A Situação dos Imigrantes Judeus: Preconceitos e Anti-Semitistimo Durante a Era Vargas (1930-1945)



A SITUAÇÃO DOS IMIGRANTES JUDEUS: PRECONCEITOS E ANTI-SEMITISTIMO DURANTE A ERA VARGAS (1930-1945)

Eduardo Pablo dos Santos

RESUMO

O objeto deste trabalho é pesquisar a questão da imigração judaica e do discurso anti-semita no Brasil durante a Era Vargas (1930-1945), período em que Vargas, juntamente com a intelectualidade brasileira, quer por questões políticas ideológicas ou culturais, defendeu o discurso da não aceitação de imigrantes judeus no país. Dessa forma esta pesquisa foi baseada na reflexão de algumas obras contemporâneas a fim de analisar a política de imigração e os discursos raciais que buscavam a modernidade durante a Era Vargas. Neste sentido analisou-se a influência das diversas teorias raciais, vindas da Europa, bem como dos regimes-políticos autoritários, que acreditamos ter influenciado o governo Vargas a se posicionar ideologicamente e politicamente de forma anti-semita, dificultando assim a entrada de judeus de várias nacionalidades no Brasil. Tais imigrantes fugiam de diferentes circunstâncias, como: a da intolerância racial promovida por regimes totalitários, entidades religiosas em geral, ou por conflitos territoriais.

Palavras-chaves: Era Vargas, Teorias Raciais, Anti-semitismo, Imigrante, Judeu, Regime autoritário.

1- INTRODUÇÃO

A questão judaica é um tema do qual tenho grande simpatia, desde o início da minha formação acadêmica, pois durante as disciplinas de História do Brasil, percebi a existência de judeus que abraçaram a nossa pátria, por diferentes motivações e necessidades, e assim acabaram contribuindo para a nossa formação social.

Assim, para a compreensão da trajetória do povo judeu no Brasil, especialmente durante o governo Vargas, período de (1930-1945), esta pesquisa procurou observar se o governo Vargas, apoiado pela elite brasileira utilizou de uma política restritiva à entrada de imigrantes judeus no Brasil.

Neste sentido, foi de grande valia, uma pesquisa que orientasse uma reflexão interpretativa da historiografia contemporânea, bem como analisasse algumas fontes básicas que foram consultadas, como a Constituição de 1934 e 1937, decretos-lei e circulares normativas.

Contudo, este trabalho baseou-se prioritariamente na revisão de algumas obras produzidas por renomados autores contemporâneos, sendo alguns de descendência judaica e outro não. Tais obras proporcionaram uma melhor compreensão sobre a formação dessa comunidade no Brasil, a partir de 1930, início do governo Vargas, após o golpe de Estado dos militares. Assim esperamos compreender como se tratou as questões raciais, anti-semitas, que envolviam o mundo após a primeira guerra mundial.

Para discorrer sobre o assunto foi necessário pesquisar algumas questões que envolveram imigrantes judeus, a partir da colonização do Brasil. Por ser imprescindível para uma melhor compreensão.

Desta forma cabe lembrar que a história dos imigrantes judeus foi pesquisada, de forma que o fruto deste trabalho é um estudo, uma análise e não julgamento, pois houve grande preocupação durante esta pesquisa para que o governo de Vargas (1930-1945), não fosse compreendido por meio de uma visão maniqueísta em que o Estado é apresentado como vilão e a comunidade judaica como a vítima indefesa.

Neste sentido buscaremos reativar a história da trajetória dos imigrantes judeus, grupo este que contribui consideravelmente com a modificação da economia e do cotidiano brasileiro. Pesquisaremos sobre a existência ou não de uma política restritiva anti-semita e racista, por parte do governo de Getúlio Vargas e das elites intelectuais brasileiras. Ou seja, uma posição de não aceitação de imigrantes judeus no Brasil conforme descreve Mizrahi:

(...) o golpe de 1937, que institui o Estado Novo no Brasil, marcado pelo autoritarismo e o nacionalismo, imprimiu uma realidade de nítida inspiração fascista, prejudicando as comunidades judaicas e a absorção de novos imigrantes. Iniciada a Segunda Guerra Mundial, os refugiados judeus da Europa não conseguiram refúgio ou asilo na maior parte dos países americanos. Aconteceu assim também com os que buscaram o Brasil. Pouco depois, mesmo passando à órbita aliada, a política imigratória do governo Getúlio Vargas permaneceu restritiva (por circulares secretas) para os judeus e para outros grupos étnicos.[1]

Dessa forma entendemos que o mundo foi influenciado pela política nazista onde Hitler idealizou um projeto de limpeza étnica, o qual proporcionou perseguições e extermínio de milhares de pessoas que em sua grande maioria, eram judeus que viviam dentro da Europa. Tornando tal evento conhecido pela humanidade como o holocausto.

Assim, inicialmente, colocaram-se em prática na Europa, discursos eugênicos e raciais que eram baseados em teorias médicas e ideológicas, que acabaram influenciando também alguns países americanos, que se identificavam com regimes nacionalistas, ditatórias, autoritários, dentre eles o Brasil.

2- DA DIÁSPORA A CHEGADA DOS JUDEUS NO BRASIL

A trajetória do povo judeu é marcada por muitos conflitos étnicos e religiosos que influenciaram a história da humanidade. Após serem expulsos de Israel pelos romanos, no ano 70 d.C, passaram a migrar pelo mundo, em busca de territórios seguros, pois perderam a pátria tão idealizada em suas tradições religiosas e culturais.

Diante disso, a comunidade judaica dispersou-se pelo oriente e principalmente pela Europa durante a Antiguidade, em territórios que posteriormente iriam constituir países como Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Itália e Alemanha, entre outros.

