Barros Carvalho (2012, p. 239) entende da seguinte forma:

O paralelo [entre imunidade e isenção] não se justifica. São proposições normativas de tal modo diferentes na composição do ordenamento positivo que pouquíssimas são as regiões de contacto.  Poderíamos sublinhar tão somente três sinais comuns: a circunstância de serem normas jurídicas válidas no sistema; integrarem a classe das regras de estrutura; e tratarem de matéria tributária. Quanto ao mais, uma distância abissal separa as duas espécies de unidades normativas (grifo nosso).

 E linhas gerais a imunidade exerce uma função de colaborar, de uma forma especial, no desenho das competências impositivas, sendo, pois, normas constitucionais que não cuidam da problemática da incidência, e que atuam na lógica do sistema, ao momento da percussão tributária. Já a isenção se dá no plano da legislação ordinária, tem como sua dinâmica a pressuposição de um encontro normativo, em que a regra de isenção, atua como expediente reducente do campo de abrangência dos critérios, da hipótese ou da consequência, da regra-matriz do tributo (CARVALHO, 2010, p. 237).

Visto isso fica claro que apesar de serem conceitos jurídicos que possuem uma similitude, Luciano Amaro adverte (2011, p. 175) que: “basicamente, a diferença entre a imunidade e a isenção está em que a primeira atua no plano da definição da competência, e a segunda opera no plano do exercício da competência”. Como forma de complementar o que foi dito, José Cassiano Borges e Maria Lúcia Américo dos Reis (2008, p. 29) defendem que a imunidade vai mais a adiante do que a isenção, pois se estabelece sobre o plano da competência para instituir tributos, vedando que essa competência seja exercida, sendo importante frisar que a imunidade decorre de uma norma constitucional, ao passo que a isenção resulta de uma lei ordinária, ou seja, hierarquicamente inferior à Constituição.

Após tal explana superficial dos institutos jurídicos de imunidade e isenção, mostrando que não são a mesma coisa, será aprofundado mais cada instituto separadamente.

Imunidade, segundo os ensinamentos de Luciano Amaro (2011, p. 174) é “a qualidade da situação que não pode ser atingida pelo tributo, em razão de norma constitucional que, à vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do campo sobre que é autorizada a instituição do tributo”. Já para professora Regina Helena Costa (2009, p.80):

{...} Imunidade tributária, então, pode ser definida como a exoneração, fixada constitucionalmente de competência ou extraível, necessariamente, de um ou mais princípios constitucionais, que confere direito publico subjetivo a certas pessoas, nos termos por ele delimitados, de não se sujeitarem à tributação.

Com isso pode-se dizer que a isenção é uma situação na qual o tributo não recai sobre determinado produto em uma determinada situação por ordem constitucional. Já de acordo com os ensinamentos do professor Paulo de Barros Carvalho, que traz um entendimento semelhante, as imunidades (2010, p. 234):

compreendem uma classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas [...] que estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno [entes tributantes] para expedir regras instituidoras de tributos [fatos geradores].

Neste contexto, as imunidades se mostram com uma clausula excludente da obrigação tributária, ou seja, expulsa, automaticamente a possibilidade de surgimento do vínculo obrigacional tributário como consequência dos ditos fatos no mundo jurídico (CERQUINHO, 1983, p.205).

Neste diapasão, as imunidades nada mais fazem do que fixar campos de incompetência do legislador para a instituição de tributos (sejam estes impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios ou contribuições especiais) (CARRAZZA, 2010, p. 749), devendo o legislador infraconstitucional estipular tributos respeitando tanto as competências previstas na Constituição quanto as limitações.

Já no que tange as isenções, elas são um “tributo devido porque existe obrigação, mas a lei dispensa o seu pagamento. Por conseguinte a isenção  pressupõe a incidência porque é claro que só se pode dispensar o pagamento de um tributo que seja efetivamente devido” (SOUZA, 1960. p. 75-76).

As isenções são sempre decorrentes de lei, que especifica as condições e os requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e sendo o caso, o prazo de duração (art.176, CTN). Ela pode ser restrita a uma determinada área do território da entidade tributante (art.176, parágrafo único do CTN) e em regra não se aplica às taxas e contribuições de melhoria, nem aos tributos criados depois de sua concessão, todavia a lei pode determinar ao contrário (art.177, CTN). As regras de isenção devem ser interpretadas literalmente não podendo haver interpretação ampliativa (art. 111, CTN).

