O Branqueamento Da Cultura Afro- Brasileira



Introdução

O racismo foi aos poucos reposto, primeiro de forma científica, com base no beneplácito da biologia, e depois pela própria ordem do costume. Se tal constatação não fosse verdadeira, como explicar o surgimento nos anos 50 de leis que culpabilizavam, pela primeira vez, a discriminação?
Em quanto em outros países adotaram-se estratégias jurídicas que garantiam a discriminação dentro da legalidade, no Brasil, desde a proclamação da República, a universalidade da lei foi afirmada de maneira taxativa: nenhuma cláusula, nenhuma referência explicita a qualquer tipo de diferenciação pautada na raça.
A lei Afonso Arinos de 1951, ao punir o preconceito, acabava por formalizar a sua existência – o preconceito racial. Por falta de cláusulas impositivas e de punições mais severas, a medida mostrou-se ineficaz até mesmo no combate a casos bem divulgados de discriminação no emprego, escolas e serviços públicos.
Caso ainda mais significativo é o da Constituição de 1988, regulamentada pela lei nº.7716, de 5 de janeiro de 1989, que afirma ser racismo um crime inafiançável. Analisando-se seu texto depreende-se uma rejeição do preconceito, de maneira invertida, mas mais uma vez simétrica.
São só consideradas discriminatórias atitudes preconceituosas tomadas em público. Atos privados ou ofensas de caráter pessoal não são imputáveis, mesmo porque precisariam de testemunha para a sua confirmação. Racismo é, portanto, de acordo com o texto da lei, proibir alguém de fazer alguma coisa por conta de sua cor de pele. O caráter direto e até descritivo da lei não ajuda quando de fato é preciso punir.
Tomando-se o texto da lei, fica caracterizado que racismo no Brasil é passível de punição apenas quando reconhecido publicamente. Na existem referências, porém, à possibilidade de a pena ser aplicada quando algum abuso desse tipo ocorre, por exemplo, no interior do lar ou em locais de maior intimidade. Para esses casos, mais uma vez o texto silencia.
A lei é pouco especifica quando se trata de delimitar a ação da justiça. O fato é que o ofensor na maior parte dos casos se livra da pena, ora porque o flagrante é quase impossível, ora porque as diferentes alegações põem a acusação sob suspeita. O texto não dá conta do lado intimista e jamais afirmado da discriminação brasileira. A lei é para poucos e na falta de mecanismos concretos, as discriminação transforma-se em injuria ou admoestação de caráter pessoal e circunstancial.
Não há, na sociedade brasileira, e, sobretudo no que se refere à população negra, uma distribuição eqüitativa e equânime dos direitos. A distribuição geográfica desigual representa um fator de grande importância na analise da conformação brasileira.
Praticamente metade da população classificada no termo parda encontra-se na região nordeste 49,8%, sendo a fração correspondente à branca de apenas 15,1%. Nas áreas do Sudeste e do Sul acham-se 64,9% da população branca e somente 22,4% da população parda.
Essa divisão desigual é um dos elementos que explicam a difícil mobilidade ascendente dos não-brancos: obstaculizada pela concentração destes nos locais geográficos menos dinâmicos: nas áreas rurais em oposição às cidades e, dentro das cidades em bairros mais periféricos.