Assim, além do problema territorial que o povo judeu enfrentou ao longo da história, houve também o perigo das perseguições promovidas por comerciantes, religiosos católicos e muçulmanos, entre outros grupos ideológicos que acabaram promovendo uma campanha anti-semita, onde acusavam os judeus de serem responsáveis pelos males que assolavam o mundo, diante disso criou-se explicações simplistas para argumentar práticas discriminatórias, como a que Farrington descreve:

O Judaísmo tem de algum modo, uma longa história de perseguição, porque cerca de 1500 anos atrás cada judeu foi pessoalmente responsabilizado pela crença cristã da morte de Jesus Cristo. Quando o império foi cristianizado no século IV, o destino dos judeus foi selado – considerava-se que como os judeus tinham crucificado Jesus, eles deveriam sofrer por isso.[2]

Portanto a religião judaica permaneceu sofrendo perseguições, sendo designada também como uma comunidade étnica, considerado judeu qualquer descendente ou praticante do judaísmo, fazendo com que o termo judeu tivesse um significado pejorativo e racista.

Já no fim do século XV, os judeus que viviam na Europa, principalmente na Espanha, passaram a sofrer com o anti-semitismo e práticas racistas, o que tornou o Estado Português um refúgio aos judeus espanhóis que se unindo aos judeus portugueses, constituíram uma nova comunidade judaica no reino português, conforme relata Vainfas:

As levas de judeus espanhóis que se abrigaram em Portugal depois da criação do tribunal de inquisição e, sobretudo, depois da expulsão, em 1492, encontram uma sólida e organizada comunidade judaica instalada no reino luso[3].

Assim, ao fim do século XV, contrapondo as práticas do Reino Espanhol, Portugal não perseguia nem promovia conversões forçadas naquele momento. Logo, acreditamos que tal fato explica a fuga de inúmeros judeus espanhóis para o Reino Lusitano, que de acordo com Vainfas provocou uma reação imediata por parte das autoridades portuguesas:

Ali não havia ocorrido perseguições, nem conversões massivas, nem muito menos se havia estabelecido qualquer espécie de inquisição. Em Portugal, os judeus viviam em certa medida uma pequena "idade do ouro", engajados na expansão atlântica, no cenário intelectual na corte. A entrada de milhares de judeus espanhóis no reino português mudaria completa e drasticamente a situação da comunidade sefardita lusitana.[4]

Diante desses fatos, os monarcas portugueses endureceram as relações, que acreditamos terem o objetivo principal de resguardar os cristãos e a hegemonia da Igreja Católica. Logo, as autoridades portuguesas passaram a perseguir e discriminar os judeus com base em decretos-lei e propagandas anti-judaicas, que discriminavam tanto religiosamente e como racialmente. Proporcionando com isso um aumento na constante intolerância de membros da igreja católica e de outros segmentos da sociedade européia contra os judeus.

Contribuindo ainda para o aumento do sentimento anti-semita na Europa o evento contratual do matrimônio que envolvia a princesa de Castela, a qual era filha de Rei Católico, visto tal contrato obrigar o Rei de Portugal, Dom Manuel a assinar o decreto de expulsão dos judeus que viviam em Portugal em 24 de dezembro de 1496, conforme relata Vainfas:

(...) motivado pelo fato da princesa de Castela recusava-se a pisar em solo onde houvesse hereges, forçou o rei português a adotar a política de eliminação dos seguidores da Lei velha até outubro do ano seguinte, sob pena de confisco de bens e pena de morte.[5]

Conforme acontecia na Espanha, Portugal também se valeu naquele momento de práticas coercitivas para que o Judeu se convertesse à religião católica, fazendo com que muitos Judeus aceitassem a conversão como melhor opção às perigosas perseguições.

Considerando que os judeus compunham a base portuguesa nos mais variados segmentos da sociedade, onde participavam do desenvolvimento científico, da administração do reino, do comércio que começava aquecer as economias européias. Constatamos que houve judeus que conquistaram alguns direitos, que eram assegurados em razão do pagamento de altos impostos e dos bons serviços prestados, que garantiram a esta comunidade judaica a conservação da língua, da religião e da cultura sob a tutela do reino português. Assim, Vainfas descreve que alguns judeus detinham posições sociais de grande serventia aos Reis, logo criavam uma difícil situação a estes, pois:

Desde o final do reinado de D. João II cresciam as pressões dos Reis Católicos contra a acolhida dos judeus e conversos em Portugal, situação que comprometia o sonho de unidade da península, sob a liderança lusitana. A necessidade de sacrificar a minoria judaica parecia, aquela altura, inevitável. Decisão difícil, sobretudo diante dos importantes serviços que homens como o astrônomo e astrólogo Abraão Zacuto, expulso de Castela e abrigado em Portugal, prestaram para os avanços náuticos do reino. Ao decreto de expulsão seguiram-se outras determinações visando a forçar a conversão maciça e espalhando o terror em todo o reino.[6]

Dessa forma, a partir do ano de 1496, inicia-se a saída de judeus portugueses para outros países, dentre eles o Brasil, logo que ocupado, serviria de refúgio a este povo, que em busca de uma maior tolerância religiosa, pois a Corte portuguesa nesse período, juntamente com a Igreja Católica, incentivavam a vinda para o Brasil de Judeus convertidos, denominando-os religiosamente como cristão-novos. Tais concessões do reino português, tornou o Brasil uma opção considerável de qualidade de vida para onde destacamos a vinda inicialmente dos judeus denominados serfaditas, cujo termo designa os judeus que após a diáspora judaica foram para territórios ocidentais como Portugal, Espanha, Holanda, Magreb, Itália, Turquia dentre vários outros países da Península Ibérica.

Esses novos imigrantes buscavam principalmente maior segurança religiosa e social, bem como uma maior ascensão econômica, fato que conseqüentemente possibilitaria a este grupo de Judeus a constituírem uma maior liberdade dentro da Colônia.

Portanto, a América recém "descoberta" proporcionou ao povo judeu uma esperança a preconceitos raciais e anti-semitas existentes na Europa e no resto do mundo. Neste contexto, o Brasil colônia, foi tido como um porto seguro aos judeus que aqui se instalaram como colonizadores durante o Brasil colônia. Pois apesar das dificuldades aqui encontradas, os judeus convertidos ao cristianismo abraçaram a nova colônia portuguesa, como um lar. Assim, diferenciamos afim de melhor compreensão, que os judeus que imigraram para o Brasil durante o século XV e mais uma boa parte do Brasil colônia são denominados pela historiografia de judeus colonizadores ou cristãos-novos.