Pode a isenção ser concebida em caráter geral ou especifico, sendo que na primeira hipótese, decorre diretamente de lei, não precisando de requerimento do interessado nem de qualquer ato administrativo. Já na segunda hipótese, a isenção se efetiva mediante despacho da autoridade administrativa em requerimento do interessado, com o qual se comprove o preenchimento das condições e requisitos previstos em lei (MACHADO, 2006, p. 245).

Para Roque Antonio Carrazza (2010, p. 907): “Como vemos, a isenção tributária encontra fundamento na falta de capacidade econômica do beneficiário ou nos objetivos de utilidade geral ou de oportunidade política que o Estado pretende venham alcançados”.

De uma forma ou de outra, a isenção não deve fazer distinção entre os seus beneficiários, sendo este não deve ser um determinado sujeito passivo, mas toda uma coletividade. Tal ideia esta de acordo com os ensinamentos de Edgard Neves da Silva (2010, p. 312):

[...] não deve ser concedida isenção a determinada pessoa, mas, sim, por igualdade e interesse geral, a todas aquelas que preencherem os requisitos e condições legais. [...] Como a regra básica da tributação está calcada na universalidade, ou seja, todos devem pagar tributos, em havendo a desoneração de alguns [tributos] pela isenção, entendem a doutrina e a lei brasileira expressamente – CTN, art. 11119 – que, ao interpretar a norma isentiva, deve o intérprete fazê-lo literalmente, isto é, de forma restritiva, para que o menor número possível de pessoas se exclua da obrigatoriedade de contribuir para o Estado em suas despesas.

Assim, as isenções podem ser caracterizadas como tributos devidos, todavia dispensados de serem pagos pelo individuo, também por ordem constitucional e seguindo determinados requisitos que já foram falados acima.

 Por fim como síntese, para diferenciá-las (imunidades e isenções) tem o preceito de Brito Machado (2009, p.230), no qual:

A Isenção é exceção feita por lei à regra jurídica de tributação enquanto à Imunidade é o obstáculo criado por uma norma de constituição que impede a incidência de lei ordinária de tributação sobre determinada fato, ou em detrimento de determinada pessoa, ou categoria de pessoas.

 

3 IMUNIDADE CULTURAL

A Constituição Federal em seu art. 150, VI, dispõe sobre as imunidades tributárias, vedando a mesma à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios em alguns casos ali exemplificados, mas não exauridos (AMARO, 2011, p. 127-128). Em específico na alínea “d”, encontramos as referentes aos “livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão”.

Segundo Eduardo Sabbag (2012, p. 364) “a presente norma desonerativa justifica-se, axiologicamente, na proteção da livre manifestação de pensamento e de expressão da atividade intelectual, artística e científica; da livre comunicação e do irrestrito acesso à informação [...]”, sendo assim, tal garantia é essencial e de suma importância para o direito à educação que deve ser fomentado ao máximo para o desenvolvimento social. Assim, umas das fórmulas que é usada, e muito bem, foi a de “vedar a cobrança de qualquer imposto sobre o livro, o jornal, o periódico e o papel de imprensa” (CARRAZZA, 2007, p. 761).

Conforme Eduardo Sabbag (2012, p. 363-364), diferentemente das alíneas anteriores, sejam elas “a”, “b” e “c”, que possuem imunidades subjetivas, a imunidade de imprensa, presente na alínea “d” possui natureza objetiva, ou seja, atingem bens ou coisas (livros, jornais, periódicos e o papel destinado à impressão), sendo os três primeiros veículos de pensamento e o último um insumo. Estas imunidades objetivas ou reais foram instituídas em favor de fatos ou bens importantes para o melhor desenvolvimento da sociedade, assim, referem-se aos impostos reais por exemplo: ICMS, IPI, II e IE, devendo os demais impostos incidirem normalmente.

Não restam dúvidas que o livro físico é objeto de tal imunidade, entretanto faz-se necessário também, segundo Carrazza, (2007, p.761-762), estender tal louvável imunidade, aos “veículos de ideias”, que hoje lhes representam também como, livros eletrônicos, CD-ROMS, filmes e etc., devendo a palavra “livro” do texto constitucional ser entendida não de maneira restrita, mas sim ampla, pois o fim de tal ato seria a “difusão cultural de ideias” a “divulgação do conhecimento”.

