Afrodescêndencia: Vida, Sociedade e Cultura Na Lagoa Dos Índios



Localizada na Rodovia Duque de Caxias (entre MCP / STN ) a três quilômetros de sua margem esquerda, a Comunidade Lagoa dos Índios, comumente chamada de Comunidade do Goiabal, caracteriza-se por sua forte composição de afrodescendentes, que atualmente já conseguiu o reconhecimento de Comunidade Quilombola, uma luta antiga da comunidade. Mas, além deste fantástico fator histórico e social, a Comunidade Lagoa dos Índios também éaludida por seu incrível potencial ecológico, representado pela grandiosa área de ressaca que coexiste com a área antrópica da região, pois a mesma está, literalmente, dentro da zona urbana de Macapá,capitaldo estado do Amapá, Amazônia, Região Norte do Brasil. Infelizmente, o grande paradoxo da Comunidade Lagoa dos Índios reside nas intensas problemáticas econômicas e sociais enfrentadas cotidianamente no seio da sede.

Deacordo com os relatos daHistória Oral da comunidade, resgatadosatravés de entrevistas com os moradores entrevistados, o Sr. Pedro da Silva e a Srª. Núbia de Souza, a região da Lagoa dos Índios já era longinquamente habitada pelos índios, situação constatada por recentes descobertas arqueológicas.

Com a expansão das obras do antigo território federal a quantidade de escravos trazidos para a atual capital aumentava a cada dia, e conseqüentemente crescia o número de fugas dos negros escravos para as regiões mais afastadas da sede. Tem-se 1802 comodata inicial de posse da região da Lagoa.

Depoisque os escravos, procurando fugir dos cruéis trabalhos na construção da Fortaleza de São José e outras obras dos senhores brancos, descobriram que nas terras alagadas além de se protegerem melhor dos perseguidores,poderiam se prover com a pesca e outros alimentos passaram a formar quilombos nesta área o que provocou a expulsão dos antigos moradores, os quais contaminados por novas doenças e costumes diferentes migraram para o interior do estado.

O Nome: Goiabal- é oriundo da grande quantidade de pés de goiaba que havia no local, chegando inclusive a suprir a demanda de uma fábrica de goiabada que hoje não existe mais. Porém, o nome já foi outro, São Pedro da Ilha Redonda, Vila da Fortaleza e depois do incêndio na escola "índios", o representante do território federal, Janary Nunes resolveu batizar o lugar como Lagoa dos Índios, nome atual.

A Ocupação: Mistura Étnica-1ª Ocupação- Indígena; 2ª - Ocupação –Escravos Refugiados; 3ª - Ocupação -Remanescentes de Quilombo. População Atual: De acordo com os dados levantados através da pesquisa chegou-se aos seguintes resultados: 45% são amapaenses, mas não nasceram na comunidade; 40% são nativos da região e apenas 15% migraram de outros estados. Os dados comprovam, portanto,o forte vinculo dos moradores com o lugar.

Atividades Econômicas- As atividades econômicas dentro do "goiabal" são praticamente inexistentes. Lá funcionava uma fábrica beneficiadora de doces de goiaba que recrutava mão-de-obra local e também uma plantação de abacaxi e mandioca que pararam por falta de apoio do poder executivo.Com o passar do tempo alguns terrenos foram vendidos a outras pessoas que não pertenciam ao Quilombo, sendo posteriormente abandonados e tornados improdutivos.

Algumas famílias da comunidade sobrevivem de benefícios assistencialistas do Governo Federal e Estadual, tais como: Bolsa Família, Programa Fome Zero, Bolsa Escola e outros.

Os poucos empregos são provenientes da atividade primária dentro da comunidade e da cidade de Macapá.

A pesquisa informou que 25% sobrevive da agricultura, 40% ainda consegue sobreviver da pesca, 10% trabalha em Macapá e 25% não soube informar. Isso mostra que a população além de não ter recursos ou investimentos também não apresenta mão-de-obra qualificada.

O que é feito com o Lixo-55% do lixo é queimado; 20% do lixo é recolhido pela Prefeitura de Macapá; 20% do lixo produzido é jogado a céu aberto; 5% do lixo é enterrado.