Ainda no período colonial brasileiro, séculos depois, no ano de 1810, começou no Brasil a chegada de judeus imigrantes, sendo a sua maioria de origem Inglesa. Segundo Mizrahi, o aumento do número de imigrantes aconteceu graças à vinda da Corte Portuguesa para o Brasil, que influenciou positivamente as relações comerciais no Brasil Colônia, promovendo uma maior abertura dos portos brasileiros às nações amigas. Aumentando ainda mais estes imigrantes a partir do fim dos tribunais de inquisição em Portugal, no ano de 1820, o que contribuiria para uma maior tolerância religiosa na colônia brasileira.[7]

Logo depois, a colônia brasileira, recebeu muitas famílias judias que se instalaram na região norte do Brasil, na Amazônia, com objetivo de trabalhar com a extração da borracha, o que, décadas depois, iria se estender aos negócios de frutas, cereais, utensílios e outros.

Contudo, devemos compreender que nem todos os judeus ingressaram no Brasil de formas espontâneas, pois muitos chegaram aqui como refugiados políticos das revoluções no século XX, como a Revolução Russa, A Guerra Civil Espanhola, ou em conseqüência dos diversos conflitos no Oriente Médio.

No início do século XX, outro grupo judaico também escolhera o continente americano em busca de uma nova pátria, que embora também Judeus, são identificados até hoje como de descendência Asquenaze, que Mizrahi relata serem judeus provenientes do Leste e Oriente da Europa, e sendo assim possuíam tradições religiosas, costumes e o idioma um pouco diferenciado dos judeus de descendência Serfaditas.[8]

Neste contexto, o Brasil passa a receber cada vez mais imigrantes, refugiados, sobreviventes e deslocados de guerra, pessoas estas que acabaram se organizando nesta nova pátria por acreditarem que nas Américas não havia tanta discriminações ou humilhações dos programas anti-semitas e rascistas que circulavam na Europa e no Oriente Médio.

Dessa forma, Mizrahi descreve alguns motivos para a imigração na primeira década do seculo XX:

Na primeira década do século XX, os conflitos regionais, a pobreza, o desemprego e o serviço militar obrigatório, exigido pelos nacionalistas – os Jovens Turcos -, constituíram-se em fatores que levaram judeus e outros grupos étnico-religiosos do Oriente Médio a emigrar. A maioria optou por terras da América, particularmente para os Estados Unidos.[9]

Segundo Mizrahi, os Estados Unidos receberam por volta detrês milhões de judeus na primeira década do século XX, o que forçou a política americana a adotar um sistema de cotas.

O sistema de cotas, adotado pela política imigratória americana, levou os responsáveis pelas embarcações a direcionar os imigrantes para países da América Latina. A argentina e o Brasil receberam juntos, no mesmo período, perto de 300 mil imigrantes de origem judaica.[10]

Logo, o Brasil passou a receber um maior número de imigrantes judeus, que em sua maioria vinham de diversas regiões da Europa, do velho mundo, onde sofriam discriminações raciais, religiosas e culturais, que conseqüentemente tinham poucas possibilidades de uma pátria acolhedora, a qual proporcionasse um conforto social e econômico, conforme Mizrahi descreve:

A pobreza, o desemprego e o anti-semitismo continuaram a trazer para a América, após a Primeira Guerra Mundial (1914 1918), imigrantes judeus do norte da áfrica, do Oriente Médio e de países europeus, assim como da Rússia, então União Soviética, da Polônia e de países limítrofes, inconformados com a expansão do socialismo. Terminada a guerra, conflitos nacionalistas se iniciaram no Oriente Médio. A ampliação dos embates levou judeus, cristãos e muçulmanos à busca de um refúgio em terras da América.[11]

Quando já instalados, estes novos imigrantes criaram redes de ajuda mutua que proporcionaram uma mais rápida organização comunitária e religiosa, colocando em prática as adaptações necessárias para o convívio em um país diferente, quer por meio de construções de sinagogas, quer por meio de fundação de entidades assistenciais.

3- ESTEREÓTIPOS, PRECONCEITOS E ANTI-SEMITISMO: OS IMIGRANTES JUDEUS NA ERA VARGAS (1930-1945)

Conforme já sabemos, após a Primeira Guerra Mundial, o mundo entra em um período, denominado "entre-guerras", que faz crescer a instabilidade política e econômica nas antigas potências, fazendo com que muitos países tivessem suas economias e formas de governos abaladas, fato este que promoveu o distanciamento da democracia e, conseqüentemente, a ascensão dos governos autoritários pelo mundo. Neste contexto, o Brasil acaba inserido, pois aqui pesquisaremos o governo ditatorial e autoritário de Vargas, o qual é identificado por muitos autores, como um governo de características espelhadas em práticas fascistas. Sendo assim, abordaremos o governo do presidente Getúlio Vargas, período que compreende os anos de 1930 a 1945, respectivamente o governo Provisório, Constitucional e o Estado Novo.

Na década de 1930, o Estado adotou uma política intervencionista que mudou o enfoque sobre as questões de imigração, pois Vargas acreditava naquele momento na existência de uma grande doença que assolava o país, a qual não era física ou mental, mas sim ideológica, que logo desencadearia por parte do governo Vargas, uma a formulação de um conjunto de políticas públicas, com características restritivas a imigrantes envolvidos com ideologias comunistas ou vindos de países onde tais ideologias eram constantes, dessa forma o governo provisório considerou a imigração como principal preocupação, fato que a historiadora Tucci Carneiro descreve:

Preocupado em conter outro tipo de "vírus": o comunismo interpretado como "o monstro de mil cabeças". O medo da revolução bolchevique obrigou o governo brasileiro a reavaliar o papel dos imigrantes judeus (principalmente dos russos e lituanos), tratados como atentadores à ordem social e à segurança nacional.[12]

Assim o governo provisório de Vargas, apoiou-se de teorias raciais, como a de Spencer, Darwin, ou determinismos raciais dos séculos XVIII e XIX, que almejavam um branqueamento da população, um melhoramento da "raça", com a finalidade de igualar os brasileiros a europeus, para desenvolver seu projeto modernista, que segundo ele promoveria o homem brasileiro, resguardaria o país proporcionando um crescimento econômico e social, para construir o futuro. Tal discurso mascarou práticas autoritárias contra indivíduos identificados como ameaça à nova construção racial, a ordem social e a política modernista do Brasil.