Nesta questão faz-se necessário ainda dizer que não são todos os livros abrangidos por tal imunidade, devem ser entendido apenas aqueles que representam “veículos de pensamento”, ou seja, difundem ideias, informação e conhecimento. Assim, não serão alcançados os “livros pautados para escrituração e fins análogos”, simplesmente por que não estão ligados ao conhecimento, mas sim, ao mero registro de fatos econômicos, os diários, o livro de ponto, o livro de inscrição da dívida pública, o livro de bordo, o livro de atas e etc.. Conclui-se assim que, não é a forma que torna o livro imune a tributação, mas sim o fim a que o livro se destina, não importando a capa, quantidade de páginas, título. Tais considerações também incluem e estendem-se aos jornais e periódicos (CARRAZZA, 2007, p. 765-769).

Quanto aos insumos, o papel é único descrito no art. 150, VI, “d”, como protegido. A norma neste sentido, não resta dúvida, deveria ter sido mais abrangente e enquadrar em tal isenção, igualmente a tinta, as máquinas e produtos diversos utilizados, claro, para a produção destes “veículos de pensamento”. Certos tribunais abraçam tal causa e entendem a necessidade do alcance de tal imunidade, sobre o fundamento de que tais insumos são imprescindíveis para a publicação dos livros, jornais e periódicos, amplamente defendidos para a educação. Entretanto, o STF por vez, não corrobora com tal entendimento, mantendo-se fiel ao texto constitucional em sua literalidade, interpretando de maneira restritiva, infelizmente, tal alínea (SABBAG, 2012, p. 373).

Em consonância a isto, temos Roque Antonio Carrazza (2007, p. 774-775) que defende que tal interpretação deve ser entendida de maneira ampla, não se restringindo apenas ao papel, já que o fato da carta constitucional apenas referir-se a ele, se dá a razões puramente históricas. Devendo as redações da lei, serem interpretadas para o caso concreto e atual de avanço histórico que nos encontramos.

Aos jornais, que visam trazer notícias e informações aos seus leitores, também encontram-se defendidos no art. 150, VI, “d”. Para Sabbag (2012, p. 370), tal regra imunizante referir-se-ia apenas à mídia considerada escrita, e não aos jornais televisivos. Vale ressaltar que a imunidade não se enquadraria, ocorrendo norma incidental tributária, as propagandas em encartes, pois as mesmas não tutelam o direito aqui defendido, qual seja a educação, conhecimento e cultura.

Aos periódicos, referem-se às revistas e aos álbuns, com ou sem frequência, “o legislador não distingue os tipos de revista, considerando merecedoras da proteção imunizante até mesmo as revistas de pouco conteúdo intelectual” (SABBAG, 2012, p. 371). De outro lado, como exposto acima, não podem ser objeto de tal imunização propagandas, pois não vinculam de nenhuma maneira o conhecimento, educação ou cultura (SABBAG, 2012, p. 371-373).

Infere-se então que “a imunidade tributária dos livros, jornais e periódicos é ancilar da liberdade de opinião e de informação, devendo abranger todas as formas de transmissão e difusão de qualquer forma de conhecimento” (SABBAG, 2012, p. 372-373).

 

3.1 Imunidades culturais no âmbito do TJ-MA

Como já exposto acima, a imunidade do art. 150, VI, d da CF/88, refere-se aos livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão, devendo tal artigo ser interpretado de maneira ampla, como defende a doutrina mais recente. Partindo de tal ideal defendido, atina-se que as decisões do TJ-MA, estão de acordo com o entendimento atual. A ementa a seguir evidencia por unanimidade, do relator Marcelo Carvalho Silva, tal conclusão:

DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA, CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 150, VI, D, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONTEMPLAÇÃO DE LIVROS INSERIDOS EM MÍDIAS DIGITAIS. APLICAÇÃO DA TEORIA DA MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL. NECESSIDADE DE ADAPTAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL À REALIDADE VIGENTE. AÇÃO PROCEDENTE. I - A atual definição de livro, no direito positivo brasileiro, encontra-se defasada em relação à realidade vigente, porque vincula intrinsecamente o conteúdo ao papel, ao meio físico, com detrimento do chamado livro eletrônico, sendo destoante, portanto, do progresso científico e tecnológico hoje vivenciado. II - "Denomina-se mutação constitucional o processo informal de mudança da constituição, por meio do qual são atribuídos novos sentidos, conteúdos até então não res­saltados à letra da constituição, quer através da interpretação, em suas diversas modalida­des e métodos, quer por intermédio da construção (construction), bem como dos usos e dos costumes constitucionais" (UADI LAMMÊGO BULOS, Constituição Federal Anotada. 4a ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 22). III - Apesar do entendimento do STF, estende este Tribunal de Justiça que a imunidade tributária do art. 150, VI, d, da Constituição Federal, contempla os livros eletrônicos, inexistindo, em consequência, relação jurídica tributária entre a empresa que os comercializa e o Fisco Estadual, que legitime a cobrança de ICMS, devendo ser restituídos os valores cobrados a esse título, observado o quinquênio prescricional. IV - Em repetição de indébito tributário, os juros de mora são devidos a partir do trânsito em julgado da condenação (CTN, art. 167 e Súmula 188 do STJ), e a correção monetária incide a partir do pagamento indevido (Súmula 162 STJ). V - Apelação provida (TJ-MA, 2ª Câmara Cível. Relator Marcelo Carvalho Silva. Revisor Raimundo Freire Cutrim. Processo Cível e do Trabalho. Recurso. Apelação. N° 0237602011. Data de abertura 26/08/2011. Data do Julgamento 01/11/2011. Data da Publicação 24/01/2012) (grifo nosso).

A base de dados utilizada foi o sitio do TJ-MA, mais especificamente o juris consult, onde foram utilizadas para a consulta as palavras chaves “imunidade tributária”, sendo em todos os campos (relator, revisor e órgão julgador) foi colocado à palavra todos e por fim foi escolhido 10 jurisprudências para aparecerem por paginas. Tal busca gerou 50 jurisprudências, todavia referente às outras imunidades tributarias, sendo que a única que corresponde ao assunto reminiscente a este trabalho e que explicita como o tribunal do Maranhão esta decidindo sobre a imunidade cultural, teve sua emenda citada acima.

Apesar do texto literal da Constituição Federal de 1988 não ter acompanhado os avanços tecnológicos, os interpretes da mesma se atualizam e através da mutação constitucional inovam o texto magno, trazendo para a realidade presente os direitos e garantias defendidos na sua época de promulgação. Dando aos livros, jornais e periódicos, conforme art. 150, VI, d, sua devida imunidade tributária, estendendo-se, pelo avanço tecnológico, as mídias digitais, já que as mesmas tem por finalidade sem nenhuma restrição também divulgar o conhecimento e a cultura.

Vale ressaltar que no Maranhão antes vigorava a lei nº 7.325 de 15 de dezembro de 1998, que dispunha sobre o regime tributário das microempresas e empresas de pequeno porte maranhenses e outras providências. Tal lei trazia benefícios para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, sendo um deles o pagamento de ICMS de forma diferenciada, como tal ementa aduz.

MANDADO DE SEGURANÇA. REGIME DE COBRANÇA DO ICMS. MICRO E PEQUENAS EMPRESAS. ART. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. I - A Lei Estadual que instituiu o Programa das Micro e Pequenas Empresas Maranhenses - PEM, previu uma apuração simplificada do ICMS, adotando a lógica da cobrança em percentual variável incidente sobre a receita bruta da pessoa jurídica, vinculando sua utilização à exclusão de quaisquer outros benefícios. II - Nesse contexto, não se tem por absoluta a imunidade tributária relativa aos livros, papéis, jornais, periódicos e ao papel destinado à sua impressão (art. 150, VI, 'd', CF), vez que afastada por vontade do próprio contribuinte. III - Segurança denegada (grifo nosso).

No entanto tal lei foi revogada pela lei nº 8. 632 de 04 de julho de 2007 (DOE 04.07.2007), que dispões sobre a adesão do Estado do Maranhão ao Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional). Assim sendo todas as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte do Estado do Maranhão passaram a adotar o Simples Nacional, sistema esse adotado em todo o território nacional.

