Variantes Linguísticas no Contexto da Internet



Com a globalização cresceu a oportunidade de acesso às tecnologias. A internet passou a ocupar um lugar importante para a comunicação principalmente de jovens e propiciou o surgimento de uma nova forma de linguagem. A sociolingüística, ciência destinada ao estudo da linguagem e sua repercussão social ampara as pesquisas que se interessam pelo universo da linguagem virtual. A comunicação virtual demonstrada dos chats, e-mails, sites de relacionamento e blogs expõem pessoas de diferentes partes do mundo se comunicando em tempo real. Esta pesquisa bibliográfica no campo da lingüística e sociolingüística busca compreender o sentido das variantes lingüísticas no contexto da internet, especialmente no MSN Messenger com a análise de manifestações comunicativas deste site de conversação. A leitura deste artigo propõe uma análise da apropriação dos gêneros digitais que circulam na rede e que são rapidamente integrados pelos usuários da linguagem cibernética e discute as questões concernentes ponderando possíveis respostas para estes diferentes comportamentos no uso da escrita. A fundamentação teórica apresenta autores renomados que verificaram a questão sociolingüística além das variações acopladas à língua pela contínua representatividade da fala na escrita, meio utilizado pelos internautas em suas interações.

INTRODUÇÃO

Pensar na língua é o mesmo que pensar em um sistema ou em um todo organizado com elementos interdependentes que possuem acordo para a sua combinação. Mesmo pertencente a um único sistema, a língua apresenta algumas variações que podem corresponder aos dialetos e registros.

Nosso foco central não será os dialetos propriamente ditos que expressam o modo de linguagem de diferentes sexos, regiões, etnias, grupos e sociedades. O objetivo será observar variantes lingüísticas dentro de um campo de registros, uma vez que trabalharemos com a linguagem em suas diferentes formas dentro de um contexto específico. Serão analisadas variantes lingüísticas em função do modo do ambiente virtual.

Sendo assim, já que na atualidade a linguagem da internet, próxima do discurso oral, tomou conta do universo comunicativo humano, a presente pesquisa visa investigar os aspectos de uso, formação e influência desse tipo linguagem virtual no âmbito social.

Acredita-se que o uso da língua nos ambientes virtuais parece instalar uma nova prática de modalidade de linguagem

Das indagações a respeito de como a modalidade escrita se aproxima da modalidade falada e vice-versa, de quais recursos lingüísticos são mais recorrentes nas conversas virtuais e que sentidos estão postos em determinados aspectos linguisticos nas conversas virtuais surgiu a delimitação temática.

O tema foi escolhido devido à existência de poucos estudos sobre o assunto, por interesse e curiosidade em compreender os tipos de variações presentes na linguagem virtual.

O objetivo amplo perseguido é analisar os recursos lingüísticos mobilizados pelos internautas de conversas virtuais. Especificamente, verificar se há predominância da modalidade escrita sobre a modalidade falada ou vice-versa; identificar os recursos lingüísticos mais recorrentes nas conversas virtuais; discutir o conteúdo semântico dos aspectos lingüísticos nas conversas da internet.

Por meio de revisão bibliográfica, cuja referência em estudo combina as áreas de linguagem e comunicação virtual possibilitou-se o embasamento para a análise qualitativa do assunto. Buscou-se de forma quantitativa levantar as ocorrências das expressões mais usadas nas conversas da internet, assim como todos os meios empregados verificando até que ponto esses recursos auxiliam a interação, o envolvimento e a relação entre palavra falada e escrita.

O corpus constituiu-se de 6 (seis) conversas realizadas em sessões de bate-papo entre jovens com faixa etária entre 20 e 27 anos durante o mês de fevereiro de 2008.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A comunicação, sendo um fator humano, não se mantém estática no tempo. Ao contrário transforma-se à medida que o homem também se modifica tanto no seu aspecto político, social, econômico e principalmente cultural. Com o advento da globalização, é notória a amplitude de tecnologias existentes nos dias de hoje. O computador que antes era privilégio de poucos, hoje é visto como um meio tecnológico indispensável nas relações humanas, o que faz ser necessário entender os aspectos lingüísticos que circundam tal comunicação.

Uma vez que a linguagem virtual está presente na sociedade como forma de comunicar-se é importante recorrer à sociolingüística já que focaliza como eixo a prática comunicativa no cerne da sociedade. Na visão de Mollica e Braga (2007) "A sociolingüística é uma das subáreas da lingüística e estuda a língua em uso no seio das comunidades de fala, voltando a atenção para um tipo de investigação que correlaciona aspectos lingüísticos e sociais".

Percebe-se que o homem está inserido em um contexto de diversidade lingüística, no qual se criam novas formas de comunicação diariamente carregadas de variações. Nesse universo, a Internet tem se tornado um dos meios de difusão de mensagens mais acessíveis e, desse modo, sua linguagem também se propagou e se tornou globalizada.