Tais idéias, conforme descreve Moritz, foram amplamente divulgadas no contexto do fim da escravidão, quando se almejava a construção de um novo modelo político para o Brasil, considerado por muitos pensadores essencial à sociedade brasileira, pois segundo estes a sociedade brasileira estaria fadada ao "atraso" por ter sido constituída com raças inferiores. Assim, a linha positivista e progressista do governo Vargas, desenvolveu uma política de modernidade em que a questão racial iria determinar o novo projeto brasileiro, fazendo a sociedade evoluir e progredir.[13]

Neste projeto, cooptaram-se intelectuais de prestígio, a fim de concretizar o modernismo, que Silva conceitua como, "(...) busca de identidade nacional que está na base da formulação de um projeto cultural da nacionalidade, representação da ideologia desenvolvimentista, que enfatiza a industrialização e o planejamento".[14]

Contudo é importante destacarmos que, nas primeiras décadas do século XX, antes da Era Vargas a política imigratória dos governos republicanos, assumiu o papel de agente da modernidade, onde utilizou de entidades privadas e órgãos governamentais para interferir nos processos de imigração e civilizatórios, apoiado em teorias médicas eugenistas, que neste período analisavam os problemas de enfermidades que ocorriam nas cidades e nos campos, como por exemplo, as questões de proliferação das doenças, que propiciaram aos médicos uma conclusão de que a imigração era a principal responsável pela falta de higiene no território brasileiro e, portanto influenciava negativamente a economia.

Tal declaração desencadeou uma política restritiva aos imigrantes, na qual os judeus eram os mais combatidos tanto por médicos, intelectuais, como pelos grandes latifundiários, elites comerciais, seguimentos esses que se deixaram influenciar pelas teorias e acusações anti-semitas vindas da Europa, que acusavam os judeus de se instalarem mais nos meios urbanos, e por tanto se dedicarem prioritariamente ao comércio prestamista, a importação e a exportação, do que agricultura, fato este que não satisfazia os grandes latifundiários que necessitavam de mão de obra para as atividades agrícolas, e principalmente os comerciantes.
Assim no Brasil, questões que envolviam a imigração, passaram analisadas por órgãos de Negócios Comerciais e Consulares do Ministério das Relações Exteriores, que após muitas pesquisas, acabaram entendendo que o Brasil necessitava de "agricultores de verdade", e por isso a entrada de judeus não iria contribuir para o a melhoria da atividade agrícola.

Dessa forma, Vargas e as elites de intelectuais, dentro de várias questões, ansiavam uma forma de controlar os surtos imigratórios para combater o desequilíbrio entre ruralismo e urbanismo, com a finalidade de selecionar o bom imigrante, e principalmente controlar o processo de ocupação do território nacional. Logo a política brasileira, desde as primeiras décadas do século XX, acatou uma posição de Estado gerenciador da população, o que significava uma avaliação dos novos imigrantes com o fim de deixar adentrar ao país, somente pessoas de boas etnias ou raças, conseqüentemente "disciplinadas e trabalhadoras", segundo o entendimento do Estado, pois até o fim do século XIX, os governos Republicanos também criaram projetos discutidos ou idealizados por inúmeras teorias raciais que influenciaram esta política de imigração, a qual defendia um branqueamento da população como projeto étnico-político, bem como a europeização de nossa cultura, que Lesser relata:

O resultado foi que as posições sobre a imigração judaica viviam mudando. Os judeus eram considerados, ao mesmo tempo antitéticos em relação à política de embranquecimento racial do Brasil e fundamentais para o desenvolvimento econômico do país.[15]

Assim, contraditoriamente o judeu era avaliado como um dos responsáveis pelo o desequilíbrio mundial, sendo considerado também de etnia inferior, para o projeto de embranquecimento, mas que conforme o caso poderia ter a entrada no Brasil liberada, por interesses políticos ou econômicos, estratégia que denotava uma política contraditória, que ora considerava os imigrantes de origem semita indesejável e outra imprescindível, incentivando assim a entrada destes no Brasil.

Logo, percebemos que as questões de imigração eram um importante instrumento para o país avançar comercialmente. Destacamos a importância do componente econômico que também era responsável na determinação das regras de imigração. Assim, havia uma necessidade do Estado brasileiro em utilizar essa mão de obra, com a finalidade de compor o projeto nacionalista e modernista.

Segundo Lesser, essas relações de trabalho estabelecidas durante os governos republicanos se transformaram até as primeiras décadas do século XX, passando a capacidade de trabalho dos indivíduos ser associada à medida de avaliação social e racial, cujos critérios científicos e sociais das correntes do século XIX seriam reaproveitados pelo governo estadonovista após a Carta Outorgada de 1937, a qual definia o presidente como "autoridade" suprema do Estado.[16]

No contexto político brasileiro, durante os primeiros meses do governo provisório de Vargas, não havia tanta preocupação dos setores governamentais com imigrantes judeus, fato que posteriormente receberia uma atenção especial, quando se desenvolveria uma forma de frear o fluxo migratório desses judeus, pois conforme o historiador Marcos Chor, o fluxo migratório vinha crescendo rapidamente, pelo fato de que praticamente a metade da emigração da Europa Oriental para o país era constituída de judeus. Enfim, até os anos de 1930, cerca de 60 mil judeus viviam no Brasil[17].

Logo, com o início do governo provisório de Vargas, esse fluxo judaico aumentou significativamente, devido o avanço das ideologias nacionalistas, antiliberais, em alguns países da Europa, dentre eles a Alemanha nazista, que agregava elementos raciais ao Fascismo[18].