As populações preta e pardas aparecem de modo claramente desproporcionais na distribuição de empregos. Tal situação reflete-se, de forma imediata, no perfil e na renda dos grupos. Mas não é só sob esse ângulo que pode ser percebido a desigualdade existente no Brasil. Sergio Adorno investigou a existência de racismo nas práticas penais brasileiras, partindo do princípio de que a igualdade jurídica constitui uma das bases fundamentais da sociedade moderna: supõe que qualquer indivíduo deve gozar de direitos civis, sociais e políticos. Em sua pesquisa o sociólogo constatou um tratamento diferenciado, pautado na cor.
Com relação à educação, os resultados mostram-se também reveladores. Fulvia Rosenberg verificou uma clara desigualdade no que diz respeito ao acesso básico. Atestou-se a maior concentração de negros nas instituições públicas – 91,1% comparados aos 89% brancos – e nos cursos noturnos: 13% negros e 11% brancos.
O analfabetismo no grupo de indivíduos definidos como pretos chega a 30%, 29% atribuídos à população parda, 12% entre brancos e 8% entre amarelos. Enquanto o branco brasileiro médio tem menos de quatro anos de escolaridade, a expectativa para o restante da população é de dois anos. As maiorias dos brasileiros, não importando a raça, não chegam ao segundo grau.
Segundo as estimativas da PNDA, levantamento anual conduzido pelo IBGE, o Brasil contava em 1988 com cerca de 141 milhões de habitantes. Destes, respondendo a quesitos de cor, 55,5% diziam-se brancos, 5,4% pretos, 38,6% pardos e apenas 0,5 amarelos. Esses dados continuam sendo reveladores de um certo clareamento da população, se lembrarmos que no século passado no censo de 1890, os brancos somavam 44% da população total.
Os dados apontam, na verdade, um crescimento endógeno, em que a dinâmica passa a ser administrada basicamente pelos regimes de mortalidade e de fecundidade e pelo padrão de casamento. É a combinação desses fatores da privacidade que determina atualmente a mudança na cor da população brasileira.
Com efeito, os componentes demográficos recentes parecem indicar uma consistente redução da população negra, um aumento correspondente do grupo pardo e uma lenta diminuição da população que se auto-identifica como branca. Dessa maneira, a existência não de um branqueamento, mas antes de uma pardização.
A mortalidade infantil, uma insofismável disparidade pode ser aferida: enquanto a taxa para crianças brancas era de 77 óbitos de menores de um ano para cada mil nascido vivos, o número correspondente para os pardos era 105 e para os pretos 102. De forma semelhante, pretos e pardos apresentam taxas semelhantes de mortalidade adulta maiores que a dos brancos.
Com relações aos padrões de matrimonio, os grupos definidos no censo como preto casam-se em geral mais tarde, com a idade média de 23,4 anos para as mulheres e 26,3 para os homens, enquanto o grupo pardo contrai matrimônio com idade média de 22,5 anos para as mulheres e 25,4 para os homens. Um dado indicador das variações nos padrões de casamento é o celibato definitivo mais acentuado entre pretos homens 7,8% do que entre brancos 5,2% e pardos 5,5%. Esses números mostram que o casamento é ainda um privilégio sobre tudo, dos brancos.
O corpo da lei não dá conta do lado dissimulado da discriminação brasileira. Na verdade as leis parecem andar de um lado e a realidade do outro. Apropria imagem oficial do país buscou privilegiar aspectos culturais da mistura racial e do sincretismo, e amenizou a desigualdade do dia-a-dia que se revela tanto na esfera pública como na esfera privada.
As populações preta e parda não só apresentam uma renda menor, como têm menos acesso a educação, uma mortalidade mais acentuada, casam-se mais tarde e, preferencialmente, entre si.