Os estudos das variações de uma língua nos mostram a existência de dois tipos: sendo elas: de dialeto e de registro. Determinam que as variações de registro sejam também classificadas como sendo de três tipos: grau de formalismo, modo e sintonia. As variações lingüísticas do tipo modo são importantes uma vez que abordam a escrita em contraposição à fala. Nesse sentido Saussure, instituidor da lingüística moderna, estabelece essa relação afirmando ser dois institutos diferentes no qual a primeira, tem prioridade em relação à segunda (TRAVAGLIA, 2006).

Fabri (2000) informa que a fala procedeu a escrita na história da humanidade sendo a primeira, fundamental do ser humano e a segunda, atividade opcional.

Qualquer estudo da língua deve remontar a uma volta ao passado e conseqüente observação da condição humana. As primeiras manifestações de linguagem escrita surgiram em comunidades que partiram de grupos sociais de linguagem oral.

É importante destacar as diferenças entre a linguagem falada e a escrita. Enquanto a fala é espontânea, informal, efêmera e interativa, sustentada pelo contexto situacional, a escrita é planejada, organizada e durável. (FABRI, 2000).

A língua escrita tende a ser lexicalmente densa, mas gramaticalmente simples, enquanto que a língua falada tende a ser gramaticalmente intrincada, mas lexicalmente esparsa. No entanto essas propriedades seriam complementares e não exclusivas. A escrita tende a acomodar mais itens lexicais, com poucas sentenças no sintagma e a fala tende a acomodar mais processos.

Marchuschi (1997) adota uma posição multifatorial entre as duas práticas dentro de um contínuo de usos e gêneros textuais. As relações língua/fala não podem estar centradas no código, pois elas são práticas sociais. Estas determinam o lugar, o papel e o grau de relevância da oralidade e da escrita numa sociedade. A questão da relação entre ambas seja posta no eixo de um contínuo tanto social-histórico como tipológico.

Xavier (2004) percebeu que alunos que cresceram com acesso à internet têm contato com formas de textos em múltiplas semioses (palavra, imagem e som) expondo-se a diferentes textos e linguagens na interação com pessoas de diferentes regiões. Os usuários inovam no uso da linguagem, testando formas novas de transcrever e reapresentar a língua oral no espaço virtual.

Para interagir on-line é importante escrever de forma esquemática e funcional, com verbos, ícones, 'enunciados', abreviações e reduções em palavras e expressões como "fim de semana" que passa a ser grafada por "fds"; "beleza" vira "blz", sofrendo cortes em vogais e sílabas (XAVIER, 2004).

A diversidade lingüística do mundo, representada parcialmente na Internet, mostra a complexidade dos processos interacionais e promove a busca de estabelecimento de critérios e padrões lingüísticos universais, que permitam o entendimento e reconhecimento cognoscível das interações humanas, tão necessários para a globalização (GUESSER, 2007)

As variações lingüísticas são reflexos das variações sociais identitárias de classe, etnia, idade e género. A linguagem está interligada com o contexto social. O fato linguístico produz-se na sociedade à qual pertence. Por isso um homem fala diferente de uma mulher, ideologica e culturalmente: o femininolecto e o masculinolecto (PEREIRO, 2005).

Acrografia (grafia em abreviatura) não é processo de formação de vocábulos se tiver o caráter de ideograma, pois, na acrografia, a letra não vale pelo fonema que costuma representar, mas como símbolo da palavra que busca (LAUCAS, 2005). Acrossemia (redução de palavras) forma siglas derivadas das iniciais de cada palavra de uma frase. Os textos analisados apresentam um misto de acrossemia e acrografia.

ASPECTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa qualitativa elegeu como fonte de dados na internet o site MSN Messenger um programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft Corporation. O programa permite que um usuário da Internet se relacione com outro que tenha o mesmo programa em tempo real, podendo ter uma lista de amigos "virtuais" e acompanhar quando eles entram e saem da rede. Ele foi fundido com o Windows Messenger e originou o Windows Live Messenger (WIKIPÉDIA, 2008)..

MSN Messenger, ou Messenger, é um programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft Corporation que permite aos internautas conversarem em tempo real com seu amigos "virtuais" e acompanhar quando eles entram e saem da rede. (Schuelter e Reis, 2005),

As variantes lingüísticas no "Messenger" ocorrem nas estruturas morfológica e mórfica dos vocábulos empregados neste contexto. Quando se transita da sintaxe dos turnos, períodos, orações e termos das orações, em abordagem morfossintática, para a análise mórfica, que contempla os elementos mínimos significativos dos vocábulos observa-se a gradação das unidades maiores para as menores (LAUCAS, 2005).

Para complementar a proposta de analisarmos alguns processos de formação das palavras aliados à estrutura sintática dos turnos do corpus deste estudo, convém elucidar, de acordo com Azeredo (2001), os preceitos teóricos estruturalistas que fundamentam nosso ponto de vista.