Esse regime Fascista foi à base do regime Nazista em ascensão na Alemanha, que defendia dentre muitas coisas a existência de uma única raça pura, "ariana", a qual seria costituída por povos germânicos. Para isso Hitler utilizou das teorias de desigualdade das raças, como a de intelectuais como Spencer, Georges Cuvier, Carl Van,Gobineau, Charles Darwin, que descreviam a geração e evolução das espécies, para defender uma desigualdade racial entre os homens. Tais teorias raciais unidas ao Fascismo compuseram o Nazismo, regime este que dentre inúmeras características, classificava como seres "inferiores" judeus, negros, árabes, bem como deficientes, homossexuais e outros grupos.

Essas teorias raciais foram aprimoradas e transplantadas para as américas principalmente durante o século XIX, o que podemos possivelmente compreender como uma falta de produção brasileira sobre o tema racismo, até meados do século XX.

Portanto durante o século XIX, até meados de 1930, no Brasil e na Europa aumentou os já existentes preconceitos raciais, mas não em tanta proporção, como o modelo promovido pelo regime Nazista e seus teóricos formadores de opinião, que associaram os judeus ao comunismo, aos parasitas, as doenças, ou acusavam-os de serem autores de atos ultrajantes contra a humanidade e que portanto deveriam ser repudiados por toda a sociedade.

Com essas práticas racistas promovidas pelos nazistas, aos poucos despertou na Alemanha uma fúria ideológica coerciva contra a etnia judaica. Onde é perceptível no documentário Arquitetura da Destruição, que retrata o ideal nazista, o qual defendia o banimento e esterilização de doentes ou povos tidos como raça impura, baseado-se em teorias sociais e médicas, que eram responsáveis pela política racial, que defendia uma higiene racial, um embelezamento e limpeza das cidades, para o alcance de uma saúde "efetiva", e por fim um embelezamento do mundo. E dentro desse mundo o judeu não tinha lugar.[19]

Tais teorias raciais na Europa, unidas a práticas desumanas, acompanhadas de outros interesses, contribuíram para a expulsão e perseguição das comunidades judaicas existentes durante a ascensão do partido nazista na Alemanha e posteriormente nos países dominados por Hitler durante a segunda Guerra Mundial. Destacando também a grande quantidade de refugiados judeus oriundos de países mulçumanos ou Orientais por problemas territoriais ou religiosos dentro da causa palestina.

Concomitantemente, no Brasil Vargas tentava neutralizar os diversos grupos liberais, opositores quer por ideologias contrárias ou influenciadas por teorias marxistas e teorias de grupos políticos da União Soviética, que tentavam restabelecer a democracia. Neste contexto, o PCB, "Partido Comunista Brasileiro"tornou-se o principal opositor a Vargas.

O PCB era um partido de esquerda fundado em 1922, com inspiração nas teorias de Lênin, a fim de combater os grupos fascistas, bem como as grandes oligarquias, o imperialismo e o autoritarismo que tentavam se instalar no país. Com a trajetória marcada pela ilegalidade, os membros deste partido acabaram liderando e fundando em março de 1935 a Aliança Nacional Libertadora (ANL), que liderava o grupo dos inconformados com os rumos do governo constitucional de Vargas.[20]

Após o sufocamento da insurreição promovida pela ANL, a qual defendia um programa nacionalista, antifascista e democrático, ou seja, a imediata instauração de um novo regime. Vargas conquistou mais poder e para tanto seria necessário neutralizar qualquer indivíduo comunista, fosse ele brasileiro ou imigrante, de forma que qualquer imigrante que pretendesse se instalar no país, não poderia ter uma linha ideológica comunista. Tal restrição, ora velada, ora explicita, acabou influenciando ainda mais nos processos de imigração contra as famílias judias que aqui tentavam se instalar visto estas estarem rotineiramente sendo acusadas de comunistas.

Contudo o Brasil, até 1937, vivia-se ainda um Estado de Direito[21], que sofreria transformações, durante o período "entre-guerras", especialmente a partir de 1937, com o advento do Estado Novo de Vargas, o qual acreditamos ter sido inspirado em um modelo de regime autoritário, fascista, que simpatizava das teorias nacionalistas, ditatoriais, racistas, defendidas por Hitler, fato que contribui consideravelmente com práticas racistas ou anti-semitas baseadas na teorias vindas da Europa, como as citadas anteriormente.

No governo constitucional Vargas, estabeleceu-se uma política restritiva por meio de um sistema de cotas por nacionalidade, que foi inserida na Constituição de 1934, com o fim de barrar, ou diminuir a entrada ou refúgio de "etnias indesejáveis". Porém temos que ressaltar que tal restrição durante esse período, não atingia os judeus, pois a denominação ou termo "judeu" não era identificado como nacionalidade ou membro de uma nação, fato que após a instituição do governo ditatorial mudaria, mostrando que a questão racial passou a incluir:

(...) língua, nacionalidade e religião, e que etnia e nacionalidade estavam tão interligadas que se tornou praticamente impossível distingui-las. Apesar de sua "raça" caucasiana e nacionalidade européia, muitos políticos e intelectuais consideravam os judeus não-brancos e não europeus um "outro" perigoso a quem deveriam ser negados os direitos de imigração.[22]

A partir do Estado novo 1937, ocorreram novos ajustes necessários à nova política de governo, a qual defendia a centralização, ou seja, o total controle por parte do presidente Vargas. Determinações apoiadas em decretos-lei e circulares secretas barrou os novos "imigrantes indesejáveis" ao novo projeto de modernidade comercial e ideológica, que segundo Mizrahi:

Generalizou-se a idéia de que os judeus eram provenientes de uma raça (a semita) e como tal, passaram a compor a lista dos elementos "nocivos do ponto de vista racial, étnico, político, social e moral e associados ao "perigo vermelho" devido à identificação de numerosos judeus com a ideologia socialista.[23]

Portanto, criou-se uma cultura que associou ou estereotipou os imigrantes judeus a uma possível conspiração comunista mundial, caso este, que se enquadrava também qualquer grupo de imigrantes considerados impróprios para compor ou miscigenar o Brasil moderno, pois do projeto modernista brasileiro não podiam participar o povo judeu, ou imigrantes de etnias consideradas como inferiores, como: asiáticos, africanos dentre outras.

