Nossas Frustrações-Agressões



O Brasil assistiu, durante uma semana (do dia 13 ao 17/10/2008), o drama do seqüestro que terminou com a morte da adolescente Eloá (15anos). O fato tornou-se algo de espetáculo midiático. Mas casos como esse podem acontecer com qualquer um de nós, pois o que está em jogo são as frustações dos nossos desejos. Por isso, tomando a agressão de Lindemberg (22 anos) como conseqüente de uma frustração, nossa análise assenta-se sobre o viés psico-social. Abstenho-me de julgar Lindemberg como uma pessoa emocionalmente desequilibrada, pois segundo algumas testemunhas amigas, ele era uma pessoa "tranqüila", trabalhadora, engraçada e enturmado com os colegas de escola. Portanto, um jovem "normal" como qualquer outro.

Mas por que, de repente, adolescentes, jovens, adultos, nas diferentes camadas sociais e raciais, tornam-se agressivos e violentos a ponto de matarem suas namoradas ou pessoas amigas?

Nas últimas décadas, alguns psicanalistas - Dill & Anderson (1995), Leonard Berkowitz (1989), John Dollard (1939) - têm dado grandes contribuições à teoria da frustração-agressão. Segundo estes estudiosos, "a frustração sempre conduz a alguma forma de agressão". Erich Fromm, em sua obra O coração do homem (1965), analisa quatro tipos de violências: recreativa, reativa, compensatória e arcaica. Exceto a primeira, as três últimas são concideradas patológicas. Nessa análise, utilizamos dois tipos de violências: a reativa e a compensatória.

Geralmente, nossas alterações emocionais acontecem a partir de um fato: fim do namoro, decepção na escola, reprovação pública, separação conjugal dos pais etc. Estes acontecimentos causam-nos grandes frustrações porque o objeto do nosso desejo foi frustado. O que isso significa? – Significa que as expectativas, em relação ao objeto de realização, foram completamente interrompidas. Conseqüentemente, nesse cenário, podemos lidar com duas fases.

No caso de Lindemberg, na primeira fase, a reativa, ele deve ter utilizado algum tipo de agressão contra a ex-namorada – verbal, gestual, escrita – tentando realcançar o desejo frustado. Não alcançando tal objetivo, sentiu-se impotente. A partir desse desapontamento, seu estado emocional descontrolou-se, totalmente. Ele não soube normalizar sua agressão advinda da frustração; não foi suficientemente uma pessoa forte para, frente ao desapontamento, buscar autonomia e independência que o levassem ao encontro com novos amigos e pessoas amadas, reconstruindo assim sua confiança. Resultado: o desejo de amar foi revestido pelo desejo de vingar-se. Dupla impotência: uma por não ter realcançado o desejo frustado; outra porque não foi forte para controlar e normalizar seu desejo de vingança.

A segunda fase acontece dendro do drama da irracionalidade. Sentindo-nos impotentes diante dos acontecimentos dos nossos desejos, recorremos ao uso da força. Entra em cena a violência compensatória. Diz Erich Fromm: "O homem impotente, se tem uma pistola, uma faca ou um braço forte pode transcender a vida, destruindo-a em outros ou em si mesmo. Assim, vinga-se da vida por ter-se negado a ele. A violência compensatória é exatamente a violência oriunda da impotência e que serve de compensação para esta". Assim, desequilibrando-nos emocionalmente, impotentes, passamos a exercer "o domínio completo sobre a outra pessoa, torná-la um objeto indefeso de nossavontade, tornamo-nos o deus dela, fazemos com ela o que bem nos der na veneta".

Foi isso que a mídia veiculou durante cem dias: Lindemberg fez Eloá objeto de seu domínio. O uso da força foi o último recurso a usar para dominá-la, psicologicamente. Para Fromm, humilhar e escravisar a outra pessoa "são meios para tal fim, e a meta mais radical é fazê-la sofrer, pois não existe maior poder sobre outra pessoa do que o de obrigá-la a suportar sofrimento sem ser capaz de defender-se". Eloá teve sua liberdade negada, um direito essencial à vida. A violência compensatória foi o meio por que Lindemberg sentiu prazer ao fazer a outra sofrer, um misto de sadismo e desforra.

Portanto, o fato analisado acima revela que os locus desociabilidade juvenis brasileiros estão doentios. As instituições tradicionais – família, escola, estado, trabalho, religião - devem rever suas formas educacionais, pois vivenciamos uma aguda crise de alteridade e autoridade. Nós devemos ser humanizados segundo princípios éticos que nos levem à religação de umas às outras através da solidariedade, da fraternidade e da co-responsabilidade. Nesse cenário, crianças, adolescentes e jovens devem aprender a lidar com suas frustações, e as agressões tarabalhadas de tal forma que, social e psicologicamente, contraponham, como sugere Erich Fromm, a destrutividade compensatória ao desenvolvimento do potencial criador do homem, da capacidade dele para fazer uso produtivo de seus poderes humanos.
Autor: Antonio Leandro


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