Falado isto, pode-se notar que a ementa posta acima esta em conformidade com a lei nº 8.632 de 04 de julho de 2007, que é a que atualmente esta em vigor para todo território maranhense, uma vez que foi requerida a imunidade tributária de periódico com base ainda na lei já revogada, mostrando assim que o entendimento dos tribunais do estado do Maranhão est em conformidade com o que aplicado em todo o território nacional.

A base de dados utilizada foi o sitio do TJ-MA, mais especificamente o juris consult, onde foram utilizadas para a consulta as palavras chaves “imunidade 150 d”, sendo em todos os campos (relator, revisor e órgão julgador) foi colocado à palavra “todos” e por fim foi escolhido 10 jurisprudências para aparecerem por paginas. Tal busca gerou 13 jurisprudências, todavia única referente à imunidade de periódico e que explicita como o tribunal do Maranhão esta decidindo sobre a imunidade cultural, teve sua emenda supracitada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em decorrência do apresentado no trabalho, infere-se que em efeito do Estado ter o dever de prestar suas atividades com o intuito final de alcançar o bem comum, o mesmo também tem o poder de exigir tributos dos seus cidadãos para obter, de maneira satisfatória, tais fins. Entretanto, também há casos em que, para se alcançar o bem comum, o Estado ao invés de valer-se do seu poder de império, o limita, com o intuito de chegar à mesma finalidade. Temos assim as limitações ao poder de tributar. São nestas limitações que temos a imunidade de livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão.

Tais imunidades visam fazer com que os “veículos de pensamento e conhecimento”, alcancem o maior número de pessoas.  Garantindo a livre manifestação de pensamento, de expressão intelectual, artística e científica, ou seja, do acesso irrestrito aos mecanismos e meios de acesso à informação e conhecimento. Tais atitudes deságuam finalmente na busca do bem comum, na garantia e proteção de direitos como à educação, desenvolvimento social e intelectual.

Assim é como os tribunais estão entendo tal assunto, felizmente, pois nossos interpretes estão atualizando o texto magno, com o intuito de alcançar tais objetivos instituídos pela nossa Constituição. Inovando o “ultrapassado” texto literal, para chegarmos ao pretendido, devido aos avanços tecnológicos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

BORGES, José Cassiano; REIS, Maria Lúcia Américo dos. Curso de atualização

fiscal. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

CARRAZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 23. ed. São

Paulo: Malheiros Editores, 2007.

CARRAZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 26. ed. São

Paulo: Malheiros Editores, 2010.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

CERQUINHO, Maria Cuervo Silva Vaz. Imunidades e Isenções. Justitia, São Paulo, 45(120): 200-212, jan./mar. 1983. Disponível em: . Acesso em: 20 out. 2012

COSTA, Regina Helena.  Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. São Paulo: Saraiva 2009.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 30. Ed são Paulo: Malheiros, 2009.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Malheiros. 2011.

SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

SILVA, Edgard Neves da. Imunidade e isenção. In: MARTINS, Ives Granda da Silva

(coord.). Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária. 3° ed., Rio de Janeiro: Financeiras, 1960.

TJ-MA, Câmara Cível. Relator José Stélio Nunes Muniz.. Processo Cível e do Trabalho. Mandado de Segurança. n° do Processo 0155662008. Data de abertura 07/07/2008. Data do Julgamento 17/10/2008. Data da Publicação (12/11/2008). Disponível em: . Aceso em: 03 nov. 2012.

TJ-MA, 2ª Câmara Cível. Relator Marcelo Carvalho Silva. Revisor Raimundo Freire Cutrim. Processo Cível e do Trabalho. Recurso. Apelação. n° do Processo 0237602011. Data de abertura 26/08/2011. Data do Julgamento 01/11/2011. Data da Publicação (24/01/2012). Disponível: . Acesso em: 03 nov. 2012.


[1] Paper apresentado à disciplina Direito Tributário I da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Acadêmicos do 6º período, vespertino da UNDB.

[3] Professor, Mestre e Orientador. 


Autor:


Artigos Relacionados


Imunidades Tributárias

Imunidade Tributária Das Entidades Filantrópicas

Imunidade Tributária Das Publicações Eletrônicas

LimitaÇÕes Ao Poder De Tributar

Liberdade! Liberdade!

A Não Incidência Tributária Sobre Os Templos De Qualquer Culto

31 De Março: é A Data Do Mec!