Pretos, Brancos e Mestiços: A cor do Brasil

Faz parte de um certo modelo brasileiro negar e camuflar o conflito antes mesmo que ele se apresente de forma evidente. Em 1900, diante da constatação de que era mesmo um país de mestiços e negros, preferiu-se, simplesmente, retirar o quesito cor do censo demográfico.
Em 1950, o senso distribuiu a população em quatro grupos segundo a cor: brancos, pretos, amarelos e pardos, designação sob a qual reuniram aqueles que se declararam índios, caboclos, mamelucos ou morenos ou nem sequer declararam sua cor. Em 1960, a pesquisa relativa à cor distinguiu cinco grupos: brancos, pretos, amarelos, índios e pardos. Em 1980, restringiu-se aos mesmos grupos do senso de 1950.
O termo pardo surge como um verdadeiro saco de gatos ou como a sobra do censo. Tudo que não cabe em outros lugares, encaixa-se aqui. Já durante o período escravocrata fazia-se uma distinção semântica entre dois termos aparentemente sinônimos entre si: negro era o escravo insubmisso e rebelde, preto era o cativo fiel.
O resultado da nossa indeterminação nas distinções raciais faz com que o fenótipo, ou melhor, certos traços físicos se transformem nas principais variáveis de discriminação. Conforme Oracy Nogueira teríamos um preconceito de marca – uma classificação quase imediata – por oposição ao preconceito de origem, mais próprio ao contexto norte-americano, no qual quem descende de uma família negra (a menos de três gerações), e a despeito da aparência, é sempre negro.
No Brasil, a mistura de definições baseadas na descrição da cor propriamente dita e na situação econômica e social teria gerado uma indeterminação, consolidada em 1976, depois que o IBGE fez sua pesquisa Nacional por amostra domiciliar.
O resultado da enquete indica a riqueza da representação com relação à cor e o quanto a sua definição é problemática. Pouco se fala de origem: nenhum dos termos remete a África e, a não ser no caso de polaca e baiana, a descendência não é mencionada, isso para não insistir no evidente branqueamento geral presente nas respostas.
Chamam a atenção também os nomes no diminutivo e no aumentativo: branquinha, moreninha, bugrezinha, loirinha, morenão. Nesse caso, a delimitação revela um certo jogo da intimidade e ,por outro lado, no que se refere aos negros, a reprodução do esteriótipos com relação á sexualidade: o diminutivo pras as mulheres e o aumentativo para os homens.
Uma nova serie de denominações – miscigenação, esbranquecimento, mista – aponta de que amaneira a imagem de uma nação mestiça e branqueada tornou-se um grande senso comum. Além disso, a quantidade de variações em torno do termo branca demonstra de forma definitiva que, mais do que uma cor, essa é quase uma aspiração social.
O dado mais notável não é a multiciplidade de termos, mas a subjetividade e a dependência contextual de sua aplicação. De fato, a identificação racial é quase uma questão relacional no Brasil: varia de indivíduo para indivíduo, depene do lugar, do tempo e do próprio observador. Quanto mais claro aquele que pergunta, mais escura pode ser a resposta, e vice-versa.
Estamos falando de um certo uso social da cor que não só leva a terminologia a se mostrar subjetiva, como torna seu uso objeto de disputa. Com uma forte preferência pelo branco ou por tudo o que puxa o mais claro, joga-se o preto para o ponto mais baixo da escala social: os negros que não querem se definir como negros e têm uma condição um pouco melhor tendem a se autodefinir como escudo ou, mais ainda, como pardos ou morenos.