Ocupação no entorno da Lagoa- os dados levantados mostram que a ocupação no entorno da Lagoa de uma forma ou de outra prejudicou o Quilombo, pois, 25% dos entrevistados acham que houve prejuízo para a pesca, 15% crêem que houve a propagação de doenças, 5% queixam de alteração climática na região, 20% acreditam que houve melhorias na comunidade e 35% não têm opinião formada a respeito.

Conflitos na Lagoa- Espaciais; Econômicos; Sociais- emprego, educação

Necessidades Básicas- Transporte Público, Estrutura Educacional, Atendimento à Saúde, Saneamento Básico, Água Encanada / Tratada, Geração de Empregos.

Na comunidade foram constatados problemas locais como: carência de transporte público, incipiente estrutura educacional, ausência de assistência àsaúde, falta de abastecimento de água...

Em entrevista os moradores ressaltaram suas necessidades imediatas. Uma delas diz respeito ao transporte escolar,posto que os estudantes ao concluírem a 4ªsérie do Ensino Fundamental precisam se deslocar até Macapá onde é ofertada a continuidade dos estudos, são aproximadamente quatro quilômetros de caminhada até a escola mais próxima no bairro Cabralzinho, o que ,sem dúvida, constitui um fator desestimulante a mais para os adolescentes e um desarticulador da mão-de-obra qualificada.

Na saúde a situação é ainda mais crítica. Na comunidade não há Posto Médico e a falta de asfaltamento e condições de tráfego impedem o socorro imediato das ambulâncias.

O que é observável e humanamente frustrante na Comunidade Quilombola da Lagoa dos Índios é o incrível descasoe falta de amparo do governo com relação ao desenvolvimento social, econômico e cultural da localidade que tem poucos moradores e a maioria das famílias s~]ao legitimamente descendentes de escravos. Essas famílias encontram-se num isolamento tão grande que chega-se mesmo a esquecer que estão a poucos metros da capital do estado do Amapá. No seio da comunidade não encontramos nem mesmo abastecimento comercial de gêneros alimentícios.

As Memórias da Região - Relatos de Vida:

Pedro, 70 anos, nascido e criado na vila, ele ainda relembra os bons tempos de garoto quando podia caçar a vontade com seus cachorros diversos animais: cutia, veado, paca, tatu...sem se preocupar com a escassez, na lagoa, além da água cristalina, a abundância de peixes era expressiva.

É claro que o trabalho com a roça era duro, mas compensava poder desfrutar de tão belo paraíso ecológico, marcado pelas casas de madeira cobertas de palha. Seu Pedro foi criado pelos pais e avós, ele diz que na região todos são parentes e procuram preservar as tradições do batuque dos negros antigos e das festas da comunidade. No local havia poucas casas. Sua tia foi à pioneira, somente depois a família cresceu, formando um pequeno centro. Logo a Igreja Católica enviou dois padres italianos " Raimundo e Cristiano" que antes da construção da igreja, rezavam a missa debaixo de uma grande árvore.

Mesmo sem energia elétrica e desfrutando apenas de um poço para todos os moradores, aquele tempo antigo guarda doces recordações para Pedro.

Núbia, bem mais jovem que seu Pedro, mas tão empolgada no resgate das memórias quanto ele, Núbia é presidente da Associação das Mulheres Negras do Amapá e integrante da associação de moradores. Ela procura estudar os históricos da comunidade para poder trazer ao presente as riquezas do passado, abafadas pelo descaso das autoridades.

Núbia já participou anteriormente de trabalhos na intenção de preservar a memória local, segundo ela há uma fita VHS contando relatos da origem da comunidade pelos moradores mais antigos, narrando inclusive a vinda da primeira escrava para a área, a avó de seu Jerônimo, antigo morador que era tido como uma espécie de conselheiro da comunidade, infelizmente falecido a cerca de sete meses.

Em sua visão , Núbia acredita que é possível tanto preservar quanto desenvolver melhorias na região, transformando a comunidade em ponto turístico, o que traria benéficos para todos os moradores do "goiabal" que somam aproximadamente 250-300 habitantes distribuídos em cerca de 60 residências.


Autor: Glauciela Sobrinho Cunha Pantoja Ferreira


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