Tucci Carneiro defende que este projeto étnico foi baseado principalmente nos meios acadêmicos, representados ideologicamente por teorias de antropólogos, psiquiatras, militares, médicos, eugenistas, economistas, e de outros segmentos de grande influência, que dedicaram a pensar esta questão para encontrar os responsáveis pelos males que assolavam o país, logo entendiam que:

Apropriando-se dos modelos oferecidos pelos teóricos racialistas europeus, valorizando os métodos apontados pela antropologia social e pela Eugenia, esses indivíduos ditaram regras que classificavam os negros, os judeus, os japoneses e os árabes como "raças" indesejáveis para compor a população brasileira.[24]

Logo, podemos compreender as teorias de Eugenia como uma tentativa de purificar as raças, que atrelada a uma campanha antiliberal, anticomunista aprimorada nas décadas de 1930 a 1940 passou a encobrir teorias e valores racistas e anti-semitas defendidos pela elite política.

Nesta perspectiva, percebemos a posição racista e anti-semita do governo de Vargas durante o Estado Novo, o qual tinha um projeto étnico-político para o Brasil.

A postura anti-semita sustentada pelo governo Vargas entre 1937-1945 tem suas raízes na mentalidade racista persistente no Brasil desde o século XIX. Importadas da Europa, as teorias racistas sustentaram, por mais de meio século um caloroso debate sobre qual seria a melhor raça para compor o povo brasileiro: amarela, branca ou negra? Que tipo étnico deveria ser incentivado a emigrar para o Brasil.[25]

Segundo Chor, os judeus passam a ser acusados de proverem conflitos interétnicos em seus países de origem, sendo constantemente, no Brasil, confundidos e duplamente discriminados, fato que se complicaria ainda mais com a fracassada insurreição comunista de 1935, fazendo com que durante a implantação do Estado Novo fossem criadas medidas explícitas de cunho racial ou anti-semita que tinham o objetivo de frear o grande número de judeus, por causa das pressões internacionais, em especial dos Estados Unidos, que não queriam receber estes refugiados.[26]

De 1930 a 1937, percebemos que as autoridades estadunidenses, por sua situação econômica privilegiada, "convenceram ou forçaram" as autoridades da Argentina e do Brasil a abrigar os judeus refugiados da expansão nazista, bem como do anti-semitismo dentro da Europa e do Oriente Médio. Dessa forma, percebemos que o governo Vargas mantinha relações diplomáticas e comerciais alinhadas com os EUA, como também mantinha uma política simpática a Alemanha nazista, o que fazia com que ele jogasse com estas duas grandes potências, segundo Saraiva:

O governo Vargas traduzia as indefinições entre o apoio a Hitler ou às velhas potências ocidentais. A política externa apresentou-se bastante ativa nos assuntos de Guerra. As definições acerca dos amigos e inimigos.[27]

Outro fato interessante que devemos compreender é a política do governo Vargas, que apesar de intimado a receber esses novos imigrantes, acabou recebendo bem imigrantes judeus que detinham posses ou que de alguma forma poderiam contribuir para a nova modernização tão idealizada por ele, onde confirma-se a política de imigração contraditória do governo Vargas.

As configurações estereotipadas sobre os judeus, conforme situações adquiriam sinais positivos ou negativos. As pressões externas, conjugadas com a perspectiva modernizante do governo embasaram a política ambígua de Vargas no que concerne à entrada de judeus no país. Em outras palavras, judeus "indesejáveis', munidos de capital, habilidades mercantis e capacidade intelectual para se inserirem no processo de modernização do país, foram contraditoriamente, bem vindos.[28]

Assim, contraditoriamente em 1934, institui-se uma política discriminatória com base em um sistema de cotas de imigração, o qual teve características restritivas, somadas as circulares secretas, que proporcionaram também calorosos debates na Câmara Federal durante a elaboração das emendas para a Constituição de 1934, pois a Eugenia e o Nacionalismo se tornaram questões imprescindíveis à política imigratória, que Xavier de Oliveira relata ter resultado na criação do artigo 121 **6° e 7°da Constituinte de 1934:

Impunha restrições á entrada de imigrantes no território nacional garantindo a "integração étnica". A corrente imigratória de cada país não deveria exceder, anualmente, o limite de 2% sobre o número total dos respectivos nacionais fixados no Brasil nos últimos cinqüenta anos. O * 7° vedava a concentração de imigrantes em qualquer ponto do território nacional, com o objetivo de evitar a formação de quistos raciais.[29]

Logo a partir de 1937, após a instauração do Estado Novo, passou-se a dificultar a entrada de judeus "indesejáveis" no Brasil. Pelo fato também de Vargas identificá-los como socialistas, comunistas, assim passou a orientar e ordenar aos setores responsáveis pela imigração, que não fossem concedidos vistos temporários ou permanentes ao grupo étnico judaico ou quaisquer outros imigrantes asiáticos, negros, amarelos, comunistas ou apontados como parte das frentes de resistência do nazifacismo.[30]

Assim, aos poucos o governo Vargas, utilizando-se de decretos como o Decreto-Lei nº 383, de 1938, o qual proibia aos estrangeiros exercer atividades políticas no Brasil, bem como o Decreto-Lei 406, de quatro de maio de 1938, que consolidava toda a situação jurídica dos estrangeiros, limitava, por motivos econômicos e sociais, a entrada de indivíduos de raças inferiores ao Brasil[31].

Aos poucos, restringia-se a entrada desses grupos, o que gerava uma discriminação política e social dentro dos principais setores públicos, pois com o aumento do número de pareceres oficiais que regiam principalmente as questões judaicas, os principais seguimentos associaram o processo de imigração judaica a questões da segurança nacional.