Algo parecido acontece com os mestiços: aqueles com uma condição melhor na rua tendem mais a se autodefinir como brancos. Nesse status racial, pardo não é preto nem branco, já que na prática se aproxima, na representação popular, dos negros. Estamos, portanto, diante de uma categoria interna, oficializada pelo costume e dificilmente compreensível para aqueles que conhecem o país apenas de passagem.
Raça Social é a expressão encontrada por Valle e Silva para explicar esse uso travesso da cor e para entender o efeito branqueamento existente no Brasil. Isto é, as discrepâncias entre cor atribuída e cor autopercebida estariam relacionadas com a própria situação sócio-economica dos indivíduos.
Longe de um caso isolado, a raça está por toda aparte: nas piadas que inundam o cotidiano, nas expressões do dia-a-dia, na propaganda de turismo e na discriminação violenta, mas escondida do Judiciário, do mundo do trabalho e da intimidade. Quase como uma etiqueta, uma regra implícita de convivência, no Brasil cor combina com prestígio e com lugar social, e apesar de silenciosa é eloqüente em sua aplicação.
A oportunidade do mito se mantém, para além de sua desconstrução racional, o que faz com que no Brasil, mesmo aceitando-se o preconceito, a idéia de harmonia racial se imponha aos dados e à própria consciência da discriminação.
Somos racistas, mas nosso racismo é melhor, porque mais brando que os outros, é possível dizer que algumas coisas mudaram: não mais tão fácil sustentar publicamente a igualdade de oportunidade em vista da grande quantidade de dados que comprovam o contrário. O fato é que mudamos de patamar e que não mudamos: o lugar-comum parece ser delatar o racismo, mas o ato se extingue por si só. Reconhecer a existência do racismo, porém não leva à sua compreensão, tampouco à percepção de sua especificidade.
Um mundo de indivíduos sujeito à lei e outro de pessoas, para as quais os códigos seriam apenas formulações distantes e destituídas de sentido. Nesse sentido, é na história que encontramos as respostas para a especificidade do racismo brasileiro, que já não se esconde mais na imagem indelével da democracia racial, mas mantém a incógnita de sua originalidade e de sua reiteração constante.
Se o mito deixou de ser oficial, está internalizado. Perdeu seu estatuto cientifico, porém ganhou o senso comum e o cotidiano. No Brasil convivem sim duas realidades diversas: de um lado, a descoberta de um país profundamente mestiço em suas crenças e costumes; do outro, o local de um racismo invisível e de uma hierarquia arraigada na intimidade.
Afinal, o que dizer de um país onde 50% da população negra tem uma renda inferior a dos salários mínimos? Como entender a democracia racial em uma nação aonde só 4% da população negra chega à universidade?
Afinal é esse tipo de postura que explica os dados de criminalidade que apontam que, sujeitos às mesmas penalidades, os negros tem 80% de chance a mais do que os brancos de serem incriminados. É como se persistisse um certo pacto histórico: não se nomeia publicamente as diferenças, do mesmo modo que não se cobram do Estado políticas oficias nesse sentido. Assim, os constrangimentos são sempre privados.

