Pessoas Perigosas



PESSOAS PERIGOSAS
A
 expressão “pessoas perigosas” – um dos desdobramentos do estigma de lugares violentos -, com freqüência tem sido utilizado para designar os indesejados e inúteis ao processo lógico do moderno capitalismo. Isto é, a penalização da pobreza ou do subproletariado de comportamento “incivilizado” que suja e ameaça a decência e a falsa moral das cidades.
Um estigma com base na doutrina da “tolerância zero” de Charles Murray (Losing Groud: American Social Policy, 1950-1980), “um politólogo ocioso de reputação medíocre e guru da administração Ronald Reagan em matéria de welfare”, com muitos admiradores no Brasil entre os “especialistas em segurança” reacionários e conservadores. Cujo “fiscal-vedete de Nova York, Rudolph Giuliani, extraiu as diretrizes da política policial e judiciária que passou às forças da ordem um cheque em branco para perseguir agressivamente a pequena delinqüência e reprimir os mendigos e os sem-teto nos bairros deserdados” (Wacquant, 2001).
As pessoas estigmatizadas como perigosas são “arbitrariamente excluídas da lista oficial das que são consideradas adequadas e admissíveis” (Bauman, 2005), compondo uma “subclasse” destituída de quaisquer aspectos de reconhecimento de humanidade, principalmente o direito a uma identidade – “a identificação é também um fator poderoso na estratificação, uma de suas dimensões mais divisivas e fortemente diferenciadoras” (Bauman, 2005).
Na atual teatralidade do cotidiano da “sociedade líquido-moderna” (Bauman, 2007), a subclasse das pessoas perigosas constitui um lixo humano de rejeitados pela lógica da economia capitalista por não serem mais portadores de qualquer potencial humano de trabalho para a exploração e expropriação – nos dizeres de Karl Marx -, restando-lhes as migalhas da “subcidadania” (Souza, 2003) construída pelo processo de exclusão que a separa “do espaço em que os outros, as pessoas ‘normais’, ‘perfeitas’, vivem e se movimentam” (Bauman, 2005). São as “maiorias que pouco podem influir nas decisões governamentais”, na medida em “o processo (de globalização) tem contribuído para trazer efeitos sociais ainda mais perversos, precarizando a situação dos ‘incluídos’ e aumentando o número dos ‘excluídos’ (Wanderley, 2007) – no caso, a subclasse de inúteis.
O estigma de pessoas perigosas, portanto, está sendo usado em referência a um atributo profundamente depreciativo no intuito de negar e anular qualquer acessibilidade de direito ou reconhecimento a essa massa de consumidores incapazes. È um estigma que corresponde “as culpas de caráter individual, percebidas como vontade fraca, paixões tirânicas ou não naturais, crenças falsas e rígidas, desonestidade, sendo essas inferidas a partir de relatos conhecidos de, p.ex., distúrbio mental, prisão, vício, alcoolismo, homossexualismo, desemprego, tentativas de suicídio e comportamento político radical” (Golffman, 1988).
Sob tal condição, “qualquer outra identidade que (...) possa ambicionar ou lutar para obter lhe é negada a priori. O significado da ‘identidade da subclasse’ é a ausência de identidade, a abolição ou negação da individualidade, do ‘rosto’ – esse objeto do dever ético e da preocupação moral. (...) é excluído do espaço social em que as identidades são buscadas, escolhidas, construídas, avaliadas, confirmadas ou refutadas” (Bauman, 2005). O estigma de pessoas perigosas tem por objetivo confortar o medo dos estratos médio e alto.

Autor: Arnaldo Eugênio


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