Quando era intensa a perseguição nazista aos judeus, os diplomatas brasileiros foram proibidos de conceder vistos de entrada no país, sob a alegação, entre outras, de que os judeus eram um contingente aberrante de nossa formação étnica e não apresentavam o menor valor econômico para o Brasil.[32]

Dessa forma, médicos, artistas, intelectuais, católicos, e os grandes representantes do fascismo no Brasil, os integrantes da AIB (Aliança Integralista Brasileira), assumiram uma postura de intolerância em seus discursos políticos ou em suas obras, eram influenciadas por alguns representantes que pertenciam a grupos pró-nazistas que se instalavam dentro do governo Vargas.

É claro que a comunidade judaica que aqui se estabeleceu, era constituída por pessoas que vieram de muitos países e que, quando lá, também tinham suas aspirações ideológicas, como exemplo, os judeus de origem Asquenaze que em sua grande maioria pertenciam à linha político-ideológica de aspiração progressista que defendiam o socialismo, o comunismo, bem como suas tradições e os movimentos religiosos de origem judaica.

Outro aspecto considerável é que não podemos imaginar a comunidade judaica ou qualquer outro grupo de imigrantes como seres passivos ou imóveis, pois destacamos que os diversos grupos de imigrantes judeus, embora muitas vezes com diferenças dentro de sua própria tradição ou religião, instituíram laços de solidariedade, fundando Instituições sociais como: agremiações esportivas e recreativas, organizações que de certa forma asseguravam a vida e a identidade judaica dessa comunidade facilitando a entrada de muitas famílias judias no Brasil.

Há também exemplos como os grandes núcleos de concentração de imigrantes judeus, refugiados da Itália, que assim que instalados no Brasil passaram a ser conhecidos por "Colônia Mussolini" por terem inicialmente apoiado o fascismo na Itália. Dessa forma durante a ascensão nazista estes judeus passaram a ser perseguidos por Hitler e fascistas Italianos, onde acaram fugindo para o Brasil, Quando aqui eram duplamente discriminados, sendo considerados como "súditos do eixo", pois eram apontados como suspeitos de espionarem o Brasil em favor do Eixo Berlim-Roma, bem como de serem judeus. Dessa forma sendo eles fugitivos do regime fascista, quando chegavam ao Brasil, eram ironicamente associados a espiões.

Contudo compreendemos que durante a ditadura de Vargas, (1937-1945) o Estado Novo assumiu uma postura declarada em relação a não aceitação de imigrantes judeus no Brasil. Logo, as elites que compunham o governo Vargas, bem como os importantes dirigentes do país, manifestaram-se a favor das restrições secretas, devendo estas ser divulgadas internamente na prática política, bem como serem obrigatoriamente seguidas, para combater os inimigos reais ou fictícios do governo, e para isso os meio de comunicação que, naquele período, eram controlados pelo Estado ditatorial, por meio do DIP, (Departamento de Imprensa e Propaganda), a qual segundoJorge Ferreira, foi utilizada pelas autoridades governamentais para culpar e manifestar rancores contra os indivíduos "nocivos" à pátria.

Assim no Brasil, em 1930, 1935 ou certamente em 1937, os governantes, armados com variados dispositivos "simbólicos" de dominação ideológica, em alguns casos psicológicos, teriam tido a capacidade de manipular, por meio de imagens e representações, as emoções e a sensibilidade das pessoas, dominando inclusive, as suas mentes.[33]

Portanto é visível a preocupação de Vargas no campo ideológico, controlando principalmente a imprensa, a qual era constituída de intelectuais, que acaboram apoiando diversos regulamentos contra as comunidades judaicas, cabendo a poucos representantes do governo a defesa de políticas humanitárias, entretanto devemos compreender que houve funcionários consulares, embaixadores e políticos, que apesar da política de restrição a indivíduos judeus, utilizaram de suas influências e cargos para facilitar a entrada de indivíduos da comunidade judaica.

Logo é importante compreendermos a situação cultural e política dos homens que mesmo influentes ou responsáveis pelos processos de entrada de imigrantes judeus acabavam sendo influenciados por teorias de movimentos autoritários ou totalitários vindas da Europa, como exemplo: o integralismo brasileiro que associava os judeus aos principais males ocorridos no mundo, promovendo uma radicalização contra eles, culpando-os dos problemas políticos e econômicos que enfrentava a sociedade conforme relata Trindade:

(...) o anti-semitismo sensibilizava as bases integralistas "em função da simplicidade de seu esquema explicativo: desde: as revoluções francesa e soviética, até o controle das finanças internacionais, tudo seria dirigido pela ação judaica.[34]

Por fim já a partir de 1942, Vargas cria locais especiais com a finalidade de aprisionar os imigrantes identificados como subversivos ou comunistas, na já conhecida prisão, Ilha das Flores, localizada no Estado do Rio de Janeiro, a qual desde a segunda década do século XX, já isolava ou punha em quarentena indivíduos doentes, sendo em sua maioria imigrantes, presos políticos da revolta tenentista ou qualquer militar identificado como comunista. Neste sentido acreditamos que Vargas influenciado pelas práticas totalitárias do regime nazista, tentou instituir no Brasil uma prisão que fizesse os judeus aqui instalados ou qualquer outro indivíduo considerado nocivo à política governamental do Estado Novo, a temer um lugar que conservava características de um campo de concentração nazista. Para tanto a polícia secreta era a principal responsável por identificar e promover a repressão ideológica contra indivíduos considerados nocivos à ordem pública.

4- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em meados do século XIX, compreendemos que as principais autoridades e as elites constituídas almejaram um novo modelo político, baseado em um sentimento pessimista, que considerava a sociedade brasileira atrasada por ser constituída de "raças inferiores".

Dessa forma políticos e intelectuais, e grandes latifundiários idealizaram em seus projetos, uma forma de fazer progredir e evoluir a sociedade brasileira, para tanto promoveram um discurso racista, anti-semita como solução dos problemas que assolavam o Brasil, pois para estes grupos os problemas das grandes diversidades raciais e a economia atrasada, ocorriam entre outros fatores, por causa dos imigrantes de "etnias inferiores".