UNESCO

A partir de uma pesquisa financiada pela UNESCO, com um discurso sobre Relações Raciais no Brasil; a hipótese sustentada era que o país representava um exemplo neutro na manifestação de preconceito racial, e que seu modelo poderia servir de inspiração para outras nações cujas relações eram menos “democráticas”. Os pesquisadores tinham a missão de pesquisar a realidade racial brasileira.
Por parte da UNESCO, a expectativa de que os estudos fizessem um elogio da mestiçagem e enfatizassem a possibilidade do convívio harmonioso entre etnias nas sociedades modernas. Mas em vez de democracia surgiram indícios de discriminação, em lugar da harmonia o preconceito.
Nas analises de Costa Pinto, Roger Bastide e Florestan Fernandes, que abordaram a temática racial com um olhar para a desigualdade; onde percebem a ausência de tensões abertas e de conflitos permanentes é, em si mesma, índice de boa organização das relações raciais.
Os impasses gestados por essa sociedade recém egressa da escravidão, Florestan Fernandes problematizava a noção de tolerância racial vigente no país, contrapondo-a a certo código de decoro que, na prática, funcionava como um fosso intransponível entre os diferentes grupos sociais.
Em lugar de analises culturalistas, centradas no tema da modernização do país, e valendo-se da investigação do processo que levava à passagem do mundo tradicional ao moderno, abria-se uma ampla discussão sobre a situação das classes sociais no Brasil. Ainda notava-se a existência de uma forma particular de racismo: um preconceito de não ter preconceito.
Esse resultado de ordem tradicional, vinculado à escravidão e à dominação senhorial, forma uma polarização de atitudes, uma conseqüência de permanência de um etos católico. É por isso que o preconceito de cor no Brasil seria condenado sem reservas, como representasse um mal em si mesmo. A discriminação presente na sociedade, desde que preservado certo decoro e que suas manifestações continuassem ao menos dissimuladas.
O racismo aparece, dessa maneira, como se os brasileiros repetissem o passado no presente, traduzindo-o na esfera privada. A extinção da escravidão, a universalização das leis e do trabalho, não teriam afetado o padrão tradicional de acomodação racial.
O resultado é confundir-se miscigenação com ausência da estratificação, além da construção de uma idealização voltada para o branqueamento. O protótipo do negro leal, devotado ao senhor e sua família, assim como à própria ordem social.
A parir dessa imagem, podemos vislumbrar o paradoxo da situação racial vivenciada no Brasil: uma lenta mobilidade social teria eliminado algumas barreiras existentes no período escravocrata, mas criando outras de ordem econômica e mesmo moral; não compartilhavam de semelhante figurino ou que se opunham acertos códigos morais vivenciados de forma cada vez mais internacionalizada.
No resultado do censo de 1950, foi encontrado não só diferenças regionais, como concentrações raciais de privilégios econômico, sociais e culturais. O conjunto das pesquisas apontavam, portanto, para novas facetas da miscigenação brasileira. Sobrevivia um legado histórico, um sistema enraizado de hierarquização social que introduzia gradações de prestigio com base em critérios como classe social, educação formal e origem de famílias em um todo um carrefour de cores e tons.
O preconceito de cor fazia às vezes das raças, tornando ainda mais escorregadios os argumentos e mecanismos de compreensão da discriminação. O processo de exclusão social desenvolveu-se a ponto de empregar termos como preto ou negro, em lugar da noção de classe subalterna, nesse movimento que com freqüência apaga o conflito e a diferença.
A chegada dos anos 70 traz, porem, todo um movimento de contestação aos valores vigentes, que eram questionados na política oficial ou mais alternativas, na literatura, na música. Também, o surgimento do Movimento Negro Unificado que, ao lado de outras organizações paralelas, passava a discutir as formas tradicionais de poder.
A pesar de ser essa, sem dúvida, uma forma privilegiada de entender a questão, o tema demonstra que o preconceito de cor não estava exclusivamente atrelado a uma questão econômica e social; ao contrário, persistia com um dado divisor em nossa sociedade; na analise de profundas desigualdades que separam negros dos demais grupos e brancos de não-brancos.