Como corpus de estudo analisou-se seis interações do MSN Messenger coletadas no mês de agosto de 2008, entre quatro sujeitos com faixa etária entre 20 e 27 anos e com ensino universitário em andamento, ocorridas em tempos diferenciados.

O que se pode observar em primeiro plano é a escrita informal, coloquial, reduzida, cheia de abreviações e em estilo telegráfico,

Percebe-se que as características são semelhantes não havendo indicações de que a escrita utilizada por determinada pessoa possa ser destacada. Assim, coletaram-se dados das diferentes interações virtuais citadas, indistintamente, para esta análise.

Os acentos gráficos são raros, sendo às vezes substituídos por recursos que aumentam o tamanho da palavra "e aiii Ilanao, como vc ta e o casório". Substituiu-se o acento agudo do aí por três letras "i". "Ilanao" pretende ser o aumentativo de Ilana, mas não se utiliza o til. "Vc ta" é abreviação de "você está". Trata-se de uma pergunta para a qual não se utilizou a interrogação.

RESULTADO E DISCUSSÃO

Mollica e Braga, Travaglia, Fabri, Xavier, Guesser e Laucas observaram que a linguagem virtual é forma de comunicação e se insere no contexto sociolingüístico.

Mollica e Braga e Travaglia percebem as variações e a difusão da comunicação inovada pela Internet.

Travaglia e Fabri verificando as variações lingüísticas identificam a importância da contraposição da escrita à fala e observam que a fala interage e informaliza.

Xavier, quanto à fala e à escrita verificou que a primeira acomoda-se mais aos processos diferenciadores e a segunda lexicalmente é mais densa e gramaticalmente mais simples. Mostra que a interação entre internautas é realizada através da escrita de forma esquemática e funcional.

Guesser concordando com Xavier elucida que nesse processo diferenciador de uma língua cibernética padrões e critérios têm se estabelecido nos processos interacionais praticados na Internet.

No entendimento de Fabri para o ser humano a fala, atividade fundamental precede à escrita, que é opcional enquanto Marchuschi acredita que a língua/fala são práticas sociais que determinam o grau de relevância da fala e da escrita na sociedade.

Xavier e Perero concordam sobre ser o uso e o contato os fatores determinantes de adaptações, variações e inovações da língua escrita no espaço virtual representada por formas novas de transcrever e reapresentar a língua oral

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base nisso percebemos que a linguagem utilizada na internet, embora reproduzida por símbolos grafados, é dotada de informalidade, espontaneidade, interação e contextualizada a um momento virtual, o que a torna mais próxima da fala do que da escrita. Interligando aos conceitos acima, percebemos que na linguagem oral no contexto da internet é mais relevante por proporcionar maior pessoalidade e conseqüentemente facilitar a interação. Sendo assim partindo da análise dos símbolos será entendida a prática social que determina modos de linguagens diferentes.

Teorias se tornam mais eficazes quando relacionadas à prática. Nesse sentido o conceito ganha forma à medida que forem feitas análises de textos virtuais e assim a formulação de opiniões que respaldem o exercício da linguagem virtual e a manutenção das satisfações em comunicar-se.

REFERÊNCIAS

AZEREDO, José Carlos de. Fundamentos de gramática do português. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

BAKHTIN, Mikail. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico nas ciências da linguagem. 9ª edição. Coleção linguagem e cultura. São Paulo: Huciteo, 1999.

CAMPBELL, Nick. Towards a grammar of spoken language: incorporating paralinguistic information. 2002a. In: http://feast.his.atr.jp/nick/pubs/icslp.pdf. Acessado em 02 de dezembro de 2007.

FABRI, Kátia Maria Capucci. Uma nova modalidade de linguagem: as "conversas virtuais" na internet. Uberlândia. 2000.

LAUCAS Giannina: A interação e a construção da linguagem em rede: uma análise das ocorrências morfossintáticas do português no "chat". UERJ, 2004.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. O hipertexto como um novo espaço de escrita na sala de aula. In: AZEREDO, José Carlos de (org.). Língua portuguesa em debate: conhecimento e ensino. 2ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

MARCHUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita – atividades de retextualização. 2ª Ed. São Paulo: Cortez, 2001.

MOLLICA, M. C. & BRAGA, M. L. (Org.). Introdução à sociolingüística. São Paulo: Contexto, 2004.

MOLLICA, Maria Cecília. Fundamentação teórica: conceituação e delimitação. In: Introdução à Sociolingüística – o tratamento da variação. São Paulo: Contexto, 2007.

PEREIRO, Xerardo Apontamentos de antropologia cultural. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), 2005

SCHUELTER, Wilson ; REIS, Mariléia Silva : O internetês em comunidades virtuais: a interação pela linguagem cifrada.

Disponível em: http://www.unigran.br/interletras/textos/internetes.pdf. Acesso em: 03/09/2008

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramática. São Paulo: Cortez: 2006.

XAVIER, Antonio C. S. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. Tese de Doutorado, Unicamp: inédito, 2002.
Autor: Talma Bastos de Barros


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