A partir do ano de 1930, Vargas dispensou atenção especial aos assuntos que giravam em torno da imigração, pois este novo governo acabou valendo-se de políticas ditatórias, que proporcionaram cada vez mais uma centralização do poder, defendendo um nacionalismo exacerbado, que influencia negativamente na vinda de estrangeiros judeus para o Brasil. Pois os ideais nacionalistas e modernistas do governo Vargas defendiam, a proteção, o progresso material e moral do homem brasileiro e para tanto, seria necessário o controle da entrada de imigrantes indesejados no país, estando no topo da lista os indivíduos de etnia judaica.

Assim o governo de Vargas em nome de um Estado moderno, utilizou de decretos-lei, bem como inúmeras restrições secretas e ementas para dificultar a entrada de Judeus no país, fato que compreendemos como uma posição anti-semita e racista, pois antes do golpe de 1930, já existia uma discussão sobre o controle efetivo da imigração inserida na intelectualidade brasileira, em que se almejava um projeto de branqueamento da Nação, mas aceitava-se o judeu como imigrante bem quisto, por este inicialmente ser branco e europeu, dessa forma não sendo considerado como membro de uma comunidade étnica inferior. Já durante as primeiras décadas do século XX, e principalmente após 1930, a política de imigração brasileira sofreria grande mudança, em que a postura da sociedade, passaria a perceber o judeu como um indivíduo negativo, aos interesses nacionais.

Concluímos então que o governo Vargas e as elites intelectuais brasileiras promoverem propagandas contra este grupo étnico, instigando um sentimento de intolerância à entrada e permanência destes no país acusado-os de ameaçarem a nação brasileira, associando muitas vezes esses imigrantes ao socialismo, ao comunismo e aos diversos grupos anarquistas existentes no Brasil. Dessa forma com base na bibliografia consultada, acreditamos que o presidente Vargas praticou uma política anti-semita, racista, apoiado em teorias transplantadas da Europa e principalmente da Alemanha Nazista.

Porém acreditamos que apesar de todas as perseguições e discriminações aqui realizadas contra imigrantes judaicos no período "entre – guerras", o Brasil proporcionou oportunidade para a formação das colônias judaicas, bem como uma maior tolerância religiosa e política no que se refere à entrada, permanecia e aceitação de judeus.

Podemos compreender que no Brasil houve um projeto, anti-semita, em que seguimentos formadores de opinião defendiam a rejeição a presença de judeus nas terras brasileiras, e que a ditadura acabou ajudando intelectuais, médicos, religiosos e comerciantes, pessoas que tinham um sentimento de horror a judeus, a promoverem atos de discriminação contra estes. Onde percebemos que havia também representantes públicos, sendo em sua maioria políticos e intelectuais esclarecidos, que tinham uma opinião formada sobre as questões da imigração, que acabaram se enfraquecendo ideologicamente diante dos discursos do presidente Vargas, ou dos ideais nazistas que assolaram a Europa e o mundo.

Contudo percebemos que havia uma recusa em institucionalizar ou defender perante o mundo que a política brasileira tinha um viés anti-semita, assim as autoridades brasileiras em relação às questões internacionais tinha uma posição relativamente "liberal", em que se preciso fosse, podiam aceitar os imigrantes judeus, demonstrando assim para o mundo uma boa vontade em se fazer exceções mostrando "solidariedade" à causa judaica, e quando não tinham interesses em relação à entrada desses imigrantes, se resguardavam politicamente em um discurso de obediência a lei de imigração brasileira, a qual não permitia a entrada desses judeus.

Assim havia uma política contraditória de imigração, pois ora se concedia vistos, ora não. Acreditamos que esse fato teve sua causa na dupla imagem do judeu no Brasil, pois é evidente que o sentimento anti-semita, não estava presente em toda a sociedade, logo existia setores ou grupos simpáticos as causas judaicas.

Dessa forma acreditamos que Vargas recebeu bem o discurso Nazista em relação à questão racial, no qual o judeu era tido como um indivíduo inadequado, ou errante portador de uma doença, de uma tendência negativa a aceitar regimes autoritários, e assim colocava em perigo o projeto político de qualquer ditadura militar. Portanto acreditamos que a progressão da ideologia anti-semita no Brasil, também teve a finalidade de garimpar a simpatia de diversos países europeus, dentre eles a Alemanha Nazista.

Percebemos ainda o interesse do Estado brasileiro em subsidiar projetos e pesquisas que tinham a finalidade de revitalizar economicamente e etnicamente o país, o que possibilitaria a criação de indivíduos fortes e saudáveis, como solução aos problemas públicos, mas que no fundo tal discurso almejava uma limpeza étnica, por meio de políticas públicas que controlassem a imigração de indivíduos indesejáveis.

Contudo presumimos que a busca pela "raça perfeita", foi uma posição racista e anti-semita, da parte de Vargas e as elites brasileiras que acreditavam que a homogenia da raça brasileira igualaria o potencial intelectual da população, e logo resolveria todos os problemas sociais, pensamento este que nos parece ter mais preocupação elitista do que social.Por fim, consideramos que o Estado autoritário de Vargas, no período de 1930 a 1945, tinha um viés racista, anti-semita, praticando assim discriminações aos imigrantes judeus.

Por fim, não podemos esquecer que esta minoria étnica de "judeus" que compõe o mosaico brasileiro influenciou religiosamente, culturalmente proporcionando uma importante herança ao nosso povo, e sendo assim não podemos esquecer ou querer negar fatos históricos de anti-semitismo aqui ocorrido, onde se considerou o judeu como um individuo de raça inferior, ideologicamente comunista, e religiosamente inimigo da humanidade.

REFERÊNCIAS

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ARQUITETURA DA DESTRUIÇÃO. Direção: Peter Cohen. Produção: Versátil Home Vídeo. Alemanha: Universal, 1992, 1 DVD.

BRASIL - Por uma nova Lei de Migração: a perspectiva dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?idioma=PT&cod=27680, acesso em 01 de outubro de 2008 às 15:30 hs.

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Autor: EDUARDO SANTOS


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