Brasil e Estados Unidos: o contraste do racismo

De acordo com o texto, tanto no Brasil como nos Estados Unidos, tivemos o processo de mestiçagem, é claro que cada país tinha as suas peculiaridades em relação a este assunto. No Brasil, a forma de classificação racial é de acordo com a aparência física de cada indivíduo, enquanto que nos Estado Unidos, ela é classificada pela genética.
O fato de haver mais mulatos livres do que negros, significa que os senhores brancos se preocuparam o suficientemente com os seus filhos para libertá-los, este fato é semelhante no Brasil e nos Estados Unidos, facilmente comprovados através dos números: no Mississipi, em 1860, 77% dos negros livres eram mestiços e apenas 8% dos escravos eram mulatos; no Brasil, principalmente em São Paulo, apenas 4% dos mulatos eram escravos, existia 95% de escravos negros, em 1799.
Estes dados só vêm a comprovar a preocupação dos senhores brancos norte-americanos e brasileiros com seus filhos abastados. A diferença é que no Brasil, em função da mestiçagem ser mais ampla, essa preocupação tinha um campo maior na qual se expressar. Já nos Estados Unidos, poucos homens brancos, pais de mulatos, reconheciam os filhos tão abertamente como era no Brasil.
É justamente nessa nova classe dentro da sociedade brasileira, a dos mestiços, que faz com que os descendentes de africanos, tornam-se um grupo mais heterogêneo no seu sentimento de solidariedade.
Esta no papel atribuído ao mulato aqui no Brasil a diferença nas relações raciais entre o Brasil e os Estados Unidos. O fato de ser aceito o branqueamento aqui no Brasil, é uma maneira de mostrar que o mulato tem lugar na sociedade, e como conseqüência a redução do descontentamento entre as raças. Então, no Brasil o negro pode esperar que seus filhos sejam capazes de ultrapassar os obstáculos que o deixaram para trás, caso eles venham a se cassar com pessoas de pele mais clara.
Já a questão racial nos Estados Unidos, foi conduzida de maneira a não conceder nenhum lugar a uma pessoa mestiça no esquema biológico, ou o indivíduo é branco ou é negro, não existe a figura do mulato.
O processo de mestiçagem conturbou a questão da identidade negra no Brasil, a partir do momento que temos a figura do mulato fazendo parte da sociedade brasileira, vem à tona a falta de homogeneidade (união) da cultura africana, quebrando assim, um laço entre os descendentes africanos e por conseqüência dessa quebra, estaria aí quase que anulando com a identidade negra brasileira, até porque no Brasil a raça é classificada pelo fenótipo e não pela genética, como é nos Estados Unidos.
A identidade é construída, ou seja, uma escolha pessoal que não é fixa. No caso dos negros e mestiços, a formação de uma identidade foi praticamente quase toda dentro dos preceitos de uma sociedade branca, até porque manter os seus costumes de conotação africana iria de encontro a ser ou não aceito dentro desta sociedade, então como identidade é construída, ficava melhor tanto para os mestiços e negros se moldarem ao sistema. Sendo assim, ficava difícil formar uma identidade de excluídos, justamente porque não seriam aceitos dentro de um determinado grupo. Fica muito claro o motivo dessa falta de identidade de excluídos, essa quebra que acontece com a aceitação do mulato, acaba enfraquecendo os laços entre os descendentes de africanos, tornando fácil e ao mesmo tempo necessário essa mudança de identidade.
Tanto os mulatos quanto os chamados negros “puros” caíram na armadilha de um branqueamento ao qual não terão acesso abrindo assim mão da formação de sua identidade de “excluídos”.
Quando se fala em questões como unirracial e unicultural, é preciso entender que esta sociedade estaria sendo construída sobre bases de um modelo único racial e cultural, isto é, um modelo branco. Na prática esse modelo estaria destruindo a cultura da população negra, estavam deixando para trás todo um passado que foi trazido da África para submeter-se a uma sociedade que visava uma única raça e cultura. Diante dessa situação é preciso citar, que nunca se falou na possibilidade de consolidação de uma sociedade plural em termos de futuro, já que o Brasil nasceu historicamente plural na sua cultura.
A idéia de sociedade que é defendida pelo autor, surge na década de 70, que propunha a construção de uma sociedade brasileira dentro de uma democracia plurirracial e pluriétnica, onde o porta-voz dessa idéia seria o militante intelectual e negro Abdias do Nascimento. A sua idéia era de que o Brasil deveria ser consolidado numa sociedade plurirracial. Na prática, o objetivo era uma sociedade democrática para todas as raças com a mesma oportunidade econômica, cultural e social para todos.
A miscigenação brasileira estava baseada em cima de uma estrutura patriarcal, onde o senhor branco detinha um monopólio de mulheres negras, até porque existia um desequilíbrio demográfico entre homens e mulheres, tinha aproximadamente uma mulher para cinco homens. Nesse contexto, as escravas negras, desempenharam um papel de prostitutas dos senhores brancos, nesse processo de miscigenação, sendo assim, impedidas de construir uma estrutura familiar estável.
De acordo com Abdias, seria um absurdo apresentar o mulato que na sua origem, é o fruto desse covarde cruzamento de sangue, como prova de abertura e saúde das relações raciais no Brasil.

Bibliografia

OLIVEN, Ruben, Violência e Cultura no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1989.
ORTIZ, Renato. A Morte Branca do Feiticeiro Negro: umbanda e sociedade brasileira. Brasiliense, falta o ano.
ORTIZ, Renato. Cultura Brasileira e Identidade Nacional. Brasiliense, falta o ano.
SCHWARCZ, Lilia M. Nem Preto, Nem Branco, muito pelo contrario: cor e raça na intimidade. In: História da Vida Privada no Brasil. Cia. das Letras.
Kabengele Munanga. Bibliografia incompleta.


Autor: Prof. Ubiratã Ferreira Freitas


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